segunda-feira, 13 de maio de 2013

DEBATES DO MOMENTO



Os tempos vão trágicos para as bolsas (as nossas, não as dos mercados financeiros), mas para as ideias económicas o campo é fértil.
O Financial Times tem sido o espaço de acolhimento de uma das mais recentes controvérsias que pode resumir-se na seguinte questão: a austeridade que dramaticamente empobrece os países da Europa do Sul a passos largos resulta da pressão dos mercados ou dos políticos?
Roger Altman (Evercore Partners, secretário de estado americano em 1993-94) e Martin Wolf (Financial Times) são os personagens em confronto, mas as suas posições são representativas de um campo mais alargado de intervenientes.
Altman vem em socorro dos países do Norte (mais propriamente dos políticos que exercem atualmente o poder), sustentando que são os mercados e não os políticos do Norte, já que em seu entender foram as dificuldades de acesso aos mercados, decididas por estes e não por aqueles, quando os credores internacionais decidiram não prolongar empréstimos a esses países, entre os quais Portugal. Daí a contínua subida dos yields dos títulos desses países sobretudo no período entre 2010 e meados de 2012. Os políticos estariam inocentes e a história atribuirá aos ditames dos mercados financeiros e dos credores invisíveis as razões da austeridade e não a sentimentos punitivos e de subjugação dos primeiros.
Wolf, pelo contrário, parte da evidência de que o Reino Unido e a Espanha apresentam trajetórias similares de peso líquido da dívida pública no PIB a partir de 2007/08 e apesar disso registam uma forte discrepância dos yields das suas dívidas soberanas, com forte penalização para a Espanha. E qual será a razão? Apenas o facto dos mercados perceberem que, no Reino Unido, há uma entidade, o banco central, que garante a liquidez no mercado da dívida soberana, ao passo que no caso espanhol, apesar dos esforços do BCE nos últimos tempos, não existe o tal garante de última instância da liquidez da dívida. Aliás, bastou Draghi chegar-se à frente, embora não resolvendo o pecado original da base estatutária do BCE, para que o declínio dos yields da dívida espanhola descessem.
Por conseguinte, não são os mercados que explicam os ditames da austeridade. São os políticos que não compreenderam que uma união económica e monetária é para levar até ao fim nas suas consequências e que despertaram os demónios da austeridade para ocultar as inconsistências do edifício que criaram. Poderiam, por exemplo, ter ressuscitado as teses de Keynes e trabalhado uma solução de permanência de moedas nacionais e uma moeda comum, um euro, para transações internacionais. Não o fizeram. Não sabemos se por má fé, incompetência ou simplesmente porque admitiram que passo a passo poderiam ir reparando as fragilidades do edifício, esperando que a pressão das dívidas soberanas sobre o edifício nunca se manifestassem com tanta premência e intensidade como aconteceu.
A melhor demonstração da não consistência das teses de Altman é a despropositada (pelo timing) intervenção de Schauble sobre uma união bancária a dois tempos. O ministro alemão sabe que o edifício continua frágil e que os custos da redenção pela austeridade nas economias do sul colocam a Alemanha sob o “fogo” da desconfiança mundial.
E Altman recua, não direi com o rabinho entre as pernas, ao confirmar na sua resposta a Wolf que a intervenção de Draghi em matéria de garantia da dívida soberana da eurozona reduziu substancialmente a necessidade de austeridade: “enquanto que a austeridade não foi opcional para grande parte da crise bancária e de dívidas soberanas de 2010-2013, é hoje em grande medida opcional”. Afinal em que ficamos? São os mercados a impor a austeridade ou ela resulta da incompetência política em não compreender que a base estatutária do BCE é um produto de um ditame ideológico que se atravessou no caminho da construção da união económica e monetária? A austeridade pela austeridade é sim do foro político e a história ao contrário do que Altman pensa reconhecerá a sua inconsistência.

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