(Haverá provavelmente não apenas um candidato a ser considerado o pai inequívoco da designação da economia zombie. Mas não tenho dúvidas de que Paul Krugman é um dos seus mais arrebatados defensores e por isso a ele reporto. A economia zombie é composta de ideias e de práticas de política económica que não encontram nem na teoria fundamentação credível, nem nas evidências de exercício da política económica resultados que justifiquem a experimentação. Apesar disso, existem períodos em que tais ideias e práticas nos infernizam a vida, mais aos mais penalizados por tais medidas. Uma Grande Recessão, a economia de pandemia e de confinamento e agora a Guerra na Europa teriam em princípio bastado para enterrar a economia zombie, uma vez que nesses contextos ficou demonstrado o contrário. Mas não, não é assim, não fossem tais ideias zombies. Eis que as temos de novo e por isso adensa-se o mistério da sua resistência ao fracasso.)
Dizia alguém no Twitter (link aqui) a propósito da chegada meteórica de Liz Truss ao poder (as minhas desculpas por reproduzir o mau gosto da referência ao ciclo menstrual que veio junto): “Seria um resultado incrível ser eleita para a liderança do seu partido, tornar-se Primeira-Ministra, matar a rainha, dar cabo da libra e receber golpes de toda a parte tudo isto no período de um ciclo menstrual. Irreal girlbossing.”
Esclarecimento: Uma ‘Girlboss’ define-se como uma mulher confiável e capaz que prossegue as suas próprias ambições em vez de trabalhar para os outros ou de se estabelecer na vida. O Girlbossing pode também ser usado para descrever uma maneira de apresentar uma pessoa profissionalmentge bem-sucedida que faz brilhar a femininidade” (link aqui).
Mas o que é que Liz Truss tem que ver com a economia zombie e com o seu regresso?
Uma das ideias zombie que mais tem resistido à falta de fundamentação e de evidência, por conseguinte uma medida para agradar a alguns Troianos e não a todos os Gregos, é a da descida transversal de impostos. Claro que o zombie da ideia assenta num preciosismo. A descida é apresentada como transversal com esta fundamentação: tenta-se descer a carga fiscal dos mais vulneráveis e por invocação estranha do princípio da equidade desce-se os impostos aos mais ricos para “manter o equilíbrio”. Ora, Liz Truss, qual garbosa “blossing girl” atirou-se a essa descida transversal de impostos e arranjou um Chancellor que a compreendesse. Como muito boa gente antecipadamente explicou, os mercados reagiram mal à determinação da precipitada Liz, fizeram precipitar a queda da libra (e não foi a morte da Rainha que o explicou), reação sobretudo baseada na conclusão de que o endividamento futuro não era fiável, mesmo tendo o Reino Unido moeda própria e acesso aos mercados de financiamento que outros não apresentam. A subida das taxas de juro encontrou outro campo fértil para acontecer para além do alinhamento com os bancos centrais.
O insuspeito Martin Wolf descreve no Financial Times a sua perplexidade perante a insistência Trussiana na descida de impostos aos mais ricos, já que em comparação com a grande generalidade dos países europeus o Reino Unido tem navegado em ambiente de baixa regulação e impostos mais baixos. Não se entende por isso o fervor aliviador de Liz e pelos vistos os mercados, que não são sempre fiáveis na sua reação, também acharam que a Primeira-Ministra trouxe um fator de não confiança à economia britânica. O que espanta na reação dos mercados é eles terem reagido como se a decisão de Truss tivesse sido operada num país em desenvolvimento pouco confiável e não numa economia avançada, madura e confiável. O que não é propriamente uma entrada de leão ou de leoa neste caso. Krugman está certo quando nos alerta (link aqui): “Notem que quando economias avançadas incorrem em grandes défices públicos, espera-se que as suas moedas se valorizem. Isso acontece porque esperamos os bancos centrais subam as taxas de juro para compensar o impacto inflacionista do aumento do défice e essas taxas de juro mais elevadas tendem a atrair investimento estrangeiro”. Ora não foi isto o que sucedeu, mas o seu contrário.
A resiliência das ideias e práticas zombie só pode ser explicada pelo facto da ideologia e da política se superiorizarem aos macroeconomistas, que certamente se têm posto a jeito para serem ignorados. Ou então já há demasiados economistas zombie eles próprios já com os seus cérebros danificados pelo ataque zombie e pela sua estranha adesão ao movimento. Não desdenharia considerar esta segunda hipótese como também credível para explicar o fenómeno.
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