quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

SERVIÇOS E EXPORTAÇÃO



Por mais do que uma vez, anotei neste espaço a relevância das transformações que o comércio e a economia mundiais têm experimentado sobretudo na última fase da globalização. Entre essas transformações, destaca-se sem dúvida a conexão entre a emergência das cadeias de valor globais, com fracionamento global dos sistemas produtivos, e o papel cada vez mais importante dos serviços nas exportações mundiais. Como também recordei em post anterior, esta transformação mexe decisivamente com a velha definição entre bens e serviços transacionáveis e não transacionáveis, determinando que os serviços deixam de ficar amarrados ao estigma dos não transacionáveis, ainda mais estigmatizados pelo processo de ajustamento e resgate financeiro da economia portuguesa.
Esta questão teria necessariamente de produzir efeitos no posicionamento do associativismo empresarial nacional, designadamente do ponto de vista do confronto entre a indústria e o comércio e serviços. Por mais nebulosas que estejam as delimitações entre os dois universos, a verdade é que os seus representantes associativos continuam a ter uma intervenção muito demarcada, contraditória com a nebulosa delimitação setorial.
Por isso, tenho seguido com atenção o posicionamento da CCP – Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, pois ele traduz fielmente o problema atrás referenciado.
Na sua nota de conjuntura económica respeitante ao 3º trimestre de 2014, datada de dezembro passado, a CCP é particularmente crítica quanto ao pretenso “milagre de recuperação das exportações portuguesas” que este governo proclama aos quatro ventos. A CCP desmente praticamente na sua análise a esperada transformação estrutural do nosso perfil exportador, vincando bem que, em período de profundo recuo do investimento empresarial, seria impossível assegurar essa transformação. Para além disso, a CCP reafirma a persistência de conhecidos problemas estruturais, entre os quais se destacam o reduzido valor acrescentado, a forte correlação com as importações, a forte concentração das exportações num reduzido número de empresas e de mercados de destino e a queda da quota de mercado após três anos sucessivos de aumento. A reconhecida desaceleração do crescimento das exportações observado de janeiro a outubro de 2014 constituiria, assim, o reflexo da persistência dessas tendências pesadas do perfil de exportação.
Neste contexto de desmistificação do pretenso milagre exportador, a CCP aproveita para marcar a sua posição de defesa da importância dos serviços: “a indústria já não é o setor com maior contributo real para o esforço exportador do país, cabendo aos serviços mais de metade da riqueza gerada pelas empresas nacionais orientadas para a satisfação da procura externa.”
Resta agora saber, e essa é a minha curiosidade, que consequências vai ter o posicionamento da CCP em matéria de condução dos desígnios nacionais de promover um quadro mais proactivo de presença na globalização. Para já, os representantes do comércio e serviços tenderão a opor-se à conexão que alguns pretendem estabelecer entre esforços de reindustrialização e reforço dos transacionáveis. A relevância dos serviços pode transformar as políticas de internacionalização. Mas daí a termos pronto para aplicação um novo paradigma de políticas de internacionalização que reflita a transacionalidade dos serviços vai alguma distância. Por isso, valerá a pena continuar a seguir o posicionamento da CCP.

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