quarta-feira, 25 de novembro de 2015

SERÁ QUE O CRESCIMENTO ESTÁ A MUDAR NAS ECONOMIAS AVANÇADAS?

(Taxas de crescimento da produtividade do trabalho e da relação K/L)



(Reflexões simples em torno de ferramentas simples mesmo sem resolver as questões da causalidade)

É conhecido de todos, pelo menos dos que vão tendo acesso a informação económica por mais rudimentar que ela seja, que o crescimento económico dos últimos tempos nas economias mais avançadas já teve melhores dias. E não se trata muito provavelmente de fenómeno ou de maleitas passageiras. Todas as previsões para um futuro próximo apontam para a moderação do crescimento. E o facto das chamadas economias emergentes se juntarem ao clube dos ritmos moderados de crescimento ainda adensa mais as preocupações. É claro que o mundo está cada vez mais fragmentado, não se recomenda em muitas partes do mundo, e isso pode afugentar do investimento operadores que não façam dos ambientes de risco bélico o seu ambiente natural para ganhar dinheiro.

Como tenho vindo a divulgar neste blogue, o tema hoje em debate com disseminação sobretudo a partir dos EUA da estagnação secular é uma ilustração relevante de que a crise estrutural do crescimento começa a interpelar os economistas. Afinal sempre será melhor ir por aí do que refugiar-se na retórica estafada das reformas estruturais, as quais como tenho referido têm muito pouco de estruturais no velho sentido do que a economia do desenvolvimento costuma designar de mudança estrutural. Não importa por agora estruturar esse debate da estagnação secular. Tenho vindo a fazê-lo em posts sucessivos, trazendo para este espaço algo que o debate económico tem olimpicamente ignorado. De uma forma estúpida e leviana, diga-se. Uma economia pequena e aberta como a portuguesa, que não queira ser uma feitoria chinesa (a expressão é de Félix Ribeiro) e que vise mercados exigentes que possam estimular as curvas de aprendizagem das empresas portuguesas e não mercados para esgotar capacidade produtiva instalada e definhá-las, não pode ficar indiferente ao tema da estagnação secular. É tão só o potencial de aprofundamento dos seus mercados de exportação que estará em causa. Basta por agora ter em conta que os economistas se dividem entre os que identificam na estagnação secular problemas de oferta (por exemplo uma desaceleração tecnológica, algo difícil de reconhecer nos tempos de hoje) e os que projetam a sua atenção em fatores de debilitação da procura a longo prazo, designadamente do investimento.

Mas há economistas que se interrogam sobre a questão de saber se o tipo de crescimento económico não estará a mudar, extrapolando o que os últimos anos nos vão dando em termos de composição desse crescimento e da produtividade. Há várias maneiras de aproximar o problema. Aprecio bastante os economistas que o fazem com ferramentas simples, assumindo uma abordagem por aproximações sucessivas à complexidade desses problemas. Aproximações sucessivas porque não vão diretamente à causalidade última dos mesmos. Sabemos que o problema da causalidade em economia tem conduzido ao fracasso inúmeros projetos de investigação, seja porque caem em busca de uma causalidade que não se consegue destrinçar, seja porque acaba por se vender gato por lebre, confundindo imensas vezes correlações com causalidade. As aproximações sucessivas levam por exemplo alguns economistas a explorar visões “contabilísticas”, que não são mais do que decomposições de identidades entre variáveis, segundo um modelo de decompor melhor para ensaiar melhores explicações. Um exemplo clássico e dos mais elementares é o da decomposição do produto per capita em duas variáveis apenas:

PIB per capita = (Y/L) x (L/N) em que Y=PIB, L=Emprego, N=População e segundo a qual o produto per capita é equivalente a uma multiplicação entre a produtividade do trabalho e a taxa de emprego. Uma transformação matemática simples permitirá dizer que a taxa de crescimento do produto per capita é igual ao somatório das taxas de crescimento da produtividade (componente intensiva) e da taxa de emprego (componente extensiva).

