Nas minhas incursões profissionais pelo Algarve,
que explicam a minha ausência deste espaço, mergulhei ontem por terras de
Querença, na transição entre o barrocal algarvio, o Loulé interior, e o
Caldeirão. O objetivo inicial era tomar contacto com o potencial que a Fundação
Manuel Viegas Guerreiro, que honra a obra, a projeção e o significado para
Querença de um grande antropólogo português, representa para a animação de um
território singular que não faz parte dos roteiros mais vulgarizados do Algarve.
Dada a amabilidade de quem me acolheu nesta incursão, o Professor João
Guerreiro, o Engº Gabriel e o jornalista Idálio Revez do Público, acabei por
mergulhar no entorno imediato da Fundação, uma infraestrutura sóbria,
funcional, que procura agora como é padrão em muitos dos equipamentos culturais
nacionais passar da infraestrutura aos conteúdos e às práticas de animação
efetiva, ou seja à projeção sustentada da infraestrutura. O edifício da Fundação
articula-se bem com o pequenino centro de Querença, no qual uma intervenção
cuidada, salvo os exageros dos protetores em aço do espaço público contra
estacionamento selvagem (em Querença, caro Arquiteto que desconheço?), projeta
a pequena igreja para a centralidade visual que sempre ocupou na pequena praça.
Querença, recordam-se, foi especialmente badalada
a propósito do projeto de inserção na aldeia de nove jovens empreendedores que
desenvolveram ideias de projeto em estreita comunhão com a população local, que
não ultrapassará 850 habitantes, dos quais 10% serão população estrangeira que
se fixou para sempre ou episodicamente por estas paragens. Desse projeto
inovador e das ideias de projeto aí geradas não terão ficado resultados palpáveis,
tendo ficado pelo menos a conclusão de que tais projetos são possíveis e que a
população local, ao contrário de certos estereótipos, acolhe bem o agente de
animação exterior, desde que a metodologia de condução desses projetos a
envolva não como adorno mas como instrumento decisivo de amarrar ideias à
terra.
No seu estatuto de transição ou porta para o
Caldeirão, que estabelece uma ponte interessante entre o barrocal e a serra
algarvia, e que pode ser abordagem simbólica a outras pontes de que a
antropologia pode ser o veículo científico e cultural, Querença representa bem
a energia que ainda neste tipo de territórios, energia endógena que atrai cada
vez mais energias externas que podem virtuosamente combinar-se.
Nas imediações e no entorno ambiental de
Querença, um projeto turístico que pelas informações que obtive aguardou cerca
de 20 anos de apreciações, Quinta da Ombria, tudo indica que avançará tendo
obtido aprovação pública. É um projeto de grande dimensão e no fim de tarde,
quando viajava em direção ao aeroporto de Faro, para mais um voo Ryanair Faro-Porto
que continua praticamente lotado para meu espanto de curioso das migrações não padronizadas,
pensei cá para os meus botões o seguinte: o que pensariam hoje as duas personalidades
matriciais de toda a Querença, o antropólogo Manuel Viegas Guerreiro e o
Professor e cientista Manuel Gomes Guerreiro, do impacto potencial da Quinta da
Ombria no pequeno ecossistema de Querença?
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