sábado, 14 de fevereiro de 2015

POR TERRAS DE QUERENÇA



Nas minhas incursões profissionais pelo Algarve, que explicam a minha ausência deste espaço, mergulhei ontem por terras de Querença, na transição entre o barrocal algarvio, o Loulé interior, e o Caldeirão. O objetivo inicial era tomar contacto com o potencial que a Fundação Manuel Viegas Guerreiro, que honra a obra, a projeção e o significado para Querença de um grande antropólogo português, representa para a animação de um território singular que não faz parte dos roteiros mais vulgarizados do Algarve. Dada a amabilidade de quem me acolheu nesta incursão, o Professor João Guerreiro, o Engº Gabriel e o jornalista Idálio Revez do Público, acabei por mergulhar no entorno imediato da Fundação, uma infraestrutura sóbria, funcional, que procura agora como é padrão em muitos dos equipamentos culturais nacionais passar da infraestrutura aos conteúdos e às práticas de animação efetiva, ou seja à projeção sustentada da infraestrutura. O edifício da Fundação articula-se bem com o pequenino centro de Querença, no qual uma intervenção cuidada, salvo os exageros dos protetores em aço do espaço público contra estacionamento selvagem (em Querença, caro Arquiteto que desconheço?), projeta a pequena igreja para a centralidade visual que sempre ocupou na pequena praça.
Querença, recordam-se, foi especialmente badalada a propósito do projeto de inserção na aldeia de nove jovens empreendedores que desenvolveram ideias de projeto em estreita comunhão com a população local, que não ultrapassará 850 habitantes, dos quais 10% serão população estrangeira que se fixou para sempre ou episodicamente por estas paragens. Desse projeto inovador e das ideias de projeto aí geradas não terão ficado resultados palpáveis, tendo ficado pelo menos a conclusão de que tais projetos são possíveis e que a população local, ao contrário de certos estereótipos, acolhe bem o agente de animação exterior, desde que a metodologia de condução desses projetos a envolva não como adorno mas como instrumento decisivo de amarrar ideias à terra.
No seu estatuto de transição ou porta para o Caldeirão, que estabelece uma ponte interessante entre o barrocal e a serra algarvia, e que pode ser abordagem simbólica a outras pontes de que a antropologia pode ser o veículo científico e cultural, Querença representa bem a energia que ainda neste tipo de territórios, energia endógena que atrai cada vez mais energias externas que podem virtuosamente combinar-se.

Nas imediações e no entorno ambiental de Querença, um projeto turístico que pelas informações que obtive aguardou cerca de 20 anos de apreciações, Quinta da Ombria, tudo indica que avançará tendo obtido aprovação pública. É um projeto de grande dimensão e no fim de tarde, quando viajava em direção ao aeroporto de Faro, para mais um voo Ryanair Faro-Porto que continua praticamente lotado para meu espanto de curioso das migrações não padronizadas, pensei cá para os meus botões o seguinte: o que pensariam hoje as duas personalidades matriciais de toda a Querença, o antropólogo Manuel Viegas Guerreiro e o Professor e cientista Manuel Gomes Guerreiro, do impacto potencial da Quinta da Ombria no pequeno ecossistema de Querença?

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