sexta-feira, 25 de outubro de 2013

A ESPANHA DE NOVO EM TRANSE

(Maixabel Lasa, con una foto de ella y su marido cuando tenían 16 años. / JULIÁN ROJAS.)


A Rajoy tudo acontece. O homem contaria por certo com uma passagem triunfal da sua maioria pela governação. Para além do resgate que não foi resgate a que foi obrigado pela insustentabilidade de uma faixa significativa da banca, teve de enfrentar os dados colaterais do caso Bárcenas que veio pôr a nu o que de mais oculto havia pelas bandas do PP.
Ora, para acrescer a toda esta série de pressões, temos esta semana o Tribunal Europeu de Direitos Humanos a condenar a aplicação pelo Supremo Tribunal espanhol da chamada doutrina Parot. Parecerá estranho que associemos a esta condenação uma situação de Espanha em transe. O problema é mais complexo do que parece. O que é na prática a doutrina Parot?
Em Espanha, a pena máxima é de 30 anos. Ora no caso dos etarras condenados por terrorismo o cúmulo de penas atira para uma condenação em alguns casos de cerca de 3.000 anos de prisão, como é o caso da etarra Inés del Rio. Face a estes casos, o Supremo Tribunal aplicou a lei que prevê a diminuição de anos de prisão na proporção de trabalho realizado no quadro do seu encarcelamento (na proporção de 1 dia de redução por cada dois de trabalho reconhecido). Aplicou-a não ao valor máximo do número de anos de prisão, mas cada a uma das condenações, ao abrigo do princípio da proporcionalidade das penas. Invocando questões de segurança nacional, o Supremo Tribunal pretendia impedir que terroristas considerados perigosos pudessem ser libertados em 15 anos.
A condenação por parte do Direito Europeu dos Direitos Humanos, agora confirmada pela não aprovação do recurso do Estado espanhol foi realizada invocando o princípio da legalidade pena que impede a aplicação retroativa de sentenças desfavoráveis e não salvaguardando desta vez o princípio da apreciação nacional das condições concretas de uma determinada legislação europeia. A questão é complexa pois aparentemente a etarra foi condenada na altura por legislação existente na época, não padecendo a decisão de retroatividade. O que houve na prática foi uma nova interpretação por parte do Supremo das condições que em 1973 estavam definidas para a redenção de penas. Ora, a decisão do TEDH rejeita essa nova interpretação, considerando-a ferida de ilegalidade penal.
Inés del Rio está neste momento libertada e os demónios gerados pela suicidária política da ETA estão totalmente à solta. Juan Manuel Píriz também acaba de ser libertado. Outros terroristas e delinquentes poderão beneficiar da decisão de Estrasburgo e a sociedade espanhola está em polvorosa. Anuncia-se uma grande manifestação onde estarão presentes as mais importantes figuras do PP, embora não a título de membros do governo.
Surpreendentemente e em total oposição ao transe que está instalado, o El País publica uma reportagem corajosa, controversa é certo, mas muito corajosa, sobre um encontro recentemente realizado entre a vítima, Maixabel Lasa (viúva do governador civil socialista de Gipuzkoa, Juan María Jáuregi) e o carrasco, o etarra Luis María Carrasco Asenguinolaza, condenado em 39 anos de prisão, encontro realizado ao abrigo de um programa piloto de aproximação entre condenados etarras e familiares de vítimas do terrorismo.
A reportagem é pesada, mas é atravessada pela esperança, difícil de compreender, mas visível.
Uma declaração do condenado emerge com toda a sua crueza:
Años de reflexión y de introspección hasta convertirme en la persona que ahora soy. Hasta redefinirme y abandonar la lógica fanática y sectaria en la que una vez me hallé ciegamente inmerso y abominar de todo aquello que quería dejar de ser y que deseaba no haber sido nunca. Años ásperos, duros, de discontinua pero tenaz evolución hasta depurar e instalar en mi fuero interno el sentimiento de culpa, de arrepentimiento, la necesidad de pedir perdón”.
Um pormenor terá removido a resistência compreensível da viúva: “El preso me dijo que no sentía nada bueno en él”.
Trágico e para memória futura de uma estratégia independentista fanática.

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