Tentemos por a cabeça em ordem. Porque o Governo tem realmente um ponto quando valoriza o “regresso aos mercados”, sobretudo se nos ativermos ao quadro – subordinado à velha condição económica coeteris paribus (tudo o mais constante) – que marca a sua lógica preferencial (única para alguns) de raciocínio.
Com efeito, a realidade é esta: antes do despoletar da crise, Portugal levantava em média um valor à volta de 10 mil milhões de euros nos mercados obrigacionistas internacionais; nos termos do gráfico acima, construído a partir das previsões oficiais de reembolsos da dívida pública de longo prazo, Portugal defronta-se com um futuro próximo em que os primeiros anos subsequentes ao termo da “assistência financeira” apresentarão – ademais num contexto agravado por notações de risco que conheceram evoluções altamente desfavoráveis – necessidades de financiamento bem superiores àqueles montantes (mais de 50 mil milhões nos três anos que vêm).
Todo o alívio é, pois, bem-vindo. Tanto mais quanto a observância de alguma recuperação da credibilidade nacional nos não garantiu ainda mais do que um acesso aos mercados muito condicionado. Com a agravante de que o proclamado sucesso dos recentes leilões de dívida deve ser matizado pelas seguintes afirmações, retiradas de um documento da responsabilidade da Troika e do FEEF e revelado pelo “Financial Times”: por um lado, e apesar de “uma particularmente elevada participação de estrangeiros no recente leilão (perto de 93%), principalmente dos EUA”, verifica-se que “uma não habitual grande proporção do leilão foi comprada por investidores especulativos, como hedge funds (25%) ou gestores de ativos, com uma participação extremamente baixa de investidores institucionais tradicionalmente mais estáveis, bancos centrais e outras instituições oficiais (apenas 4% para seguradoras e fundos de pensões)”; por outro lado, e em contraste, os “‘real money’ investors” (institucionais privados, gestores de reservas estrangeiras, fundos soberanos) “estão ainda largamente ausentes”.
De tudo isto decorre a importância da extensão dos prazos de maturidade dos empréstimos ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) e ao Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira (MEEF) – cujos valores ultrapassarão os 51 mil milhões de euros e corresponderão a pouco menos de um quarto do stock total da dívida pública portuguesa –, designadamente na medida em que “reduzir as necessidades de refinanciamento no período de transição que se seguirá ao programa de ajustamento, dará mais tempo para reconstruir a base de investidores e recuperar o estatuto [rating] de investimento”. O gráfico abaixo, retirado do documento mencionado no parágrafo precedente, mostra a melhoria que será conseguida com a adotada opção 5 de estender por 7 anos a maturidade média dos empréstimos.
Mas, e a despeito da pertinência de todas estas considerações, uma coisa continua a ser inquestionável: por muitos investidores que troquem as obrigações italianas pelas portuguesas, a restrição financeira é subsumida, nem tem asas próprias nem voa sozinha…
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