Numa abordagem desta natureza, a causalidade não é analisada. Há simplesmente a intuição de que por exemplo um baixo crescimento do produto per capita pode ser devido a comportamentos de crescimento débil da produtividade e da taxa de emprego ou de ambas.

Dietz Vollrath um economista alemão da Universidade de Houston dirige um blogue Growth Economics Blog que muito respeitosamente se autoproclama como um blogue que leva muito a sério os contributos de Robert Solow para o crescimento económico. Ora se há economista que merece o respeito de muitas gerações, por mais comentário crítico que tenham suscitado os seus contributos para a moderna teoria do crescimento económico, é o Nobel Robert Solow. Solow é uma personalidade fascinante. É autor de um dos mais dificilmente indestrutíveis modelos de crescimento económico, podendo por essa via ser considerado um economista de mainstream na formação macroeconómica de base, mas continua apesar da sua idade a ser um crítico feroz da banalização da teoria do crescimento com que alguns economistas mais sofisticados quiseram embalar o produto. 

Aos trabalhos de Solow deve-se a inspiração da chamada contabilidade do crescimento económico, a qual baseada numa ferramenta questionável, a função de produção com rendimentos à escala constantes, consegue decompor o crescimento económico em duas dimensões, a extensiva baseada no crescimento dos inputs trabalho e capital e a componente intensiva baseada nas melhorias globais de eficiência ou produtividade total dos fatores.

É possível demonstrar (aqui não realizado por motivos óbvios) que com essa ferramenta se pode chegar a uma expressão do tipo:

Taxa de crescimento da produtividade total dos fatores = Taxa de crescimento da produtividade do trabalho (Y/L) – α Taxa de crescimento da razão Capital /Trabalho (K/L) em que α representa o peso do capital nos custos de produção ou, dito de modo, da percentagem dos rendimentos do capital no rendimento.

Interpretando em termos largos esta equação, a produtividade total dos fatores (melhorias globais de eficiência e organização) é também o resultado de um fenómeno intensivo (a produtividade do fator trabalho) e de um outro extensivo (o montante de capital por unidade de trabalho).

Vollrath trabalha dados da economia americana publicados pelo BLS (Bureau of Labour Statistics) que respeitam apenas ao setor empresarial privado e que não englobam a dimensão de capital habitação própria.

A curiosidade aqui não mata o gato. Nos últimos 8 anos, a produtividade total dos fatores do crescimento do setor empresarial privado tem crescimento anémico, o que já se suspeitava. Mas a curiosidade está no facto da relação K/L estar a descer, pela combinação de um fraco crescimento de K e de um maior crescimento de horas de trabalho trabalhadas L. Mais paradoxalmente é que α também tem subido o que na nossa equação significa que o rácio K/L conta mais para a explicação da produtividade total dos fatores. Vollrath anota também que o comportamento anémico de K não se deve a uma recomposição das diferentes componentes desse capital (equipamentos, infraestruturas, stocks, software, etc.).

Face ao que era conhecido das grandes tendências do crescimento económico moderno, tínhamos por adquirido que K/L tinha estruturalmente um comportamento crescente.

Resumo dos resumos, os factos estilizados do crescimento já não são o que eram ou então estamos perante fenómenos episódicos estranhos, sobretudo atendendo à sua duração. Tudo isto com ferramentas simples e abordagens simples. A causalidade aguarda, entretanto. A vida dos economistas é de facto difícil, sobretudo se a virtude da prudência no rigor nos acompanhar.

Podem acompanhar as reflexões de Dietz Vollrath aqui e aqui.

E assim acaba este introdução aguardando que o governo que amanhã é empossado nos traga motivos positivos para abrilhantar este blogue.

Nota final: estou algo espantado. José Mendes Vice Reitor da Universidade do Minho e Presidente da Assembleia-Geral da Liga de Clubes, secretário de Estado, apenas? Pensei humildemente que a trajetória desse para Ministro.

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