segunda-feira, 5 de setembro de 2022

A VOLÁTIL LIZ CHEGA AO PODER

                                                                             


(A longa maratona determinada pela sucessão de Boris Johnson no partido Conservador e pelas regras constitucionais britânicas na chefia do Governo chegou ao fim com a vitória de Liz Truss, suplantando Rishi Sunak, seu adversário de fim de linha, depois de outros candidatos terem caído pelo caminho. Sondagens já publicadas sugerem que os britânicos em geral não esperam nada de especial da futura primeiro-Ministra. O que esperar então do novo rumo do Governo britânico? Para já, o rasto político deixado por Liz Truss desde os tempos da sua militância nos Liberais pode resumir-se num traço – volatilidade das ideias, rigorosamente gerida em função de uma trajetória de acesso ao poder.)

Na corrida à substituição de Boris Johnson cedo se percebeu que os candidatos com melhores capacidades iriam ficar pelo caminho, abrindo-se a curiosidade de saber quem iria à prova final. Os dois candidatos que chegaram a esse momento da decisão conservadora, Liz Truss e Rishi Sunak, eram possivelmente os mais próximos de Boris, embora um deles Sunak tenha feito os possíveis e impossíveis para desgrudar da imagem do primeiro-Ministro caído em desgraça.

Não por acaso venceu a candidata mais próxima de Johnson, sobretudo pela sua volatilidade e inconstância geridas ao sabor do momento mais conveniente para aceder ao poder, características que o ex-primeiro Ministro cultivou com esmero. E também não por acaso, na sua alocução de vitória, as palavras para Boris foram como se ele fosse o maior da Nação – ganhou o Brexit, esmagou Corbyn, resolveu o problema da vacinação e fez frente a Putin: “És admirado de Kyiv até Carlisle!”. Claro que a história que será contada daqui a alguns anos não será tão generosa como as palavras de Liz Truss e não me admiraria mesmo nada que a dita cuja nas próximas cenas para jogos de cintura não diga o pior do seu antecessor se isso for conveniente para gerir o tempo mediático da sua vidinha em Downing Street.

Como alguém dizia no Guardian (link aqui), Liz é portadora de um programa que visa cortar tudo e mais alguma coisa onde já está tudo cortado e onde os principais inimigos já não estão no horizonte e a ameaça trabalhista não é ainda muito consequente. Fazer frente a Putin e insinuar-se junto de Zelensky tal como Boris praticou com habilidade para apagar a má imagem interna talvez não chegue para inverter uma opinião pública que, segundo as sondagens conhecidas, espera pouco desta sucessão. As linhas programáticas que podem antecipar-se da sua alocução de vitória são de uma pobreza de fazer chorar as pedras. A ladainha da descida de impostos como grande fator de reanimação do crescimento económico já cheira mal que tresanda e o que a futura primeiro-Ministro antecipou de intervenção no National Health System e em matéria de crise energética não deve ter entusiasmado nem os seus apoiantes mais próximos.

Cheira-me que se os Tories estão profundamente divididos não vai ser a ação de Liz a colmatar tais diferenças, reunindo forças e interesses. Mas veremos.

Talvez o principal fator de interrogação que subsiste depois da sua alocução inicial seja o tom e processos com que Liz Truss retomará ou não negociações com a União Europeia, com o problema da Irlanda do Norte no centro de todas as preocupações.

E perante toda esta fragilidade até dói a inoperância trabalhista para dela tirar partido.

Se fosse britânico residente estaria preocupado.

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