Embaixadora do Brasil junto da Delegação da ONU (Genebra)
e ex-chefe de
gabinete do ministro Celso Amorim
Após um longo e disputado confronto, o brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo venceu o mexicano Herminio Blanco e substituirá o francês Pascal Lamy como próximo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Vencedor de uma disputa só aparentemente regional, latino-americana no caso, Azevêdo é embaixador e representa o Brasil na OMC desde 2008, onde foi chefe de delegação em litígios importantes vencidos pelo país na organização (subsídios ao algodão contra os Estados Unidos e ao açúcar contra a União Europeia). Já o candidato derrotado tem no curriculum a negociação da entrada do México na NAFTA em 1994 e de uma série de acordos bilaterais firmados pelo seu país nos últimos anos.
A meio da campanha, Azevêdo afirmou que a diferença mais visível entre ele e o seu opositor decorrerá de ele ser adepto de uma liberalização do comércio internacional pautada pela lógica do multilateralismo em vez de assente na alegada “ferramenta inovadora” de acordos bilaterais ou entre blocos limitados de países.
Mas, quer se queira quer não, a vitória de Azevêdo sinalizará sobretudo a resposta daquela que é vista como correspondendo à ala mais protecionista do Continente – centrada na costa atlântica, reunida em mercado comum desde 1991 (Mercosur, com Argentina, Brasil, Uruguai e Venezuela, após a suspensão do Paraguai em 2012) e com um dinamismo favorecido pelo recente China-led commodities boom – à sua ala mais liberalizante – centrada na costa do outro lado, reunida na “Aliança do Pacífico” desde 2012 (México, Chile, Peru e Colômbia) e com um dinamismo mais assente em “fundamentais” económicos estabelecidos e visto como exponenciável pela criação de um “Acordo de Comércio Transpacífico” (TPP) sob impulso dos Estados Unidos.
Dado o alinhamento dos EUA e da UE com Blanco, pelas razões acima, a escolha do brasileiro ganha ainda relevantes contornos democráticos (apoio de uma maioria de mais de 100 países) de brilharete (o primeiro vergar dos grandes) e de mudança (unidade significativa entre os BRICS e os países emergentes mais representativos). O que colocará inevitavelmente Azevêdo sob a pressão de um escrutínio sufocante, tanto mais quanto são publicamente conhecidas as incómodas posições que defende – veja-se, por exemplo, a carta dos 6 embaixadores à direção do “The Economist” defendendo que um eventual Global Recovery Round não poderá focar-se apenas na indústria e nos serviços mas terá obrigatoriamente de contemplar a agricultura (“mais de 60% das exportações de alguns países em desenvolvimento, “principal fonte de rendimento e emprego para 70% das comunidades pobres rurais do mundo” e com uma modesta quota de 9,2% do comércio mundial como “consequência de práticas protecionistas em países desenvolvidos”).
Diz “A Folha” de hoje que o festejo teve salgadinhos tradicionais (“coxinha, quibe e rissole de camarão”) e foi acompanhado por bom vinho tinto (Cuvée de Bramefan 2007) e espumante rosé (Michel Loriot 2010). Mas o momento já passou e Azevêdo já se pôs ao trabalho – ele sabe como ninguém que a sua margem de manobra é estreita e que só logrará sair bem se for capaz de acomodar a força dos seus princípios à urgente necessidade de libertar a OMC do impasse do Doha Round (iniciado em novembro de 2001) que a vem tolhendo…
Sem comentários:
Enviar um comentário