sexta-feira, 4 de outubro de 2013

ON FAIT SEMBLANT?

(Christo Komarnitski, http://www.segabg.com)

(Hélder Oliveira, http://expresso.sapo.pt)


(AnTOONio Colaço, http://fotos.sapo.pt)

Só vejo duas hipóteses para explicar o que está a acontecer por estes dias: ou o súbito ensandecimento de um conjunto de figuras políticas – o que só não é crível pela conjunção de acasos que tal revelaria, que não pela possibilidade de ocorrência em alguns casos individuais (veja-se, p.e., a figura ridícula que fez Cavaco em nosso nome na Suécia) – ou a súbita intervenção de uma entidade divina ou equiparada.

Explico-me, poupando em palavras ao dispensar os leitores deste escrito de citações infindáveis a recordar o que por aí foram dizendo, só nos tempos mais recentes, o presidente da República, o primeiro-ministro, o vice-primeiro-ministro e muitos outros notáveis próximos do poder – sobre o défice e o endividamento, sobre o caráter incontornável de um cumprimento das exigências dos credores, sobre os riscos e as certezas de um segundo resgate, sobre as múltiplas desgraças do nosso descontentamento, numa catadupa de declarações desencontradas e contraditórias.

Vários experts nacionais e internacionais também se exprimiram pelas mais diversas formas em sentidos convergentes com a ideia, aliás óbvia, de estarmos em maus lençóis. Depois vieram os “senhores da Troika”, discretas caras de pau de fato escuro a assinalar a ortodoxia e intransigência que foram fazendo constar imutáveis com a truculenta anuência dos inenarráveis Durão e Jeroen. E as indicações e recados que a comunicação social ia fazendo passar não eram diferentes – o “Público” e a sua bem informada correspondente em Bruxelas chegaram mesmo a fazer uma manchete em torno do anúncio de um segundo resgate a Portugal (estimado em 50 mil milhões de euros) que estaria já em preparação nas instituições troikistas.

Eis senão quando nos surge Portas nos ecrãs, acompanhado da sua secretária de Estado Albuquerque e do adjunto Moedas, a gritar vitória. Num ápice, tudo mudara por passes de mágica: o cenário macro, o sacrifício dos pensionistas, o aumento de impostos, a redescoberta dos consumos intermédios rebatizados em pequenas e médias poupanças, as escassas três voltas que faltam para a nossa consagração olímpica nos cinco mil metros e o retorno à ambicionada libertação e correspondente felicidade.

O que se passou, afinal? Talvez que alguém em Berlim, findo o processo eleitoral mas ainda quentes os seus ecos (das promessas de “nunca mais aos preguiçosos” à necessidade de uma coligação à esquerda), tenha dado umas ordenzinhas pacificadoras: “não é o momento, arranjem uma solução – nem que seja a fazer de conta”. E, porque manda quem pode, assim se passou a fazer com toda a naturalidade e a ficção nasceu – a ponto de, coincidência das coincidências, o “Deutsche Bank” ter repentinamente descoberto que comprar dívida pública portuguesa até pode ser um bom negócio!

Então é assim: os credores dizem-se satisfeitos e aprovam os dois exames regulares com alguns sinais pífios de dureza, o Governo aproveita para cantar vitória (ao Portas vendedor de feira de ontem só faltou uma repetição da charge do penta), Albuquerque prepara um orçamento para 2014 incumprível, o “mexilhão” vai pagando as somas que se lhe puderem exigir e que ficarão sempre aquém do suficiente; depois, lá para o meio do próximo ano, há de se ver – ou a carroça da retoma europeia comporta mais algum bodo aos pobres ou, em caso inverso, que se lixem os pobres!

Uma nota final: a ordem dos fatores, ou melhor, a hierarquia das imagens que abrem este post não é de todo arbitrária…

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