(Enquanto preparo uma visão mais distanciada e objetiva do plano Famílias Primeiro ontem apresentado por António Costa, a propósito do qual a proverbial falta de sentido das proporções que nos assiste está de novo instalada, regresso à preocupação manifestada no meu penúltimo post, com atenção dirigida à situação política italiana. O meu ponto é simples: a principal alteração está na recomposição da direita extrema italiana e sobretudo na emergência de um novo rosto e perfil de liderança que suplantam claramente todos os candidatos anteriores à liderança do radicalismo populista à moda de Itália.)
Não foi por acaso que escolhi abrir o post de hoje com a imagem acima. Nessa imagem, apresenta-se a tríade que caminha neste momento à frente das sondagens para as eleições de 25 de setembro. Ao centro, Giorgia Meloni líder dos Irmãos de Itália (só o nome assusta), ladeada pelos “personagens” Salvini da Liga e Berlusconi (grande consumidor de restaurador Olex) da Forza Itália, imaginando que os três “fofinhos” pertencem a este último.
A ascensão da direita radical e populista italiana vem de há muito tempo, primeiro com origem na divisão norte-sul que deu origem à proeminência da Liga Norte com Umberto Bossi, atualmente sob a liderança de Matteo Salvini, depois com o populismo de Berlusconi apoiado no seu poderio televisivo, entretanto fundido com o partido pós-fascista Aliança Nacional de Gianfranco Fini, o fenómeno do 5 Estrelas de Beppe Grilo (um palhaço na política) e mais recentemente o crescimento dos Irmãos de Itália.
Se analisarmos com atenção o perfil das diferentes personalidades que protagonizaram lideranças neste amplo movimento e se isolarmos o caso Berlusconi, é possível perceber que a liderança de Giorgia Meloni faz a diferença comparativa e em meu entender são essas diferenças que se têm projetado nas sondagens que colocam Meloni em primeira linha para o lugar de primeiro-Ministro, acaso não haja uma resistência de última hora aos apelos da direita.
Curiosamente, o ativismo político de Meloni inicia-se aos 15 anos no movimento juvenil da Movimento Social Italiano criado por fiéis a Mussolini e foi incubado num distrito de esquerda em Roma, o Garbatella que acolheu trabalhadores deslocados por Mussolini quando se realizaram obras no centro da cidade. É sintomático que, apesar das fortes ligações e memórias do ativismo de Meloni à herança de Mussolini, criteriosamente apagadas ou mitigadas para recompor uma imagem de combatividade, a recetividade que tem no eleitorado supera claramente o potencial político do seu partido. A sua experiência política é conhecida e foi mesmo a ministra mais jovem de sempre num governo em Itália (chefiado por Berlusconi), assumindo uma pasta para a juventude. As ligações e proximidades internacionais de Meloni não enganam ninguém. Eleita Presidente do partido dos Conservadores e Reformistas Europeus, trabalha de perto com o VOX de Abascal em Espanha e o Lei e Justiça polaco no Parlamento Europeu. O facto de não ter apoiado o governo de Draghi foi já um ato premeditado e urdido a pensar no futuro.
Doutrinariamente, o pensamento de Meloni não se diferencia sensivelmente do de Salvini ou Berlusconi. As raízes estão na Aliança Social, com temas vincados como o da família, dos valores tradicionais e obviamente anti-imigração.
O que faz então a diferença para que os Irmãos de Itália se destaquem na coligação e o eleitorado não receie as consequências em termos de contágio europeu e de cumplicidades esperadas com as derivas húngara e polaca?
Obviamente que são as características da personalidade de Meloni que explicam a situação. Nenhuma das lideranças que protagonizaram os ensaios da direita radical em Itália reunia essas características e é isso que vai marcar o embate de 25 de setembro, com riscos sérios de que o absurdo seja uma vez mais normalizado.
Sem comentários:
Enviar um comentário