O post
de segunda-feira do colega e amigo Freire de Sousa, designado de “A restrição
financeira”, ilustra bem a meu ver (e felicito-o por isso) o que pode ser um
dos contributos mais originais deste blogue – destacar matérias de debate que
se perdem normalmente na vertigem de confrontos políticos e que não resistem ao
branco e preto que tais confrontos tendem a suscitar. Recordo-o após uma
aparentemente bem sucedida experiência do governo de colocação de dívida a 10
anos e uma curiosa expressão do governador Banco de Portugal, Carlos Costa, que
interpretou a bem sucedida operação de hoje como uma etapa no “caminho das
pedras” que nos está reservado para uma normalização (para quando?) das
condições de financiamento da economia portuguesa.
De facto, no auge do debate sobre a estratégia “self-defeating” e socialmente insensível
que nos tem sido proposta como via pretensamente redentora de regresso ao
financiamento, por vezes o branco e preto do debate faz-nos perder de vista que
existe uma restrição financeira e que restrição. E a dimensão dessa dimensão
impõe-se por si, independentemente de zurzirmos ou sermos complacentes com as
evidências empíricas de Reinhart e Rogoff sobre o tal limiar pretensamente
fatídico dos 90% do peso da dívida pública.
Alguém de bom senso que parta para este debate
sem ideias feitas sabe que essa restrição não pode ser ignorada. Mas sabe
também que o peso dessa restrição é tanto mais forte quanto menos promissoras
forem as perspetivas de crescimento económico de uma economia. E o que acontece
é que se prepara o regresso aos mercados sem se vislumbrar qualquer animação de
crescimento económico e a passadeira vermelha para esse regresso tem espinhos comprometedores
para esse crescimento, prolongando inapelavelmente os ventos recessivos que vêm
do exterior. Numa situação desta natureza, face ao aumento desmesurado do peso
da dívida pública, já na sequência e por força das consequências do resgate
financeiro mas também da degradação do financiamento externo das empresas públicas,
o deserto de crescimento atira a redução do peso da dívida pública para as
calendas, tornando cada vez inevitável a ocorrência de processos de
reestruturação dessa dívida. Tudo isto pressupondo que famílias e empresas
conseguem reduzir níveis de dívida ao exterior para limites aceitáveis.
Mas a economia portuguesa apresenta outras
restrições que o debate preto-branco tem escamoteado. E são restrições que
afetam o próprio crescimento. O confronto entre o PS e a maioria em matéria de
crescimento é débil e parece tudo resumir-se à questão do financiamento e do crédito.
Alguns exemplos de restrições que têm quedado
fora do debate:
- O matching necessário entre oferta e procura de qualificações na economia portuguesa;
- Os défices de produtividade;
- O equilíbrio necessário entre mercado interno e mercado externo;
- A valorização equilibrada dos espaços territoriais de crescimento.
Já é tempo de encontrar respostas para
ultrapassar estas restrições.
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