quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

MEMÓRIAS E MEMÓRIA



Os leitores deste blogue já se aperceberam que o tema da memória e das memórias me fascinam, com especial paixão pela literatura que trata o tema. Jorge Semprún é um dos meus autores de eleição, gosto especialmente de Le Fer Rouge de la Mémoire, lido em francês tem outro encanto, especialmente porque ele próprio com experiência vivida de Buchenwald sempre intuiu que a perceção do que foram os campos de concentração nazi será substancialmente diferente quando desaparecer o último sobrevivente e não tivermos acesso aos testemunhos que foi ainda possível recolher ao vivo no aniversário de Auschwitz que esta semana a imprensa nacional e internacional documentaram: “A memória é o melhor recurso, mesmo que isso possa parecer paradoxal à primeira vista. O melhor recurso contra a angústia da recordação, contra o abandono, contra a loucura familiar e surda. A criminosa loucura de viver a vida de um morto”.
É também nessa senda que, como iniciação algo receosa, tenho mergulhado nos últimos dias nas obras mais pequenas de Patrick Modiano, edições de bolso ou quase, que também a trata as memórias de juventude e adolescência (Un Pedigree - Folio) ou a perda da própria memória (Rue des Boutiques Obscures, Gallimard).
Hoje, numa descontraída viagem de Alfa de Lisboa para o Porto confrontei-me de novo com o tema através de uma comovente entrevista de António Lobo Antunes a Francisco José Viegas na LER, cada vez mais despojado, cada vez mais seguro que os grandes escritores não dão grandes entrevistas, cada vez mais rendido ao ato redentor da escrita, representado na frase de Faulkner que ALB cita com especial deleite: “Faz-nos levantar sobre as patas de trás e projetar uma enorme sombra”. Fala com mágoa do desaparecimento das livrarias de escritores como Alves Redol e Fernando Namora (a segunda morte e o seu esvaziamento na memória das pessoas) e da perecível memória dos livros:
“(…) E eu pensava sempre: “Vão ficar os livros, vou ficar vivo através dos livros. Mas ninguém fica vivo através dos livros. Os livros podem ficar mas são independentes de nós. Oxalá fiquem. Mas os livros não ficam o tempo todo. Dos 10 dramaturgos de que Aristóteles fala não sobra nada. (…)”

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