quinta-feira, 23 de maio de 2013

O QUE VALE A PENA


Refiro-me aqui, de vez em quando, a um livro que acabei de ler e que por algum motivo me impressionou. Desta vez, confesso-o, aponto para uma obra que ainda não li. Tudo motivado pela entrevista que o seu autor, Nuno Lobo Antunes (NLA), concedeu esta noite a José Alberto Carvalho na TVI24.

Um momento marcadamente intimista, mas intenso. Onde, a pretexto de S. José, se falou do significado da vida e de uma vida vivida sob o signo de uma procura pessoal de coerência, de beleza e de amor. Com a inteira consciência da falibilidade: “Eu, como homem de ciência, tenho que simultaneamente reconhecer o limite da minha inteligência, portanto tenho que admitir a possibilidade de o meu olhar não alcançar tudo. E, portanto, tenho que respeitar – pessoalmente o faço – a hipótese de estar enganado.”

NLA explicou que “[ser pai] é diferente para todos nós e é diferente para cada filho” e que “um filho é um espelho de nós próprios, de alguma maneira é uma imagem de nós que toma forma sozinha e depois, de alguma maneira, se independentiza. É um bocadinho de nós que cresce e depois voa. E portanto há, de alguma maneira, uma relação connosco próprios no filho que criamos. E isso é obviamente uma relação complexa, porque é um bocado de nós também que deserta, deserta no sentido que se afasta.”

Ou, inversamente, que “um pai deve ser um porto seguro, um porto e comunicação da sua própria humanidade, um transmissor de sentido, um transmissor de valores, um transmissor de sentimentos, alguém que – sendo obviamente fraco e frágil com qualquer ser humano – tenta todos os dias ser melhor e dar esse exemplo, dar um exemplo de coragem, dar um exemplo de verdade, dar um exemplo de caráter, dar um exemplo das escolhas verdadeiras, dar um exemplo de amor… e de dúvida também.”

E, perguntado sobre se encontra um sentido para tudo, NLA voltou a explicar: “Não na forma religiosa. Eu só queria encontrar uma coerência. Queria encontrar algo que os meus filhos pudessem seguir. Um dia, o meu filho disse-me ‘eu, às vezes, penso o que é que o pai diria nesta circunstância’. Isto é o supremo que um pai pode ouvir de um filho. (…) Eu acho que a nossa vida é a procura exatamente disso, do que vale a pena.”

Mas NLA foi ainda mais longe. Como quando sublinhou que “qualquer homem procura, penso eu, uma coerência na sua vida. Ele é testemunha de outras vidas e vive a sua vida. Eu tive a oportunidade, ou enfim as circunstâncias…, de ter uma noção muito clara da finitude. Como oncologista.” Acrescentando: “[assistir à morte] incontrolável, inesperada, injusta, os bons e os maus, os generosos e os avarentos. Eu escrevi, numa outra altura, que Deus era um franco-atirador, quer dizer, um sniper que parece atirar duma forma indiscriminada.” Para daí concluir: “Eu não encontro lógica, mas encontro um valor. Evidentemente que a lógica se pode encontrar na biologia, na transmissão dos genes de geração em geração. Mas isso não dá ao homem a grandeza, o sublime que, apesar de tudo, ele pode conter. E, do meu ponto de vista, esse sublime só é dado pelo amor, pelos afetos ao outro revelados. Nem é com generosidade, é um apelo incontrolável.”

Pelo meio, ficou ainda tempo para que nos revelasse que o pai, perguntado um dia sobre o que gostaria de deixar aos filhos, terá respondido: “o amor pelo belo”. Há noites assim…

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