quinta-feira, 15 de setembro de 2022

WINDFALL TAX: EMPRESAS E PAÍSES

 


(Quando ontem em Estrasburgo, no Parlamento Europeu, Ursula Von der Leyen apresentou a sua proposta aos Estados-membros de um imposto extraordinário sobre os lucros excessivos de empresas energéticas e de um contributo dos produtores de combustíveis sócios para a crise vivida na União algumas forças políticas europeias devem ter visto subir a sua intensidade de incómodo. O PP espanhol de Feijoo, pela voz de um dos seus deputados, acusou os socialistas do PSOE de “comunistas biliosos” por essa proposta, o que diz bem da desorientação que ainda grassa pelas hostes do tão moderado Feijoo e estou a imaginar a perturbação que a proposta da Presidente da Comissão Europeia terá causado. A posição do PS em Portugal, para além de refletir diferenças de interpretação entre algumas das suas tendências, é mais moderada, invocando que já estará a ser aplicada fiscalidade específica sobre essas empresas. Mas o discurso de Von der Leyen em Estrasburgo vai colocar ao Governo alguns problemas, tão alinhado e respeitador de grande parte das posições da Comissão Europeia ele se apresenta. Entretanto, tal como o sempre perspicaz Economist o assinala, não só empresas estão a beneficiar excessivamente deste momento. Há pelo menos um país que está nessa situação. É verdade que não pertence à União e é conhecido pela sua política de ajuda internacional. Mas que está a ganhar uma pipa de massa, isso parece ser uma evidência…).

Já por repetidas vezes enunciei neste blogue a minha preocupação pela falta de clareza sobre os meandros da política energética em Portugal e pelo que ela contribui para o afastamento do cidadão comum relativamente às questões da política económica. Obviamente que tecnicamente a matéria não é de fácil explicação e entendimento, mas por vezes parece que toda a gente está apostada em torná-la ainda mais opaca. Questões como a do défice tarifário, os custos e contrapartidas que foi necessário assegurar para que Portugal se transformasse num referente de energias renováveis (que nos orgulha), as diferenças entre mercado regulado e não regulado e mais recentemente as apregoadas vantagens da excecionalidade solicitada por Portugal e Espanha para a “ilha energética” em que a Ibéria se transformou exigiriam um prontuário de perguntas e respostas pedagogicamente elaboradas.

É neste contexto que para alguns é de suspeição, para outros uma oportunidade de continuar a defender o indefensável, os combustíveis fósseis, e para mim apenas sinal de falta de clareza de informação que surge a questão dos impostos extraordinários sobre lucros excessivos. Confesso que não entendi a relutância do Governo em abraçar essa ideia e muito menos a entendo depois da posição da Comissão Europeia. E, por muito que custe ao PP de Feijoo, a Senhora Ursula Von der Leyen não é uma “comunista biliosa”, tanto mais que a proposta passou em Estrasburgo. A situação que vivemos é de grande excecionalidade e todos já percebemos (ver o meu post de ontem) que a tempestade perfeita de crise energética e pressão inflacionista vai determinar a impossibilidade de recuperação plena da perda de poder de compra que vai abater-se sobre os rendimentos do trabalho. Nestas condições, parece da mais elementar sanidade democrática que quem beneficia mais e excecionalmente com a situação possa contribuir para amenizar esse sacrifício. E há um mar de possibilidades para alocar as receitas desse imposto extraordinário. Por isso, gostaria de ver Costa e Medina explicarem a tal existência prévia de fiscalidade específica, já que a explicação que passou fugaz pelos media não me convenceu.

Mas há um pormenor que tem escapado ao observador comum. Não são apenas empresas de vários países a beneficiar com a crise energética. O sempre perspicaz Economist assinala na sua rubrica de eleição para qualquer europeísta convicto, a Charlemagne, página 28 da sua edição de 10 de setembro, que a Noruega está a beneficiar abundantemente da guerra da Ucrânia. Quarto exportador mundial de gás, compreende-se que a Noruega esteja a beneficiar abundantemente da situação. A estimativa feita pela revista fala de receitas anuais de cerca de 200 mil milhões de dólares (eletricidade, gás e petróleo), o que equivalerá a um cheque anual per capita de cerca de 40.000 dólares, que não anda muito longe do PIB per capita da União.

Claro que não podemos ignorar o valioso papel da Noruega na ajuda pública internacional e que o fenómeno da seca está também a perturbar a produção de energia elétrica no país. Mas como dizia o outro ou há moralidade ou comem todos. E se não podemos de um “windfall tax” sobre países, seria importante que a Noruega desse algum passo no sentido de facilitar as coisas aos consumidores europeus e oferecesse a sua quota parte de contributo para punir a Rússia pelo seu desplante militarizado.

A imagem que a revista dedica ao tema é ela própria uma maravilha de imaginação.

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