quarta-feira, 28 de setembro de 2022

É PRECISO REFORMAR!

Ricardo Reis é um economista de 44 anos (natural do Porto, diga-se de passagem) que se doutorou em Harvard, que ensina na London School of Economics, que possui investigação publicada em quantidade e qualidade para o tornar um dos mais conceituados académicos do momento à escala internacional e que não deixa por isso de procurar refletir sobre a realidade da economia portuguesa e disso partir para uma intervenção ativa na vida pública nacional (designadamente através da alimentação de uma coluna semanal no “Expresso”). Vem tudo isto a propósito de uma sua entrevista à Rádio Renascença, que ontem foi dada a conhecer com a seguinte chamada em título: “Portugal não cresce há 22 anos. É impossível alguém de responsabilidade não achar que é preciso reformar.” Dado que já são inúmeros os “santos da casa” que se pronunciam nesse mesmo sentido, à direita e à esquerda ou antes pelo contrário, talvez que assim surja agora a oportunidade para que a renitente cabeça dos nossos responsáveis políticos possa minimamente abrir-se perante a frontalidade e clareza com que uma sumidade estrangeirada como Ricardo Reis se pronunciou, “num olhar de Londres sobre Portugal” (como escreveu a entrevistadora Maria João Cunha), sobre o que se passa no País.

 

No centro dessa caraterização do Portugal de hoje, está a seguinte e elucidativa passagem com que Ricardo Reis respondeu a uma pergunta sobre se Portugal precisa de um espírito mais reformador:

Com certeza que sim. Portugal já não cresce há 22 anos. Tirando a Itália, Portugal é o país que menos cresceu na Europa neste período. É o país que tem neste momento, na última década, uma emigração brutal. Saíram tantos portugueses, um rácio da população tão alto agora como nos anos 60, quando fugiam à guerra colonial. Portugal está num processo de estagnação profundo.

Vê-se, aliás, a forma como estamos à venda. Em Portugal, terrenos e casas estão a ser comprados por estrangeiros, que depois fazem dos portugueses caseiros. E é difícil olhar para esta situação e achar que este é um fado, que tem de acontecer assim.

Se Portugal crescesse nos últimos 20 anos como cresceu entre 1990 e 1997 – e não foram propriamente anos de grande prosperidade –, éramos hoje tão ricos como a Holanda. Seríamos hoje 40% mais ricos do que o que somos agora, para se ter uma noção do quão mau tem sido o desempenho económico dos últimos 22 anos.

Parece-me impossível que alguém de responsabilidade, quiçá mesmo brio profissional ou patriotismo, num cargo de liderança, olhe para esta situação e não ache que é preciso reformar. É preciso fazer algo para Portugal voltar a crescer, para que tantos portugueses não escolham abandonar o país por falta de possibilidades, como tem acontecido nos últimos 22 anos.

 

Ao que acrescentou ainda, interrogado sobre eventuais preocupações em termos de sustentabilidade da Segurança Social:

Com o envelhecimento da população, assim como com a forte emigração dos mais jovens e mais qualificados, torna-se insustentável um sistema no qual são os salários dos que trabalham que pagam a reforma dos pensionistas. Porque há menos pessoas que trabalham e porque, com a falta de crescimento económico, os que trabalham estão a produzir menos em termos relativos, sobretudo para o número de pensionistas que temos.

O problema está bem identificado, está estudado há bastante tempo. Isto quer dizer que a Segurança Social é insustentável. A manter nos próximos 20 anos o que foram os últimos 20, com certeza não há sistema que resista a esta falta de riqueza dos trabalhadores e a este engrossar do número de pensionistas.

Ao mesmo tempo, no entanto, importa resolvermos aquilo que é o problema crucial em Portugal, o problema do crescimento económico, e voltarmos a ter taxas de crescimento normais, ou mesmo um bocadinho acima de normais, para recuperar o tempo perdido nos últimos 20 anos.

Parece-me que esta prioridade resolveria muitos problemas em Portugal. Não ia resolver completamente o problema da sustentabilidade social, mas quase e, portanto, vamos concentrarmo-nos nesse que é o grande desafio.

 

Por fim, e a propósito da candente questão de uma hipotética redução da carga fiscal, adianta: “Portugal tem um problema de uma carga fiscal bastante elevada e, sobretudo, muito desencorajadora do crescimento e do sucesso. E esta seria uma boa altura para reformar esse sistema fiscal.

 

Deixo o registo. E, porque se diz que a esperança é a última a morrer, espero ardentemente que a palavra de Ricardo Reis possa chegar ao ouvido de António Costa em hora feliz de responsabilidade (quiçá mesmo brio profissional ou patriotismo), por forma a que este consciencialize a necessidade imperiosa de buscar um rumo para Portugal, desde logo ordenando aos seus ajudantes das Finanças e da Economia que arrepiem caminho em devida articulação com quem manda na bagunça dos fundos estruturais (dos excecionais do PRR aos ordinários que ainda apenas se avistam num longínquo e nebuloso horizonte). Serei mesmo um lírico incorrigível?

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