domingo, 29 de novembro de 2015

AINDA AS TAXAS DE JURO …




(Uma questão recorrente: os mercados podem falhar?)

As dificuldades de consolidar uma recuperação sólida na grande maioria das economias avançadas (para já não falar do Japão que luta há bastante mais tempo contra as incidências da deflação) têm colocado à prova as convicções dos economistas que esperavam que, de uma vez por todas, a época da Grande Moderação se iria impor macroeconomicamente. Por Grande Moderação é regra geral entendido o período de ciclos económicos suaves em que a política monetária e a independência dos bancos centrais pareciam ter dominado a turbulência e a incerteza. Assim, não foi tanto o despautério dos acontecimentos financeiros que marcou a crise dessas convicções, mas sobretudo a permanência da instabilidade e da turbulência após ter-se evitado a propagação do pânico financeiro.

Claro que é recorrente esse choque de convicções ser abordado por dois tipos de reações. Os macroeconomistas de pensamento mais aberto que não enjeitam a necessidade de revisão de princípios (seja porque atempadamente alertaram para a inconsistência dessas convicções, seja porque não procuram tapar as evidências com a peneira dos princípios) e os que se encasulam na ideia de que os mercados nunca falham, aguardando por isso o regresso às convicções perdidas ou abaladas.

A permanência das taxas de juro no ambiente profusamente documentado neste blogue do “Zero Lower Bound”, que já foi batizado por alguns como as economias ZLB, com taxas nulas ou negativas, tem continuado a abalar convicções e a despertar a movimentação do pensamento económico. De facto, a regra de conduta dos bancos centrais de se guiarem por um objeto de inflação de 2% está já há demasiado tempo desacreditada, apesar da prática generalizada de “quantitative easing” que tenta por diferentes vias e mecanismos estimular o crédito às economias e com isso vencer a pressão deflacionária. Poucas economias têm tentado combinar a política monetária com estímulos fiscais à procura e aumentos de despesa pública e por isso a política monetária se vê envolvida em processos cada vez mais insistente de “easing” monetário como acontece presentemente com a zona euro e o BCE.

Claro que os mais teimosos e resistentes à necessidade de rever convicções (muitas vezes por reflexo condicionado, inércia ou simplesmente receio de perda de notoriedade) teriam que se lembrar do inimaginável, mais propriamente culpar as próprias políticas de estímulo monetário pelo valor pretensamente anormal das taxas de juro. John Taylor é o autor dessa façanha e percebe-se a sua incomodidade em toda esta história. Taylor é o economista que deu o nome à regra pretensamente de ouro dos bancos centrais que conduziria o tal período da Grande Moderação (a chamada regra de Taylor), estruturada em torno do objetivo dos 2% de inflação. Ora, essa regra enquanto as expectativas inflacionárias não se instalarem de novo fará papel de relíquia.

Bradford DeLong dedica-lhe no Project Syndicate uma desmontagem frontal, chamando a atenção para uma expressão de Olivier Blanchard sobre estas situações de convicções abaladas e para as quais a teoria económica tarda em propor explicações consequentes. O que Blanchard chama os “cantos escuros da economia”. E, neste caso, a boa orientação está em procurar as razões na própria situação em que as economias avançadas se encontram e aí admitindo-se que haverá rumos que apontam para as condições de oferta e outras para as condições de procura. No fundo, bem lá no fundo, emerge a recorrente convicção de que os mercados não falham e daí a vontade de culpar as intervenções de política, sobretudo as mais inusitadas e esdrúxulas, pelas anomalias que ferem convicções. E os Taylors deste mundo não desaparecerão nunca …

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