Os leitores deste blogue já se aperceberam que o
tema da memória e das memórias me fascinam, com especial paixão pela literatura
que trata o tema. Jorge Semprún é um dos meus autores de eleição, gosto
especialmente de Le Fer Rouge de la Mémoire,
lido em francês tem outro encanto, especialmente porque ele próprio com experiência
vivida de Buchenwald sempre intuiu que a perceção do que foram os campos de
concentração nazi será substancialmente diferente quando desaparecer o último
sobrevivente e não tivermos acesso aos testemunhos que foi ainda possível
recolher ao vivo no aniversário de Auschwitz que esta semana a imprensa nacional
e internacional documentaram: “A memória é
o melhor recurso, mesmo que isso possa parecer paradoxal à primeira vista. O
melhor recurso contra a angústia da recordação, contra o abandono, contra a
loucura familiar e surda. A criminosa loucura de viver a vida de um morto”.
É também nessa senda que, como iniciação algo
receosa, tenho mergulhado nos últimos dias nas obras mais pequenas de Patrick Modiano,
edições de bolso ou quase, que também a trata as memórias de juventude e
adolescência (Un Pedigree - Folio) ou a perda da própria memória (Rue des Boutiques Obscures, Gallimard).
Hoje, numa descontraída viagem de Alfa de Lisboa
para o Porto confrontei-me de novo com o tema através de uma comovente entrevista
de António Lobo Antunes a Francisco José Viegas na LER, cada vez mais
despojado, cada vez mais seguro que os grandes escritores não dão grandes
entrevistas, cada vez mais rendido ao ato redentor da escrita, representado na
frase de Faulkner que ALB cita com especial deleite: “Faz-nos
levantar sobre as patas de trás e projetar uma enorme sombra”. Fala
com mágoa do desaparecimento das livrarias de escritores como Alves Redol e
Fernando Namora (a segunda morte e o seu esvaziamento na memória das pessoas) e
da perecível memória dos livros:
“(…) E eu pensava
sempre: “Vão ficar os livros, vou ficar vivo através dos livros. Mas ninguém
fica vivo através dos livros. Os livros podem ficar mas são independentes de nós.
Oxalá fiquem. Mas os livros não ficam o tempo todo. Dos 10 dramaturgos de que
Aristóteles fala não sobra nada. (…)”
Sem comentários:
Enviar um comentário