sábado, 19 de outubro de 2013

O (SEGUNDO) REGRESSO DE SÓCRATES



Porque será que, ocupando José Sócrates o espaço do comentário político de domingo praticamente no mesmo horário de Marcelo, a entrevista de hoje à revista do Expresso me parece um regresso mais efetivo do que o veiculado pelos comentários de domingo?
Talvez porque, tal como o próprio JS o admite, o regresso como comentador foi um disfarce para contrariar com tempo de antena ideias que, segundo ele, estavam a ser erradamente assacadas à sua governação. De facto, os comentários de domingo emergiram sempre como justificação ou ajuste de contas e isso explica, a meu ver, que passado o efeito surpresa do primeiro programa a sua evolução perdesse fôlego de audiência.
A entrevista é mais fluida e Sócrates teve a sorte de ter pela frente uma Clara Ferreira Alves que no fundo, no fundo o admira, sobretudo quando por diversas vezes no Eixo do Mal o tem comparado com o que o novo PM que nos saiu na rifa e nessa comparação parece aprovado, por mais que Pacheco Pereira os junte nas suas apreciações.
É um Sócrates mais letrado que nos surge na entrevista, refletindo essencialmente um ano de ciência política, já longe da referência à social-democracia de Bernstein que invocava nas suas primeiras entrevistas ao Expresso de há muitos anos. É também o JS com aquele “killer instinct” que o caracteriza e que tanto penaliza António José Seguro na sua tentativa de afirmação face ao passado.
Mas a vertente mais relevante da entrevista é de novo o tema da antecâmara do chumbo do PEC 4 e da queda do seu governo, questão que vai constituir, não tenho disso dúvidas, um dos grandes temas da história recente e sobretudo a base de interpretação do que pode ter sido um dos erros históricos da esquerda PCP e Bloco de Esquerda. Miguel Sousa Tavares não faz a coisa por menos: “E também o sabia o PCP e a CGTP, que, como manda a história, não resistiram à tentação do quanto pior, melhor. E sabiam-no Francisco Louçã e o Bloco de Esquerda, que, por razões que um psicanalista talvez explique melhor do que eu, se juntaram também à mais amoral das coligações direita/estrema esquerda, com o fim imediato e mais do que previsível de obrigar o país ao resgate e colocar a direita e os liberais de aviário no poder para fazer de nós o terreno de experimentação económica e desforra social a que temos assistido”.
Com todo este contexto, António José Seguro surge cada vez mais entalado entre o passado (Sócrates) e o futuro (António Costa).
O meu amigo Pedro Guedes de Oliveira tem hoje no Público um artigo onde tem a coragem de pôr preto no branco o que muito boa gente começa a pensar: Seguro não é homem para galvanizar muito as tropas. Mas pedir-lhe que, de sua livre vontade e em nome do seu tão propagado estadismo, abra uma passadeira vermelha à passagem de testemunho a Costa, é não conhecer bem as forças que suportam uma dada liderança política.

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