domingo, 20 de outubro de 2013

ESCOLARIDADE E EDUCAÇÃO



Does Education Matter?: Myths About Education and Economic Growth foi um livro publicado no início da década de 2000, mais propriamente em 2002, de autoria de Alison Wolf que me marcou profundamente. Tratava-se, então, da primeira crítica consistente aos sistemas educativos, neste caso do britânico, enquanto sistemas baseados essencialmente na despesa (input-based) como forma de justificar o seu crescimento. Discutia-se então a resistência desses sistemas a serem avaliados do ponto de vista dos resultados alcançados, no fundo uma forma de situar as diferenças entre escolaridade e educação, entre estar numa escola e aprender a aplicar o conhecimento. Não sei se Maria Lurdes Rodrigues terá lido o livro, muito provavelmente sim. Foi o governo de Sócrates com Maria Lurdes Rodrigues como ministra da Educação que introduziu as primeiras lógicas de avaliação de resultados no sistema e sabemos o que isso provocou. Certamente hoje alguns dos críticos mais convictos da antiga ministra estariam dispostos, face ao sorrisinho manso e hipócrita do ministro Crato e ao que os apoquenta, a afirmar “Maria de Lurdes volta que estás perdoada”.
No New YorkTimes de ontem, a jornalista Annie Lowrey na interessante e sempre por nós visitada coluna Economix volta ao tema sobretudo em torno da obra e investigação de um economista do desenvolvimento, Lant Pritchett, investigador no think tank de Washington, Center for Global Development, que considero ser hoje em dia a fonte de pensamento mais inovador sobre as questões do desenvolvimento. A entrevista está disponível naquela coluna e tem material de muito interesse sobretudo para compreendermos a relação entre a educação e o crescimento económico, em regra apropriada pelo conceito de capital humano.
A pesquisa de Pritchett que se espraia pelo mundo desenvolvido e em desenvolvimento questiona se o aumento da escolaridade, medida pelo número de anos em que os jovens se encontram na Escola em atividades educativas, constitui um indicador seguro do nível de educação obtido. E conclui que, em muitos casos, esse desvio pode ter proporções significativas complicando a medida do contributo efetivo da educação para o crescimento económico. E conclui ainda que a minimização desse desvio pode constituir um indicador precioso da qualidade dos sistemas educativos. Outros economistas já mostraram que é sobretudo a dotação em capacidades cognitivas que influencia o crescimento económico e não apenas o número de anos de escolaridade.
Por isso, Pritchett foca sobretudo a necessidade de pensar em termos de sistema educativo, tendo em conta a sua globalidade e lógica de orientação: centrada na aprendizagem e não necessariamente na magnitude de frequência. Adicionalmente, defende soluções organizativas orientadas em função do contexto, designadamente local, que pode inclusivamente integrar a presença do ensino privado.
Numa época em que estão a chegar ao sistema educativo português públicos cada vez mais exigentes em termos de aprendizagem, sobretudo pelo seu passado (algum do qual já fora do sistema) e pela degradação dos meios familiares em que se inserem, a reflexão de Pritchett ser-nos-á bem útil. E a primeira avaliação da consequência das suas reflexões não é animadora: por razões bem conhecidas e pela inépcia e atraso com que a lógica de orientação política foi definida, nem o sistema está de boa saúde, com um capital de confiança reduzido entre os seus protagonistas e de descentralização efetiva estamos falados.

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