Estas duas recentes estreias
nacionais foram os primeiros filmes que vi de Yasujiro Ozu, realizador japonês
em relação ao qual a minha curiosidade aumentara significativamente na
sequência do resultado da votação dos realizadores questionados pela revista britânica
“Sight & Sound”, considerando “Viagem a Tóquio” o melhor filme de todos os
tempos (rivalizando com “Vertigo” ou “Citizen Kane”).
Apesar de a fasquia ter sido
assim colocada tão alto, os filmes – aquele de 1953 e o outro de 1962 e que
acabaria por se tornar a sua última obra em virtude da morte prematura do autor
– corresponderam por inteiro às melhores expectativas, confirmando Ozu como um
expoente da criação artística e um mestre do cinema clássico. Obras-primas,
portanto!
A estética é “rigorosamente
única”, composta como é por um sistema formal definido por constantes que
tipicamente identificam o autor – citando o editor da “Time Out” de Londres: “o
uso de planos curtos, filmados com a câmara quase sempre fixa e num ângulo
invulgarmente baixo em relação às personagens em plano; cortes simples, em vez
de fades, wipes ou dissolves;
sequência de paisagens e edifícios não só para iniciar os filmes mas também
para fornecer pontuação e ligações entre as cenas narrativas; a preferência
pelos diálogos do ‘dia-a-dia’, ultra-realistas, muitas vezes de tipo
aparentemente trivial; e uma preferência por histórias discretas, quase
desdramatizadas e evocativas das vidas ‘normais’ da classe média, que compunha
a maior parte quer da população japonesa quer, presumivelmente, do público de
Ozu”.
Os temas retratados são de grande
proximidade: a passagem do tempo e o desenvolvimento das relações num caso, o
envelhecimento e o amor paternal no outro. Mas o seu tratamento é feito através
de factos banais, quotidianos, como bem sublinha Jorge Leitão Ramos; embora
adicionando: “E, todavia, nesses eventos quase sem história, tudo o que é
essencial, tudo o que nos é vital: a vida, a morte, a solidão, o sofrimento, o
desencanto. E lá no fundo, uma espécie de ironia de quem constata que a vida é
assim e nem se entristece muito – tudo embalado numa beleza serena em que os
atores sorriem quase sempre e, civilizadíssimos, os sentimentos nunca
explodem.”
Concluo: ao contrário do que
algumas ideias feitas fazem constar, a essência do grande cinema nipónico não
se cinge ao génio de Kurosawa e Mizoguchi – a “genuína sabedoria sobre a
natureza humana” que Ozu tão espessamente revela também o qualificam para um
lugar imortal no pódio da sétima arte…
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