Creio que foi Pedro Santos Guerreiro que, há
dias, no Expresso on line diário,
clamava que afinal a estrela era outra, ou seja que mais do que Tsipras era
Varoufakis que agitava as ondas. A presença mediática de Varoufakis é forte, o
que não significa necessariamente que seja portador das soluções de afrontamento
possível sem quebrar os laços da negociação. Mas, hoje, na conferência de
imprensa com o sisudo Schäuble, não
pude deixar de me recordar daquela posição reverente em que a TVI apanhou Vítor
Gaspar perante o mesmo Schäuble. Atitude
e dignidade não é para todos.
Mas a questão grega resvala cada vez mais para um
jogo de estratégia, em que cada um dos atores lança a sua jogada para
condicionar o comportamento dos restantes e dei comigo a pensar que é uma tragédia
Roberto Bolaño já não estar entre nós, pois escreveria certamente uma peça
fabulosa sobre este jogo de estratégia. A decisão do Conselho do BCE de
suspender a possibilidade dos títulos de dívida soberana grega poderem ser utilizados
como garantia de empréstimos do BCE aos bancos centrais remete em primeira
linha os problemas dos bancos gregos para um outro sistema de emergência através
do qual o banco central grego é ou não autorizado a prestar assistência de
tesouraria aos bancos a taxas mais altas e com limites estreitos impostos pela
supervisão do BCE. Uma interpretação literal deste lance é meramente
regulamentar. São regras meus caros, e seria um precedente comprometer a sua
aplicação. Mas pode haver uma outra interpretação para este mesmo lance. Draghi
pode querer pressionar não apenas as autoridades gregas mas também o Conselho
Europeu, a Comissão Europeia e o Eurogrupo para serem mais lestos na procura de
uma solução que possa salvar a face dos compromissos do SYRIZA e não acirrar os
eleitorados europeus menos propensos à solidariedade europeia.
É nestes momentos que é clara a perceção de que o
edifício do euro e dos mecanismos que o suportam não está preparado para situações
de stress, sendo por isso extremamente vulnerável à sagacidade, frieza e
inteligência dos que se movimentam pelo seu interior.
Entretanto, no universo dos que assistem a este
jogo de estratégia apenas com a pena do comentário e da opinião, pasmo de tanta
surpresa que tenho encontrado.
No “The Market Monetarist – markets matter, money matters” um blogue claramente
monetarista assinado por Lars Christensen, podemos ler uma vigorosa defesa da
proposta de Varoufakis de troca de dívida soberana grega por títulos indexados
ao crescimento. E apresenta evidência para o suportar. Baseado em trabalhos de
David Eagle, traz para a discussão a clara correlação negativa entre o crescimento
do produto das economias mais endividadas e a evolução do peso da dívida no
PIB, mostrando que no caso grego é a derrocada do produto, determinada por um
ajustamento de experimentação punitiva ao jeito da que se faz com ratinhos, que
essencialmente explica a escala do peso da dívida no PIB que o SYRIZA pretende
agora gerir. Christensen vai ao ponto de provocatoriamente recomendar a Jens
Weidman, presidente do Bundestag, que deveria apoiar a proposta de Varoufakis e
disseminá-la pelos países mais endividados.
Ou muito me engano ou já nada nos surpreenderá
nos próximos tempos.
Noutro plano, Kenneth Rogoff, a quem os austeritários
foram buscar talvez injustamente o racional para que níveis elevados de dívida
tinham que ser desalavancados, custe o que custar e doa a quem doer, vem no Project Syndicate (What is Plan B for Greece?) colocar-se ao lado dos
que recomendam flexibilidade, anulação parcial e redução de fluxos de pagamento
a curto prazo e recomendando mesmo a possível adoção de restrições à livre
circulação de capitais para evitar o pior. Meus caros, ou isto são efeitos retardados
do bug da folha de EXCEL de Reinhart e Rogoff que tanta controvérsia académica
criou na blogosfera económica, ou Rogoff está a ver melhor a situação dos que
nele se apoiaram para dar alguma pretensa cientificidade à deriva austeritária.
Aliás, há tempos em Lisboa, Rogoff já tinha alertado para a eventual
necessidade de anulações parciais de dívida, apesar do risco moral.
Que eu saiba, Schäuble
ainda não invocou nenhum racional de fundamentação económica para a
intransigência alemã. Creio que mesmo que o quisesse teria dificuldade em
encontrar patrono.
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