(Taxas de crescimento da produtividade do trabalho e da relação K/L)
(Reflexões
simples em torno de ferramentas simples mesmo sem resolver as questões da
causalidade)
É conhecido de todos, pelo menos dos que vão
tendo acesso a informação económica por mais rudimentar que ela seja, que o
crescimento económico dos últimos tempos nas economias mais avançadas já teve
melhores dias. E não se trata muito provavelmente de fenómeno ou de maleitas
passageiras. Todas as previsões para um futuro próximo apontam para a moderação
do crescimento. E o facto das chamadas economias emergentes se juntarem ao
clube dos ritmos moderados de crescimento ainda adensa mais as preocupações. É claro
que o mundo está cada vez mais fragmentado, não se recomenda em muitas partes
do mundo, e isso pode afugentar do investimento operadores que não façam dos
ambientes de risco bélico o seu ambiente natural para ganhar dinheiro.
Como tenho vindo a divulgar neste blogue, o tema hoje em
debate com disseminação sobretudo a partir dos EUA da estagnação
secular é uma ilustração relevante de que a crise estrutural do
crescimento começa a interpelar os economistas. Afinal sempre será melhor ir
por aí do que refugiar-se na retórica estafada das reformas estruturais, as
quais como tenho referido têm muito pouco de estruturais no velho sentido do
que a economia do desenvolvimento costuma designar de mudança estrutural. Não
importa por agora estruturar esse debate da estagnação secular. Tenho vindo a
fazê-lo em posts sucessivos, trazendo para este espaço algo que o debate
económico tem olimpicamente ignorado. De uma forma estúpida e leviana, diga-se.
Uma economia pequena e aberta como a portuguesa, que não queira ser uma
feitoria chinesa (a expressão é de Félix Ribeiro) e que vise mercados exigentes
que possam estimular as curvas de aprendizagem das empresas portuguesas e não mercados
para esgotar capacidade produtiva instalada e definhá-las, não pode ficar
indiferente ao tema da estagnação secular. É tão só o potencial de
aprofundamento dos seus mercados de exportação que estará em causa. Basta por
agora ter em conta que os economistas se dividem entre os que identificam na
estagnação secular problemas de oferta (por exemplo uma desaceleração
tecnológica, algo difícil de reconhecer nos tempos de hoje) e os que projetam a
sua atenção em fatores de debilitação da procura a longo prazo, designadamente
do investimento.
Mas há economistas que se interrogam sobre a questão de
saber se o tipo de crescimento económico não estará a mudar, extrapolando o que
os últimos anos nos vão dando em termos de composição desse crescimento e da
produtividade. Há várias maneiras de aproximar o problema. Aprecio bastante os
economistas que o fazem com ferramentas simples, assumindo uma abordagem por
aproximações sucessivas à complexidade desses problemas. Aproximações
sucessivas porque não vão diretamente à causalidade última dos mesmos. Sabemos
que o problema da causalidade em economia tem conduzido ao fracasso inúmeros
projetos de investigação, seja porque caem em busca de uma causalidade que não
se consegue destrinçar, seja porque acaba por se vender gato por lebre,
confundindo imensas vezes correlações com causalidade. As aproximações
sucessivas levam por exemplo alguns economistas a explorar visões
“contabilísticas”, que não são mais do que decomposições de identidades entre
variáveis, segundo um modelo de decompor melhor para ensaiar melhores
explicações. Um exemplo clássico e dos mais elementares é o da decomposição do
produto per capita em duas variáveis apenas:
PIB per capita = (Y/L) x (L/N) em que Y=PIB, L=Emprego,
N=População e segundo a qual o produto per capita é equivalente a uma
multiplicação entre a produtividade do trabalho e a taxa de emprego. Uma
transformação matemática simples permitirá dizer que a taxa de crescimento do
produto per capita é igual ao
somatório das taxas de crescimento da produtividade (componente intensiva) e da
taxa de emprego (componente extensiva).
Numa abordagem desta natureza, a causalidade não é
analisada. Há simplesmente a intuição de que por exemplo um baixo crescimento
do produto per capita pode ser devido
a comportamentos de crescimento débil da produtividade e da taxa de emprego ou
de ambas.
Dietz Vollrath um economista alemão da Universidade de
Houston dirige um blogue Growth Economics
Blog que muito respeitosamente se autoproclama como um blogue
que leva muito a sério os contributos de Robert Solow para o crescimento
económico. Ora se há economista que merece o respeito de muitas gerações, por
mais comentário crítico que tenham suscitado os seus contributos para a moderna
teoria do crescimento económico, é o Nobel Robert Solow. Solow é uma
personalidade fascinante. É autor de um dos mais dificilmente indestrutíveis
modelos de crescimento económico, podendo por essa via ser considerado um
economista de mainstream na formação
macroeconómica de base, mas continua apesar da sua idade a ser um crítico feroz
da banalização da teoria do crescimento com que alguns economistas mais
sofisticados quiseram embalar o produto.
Aos trabalhos de Solow deve-se a inspiração da chamada
contabilidade do crescimento económico, a qual baseada numa ferramenta
questionável, a função de produção com rendimentos à escala constantes,
consegue decompor o crescimento económico em duas dimensões, a extensiva
baseada no crescimento dos inputs
trabalho e capital e a componente intensiva baseada nas melhorias globais de
eficiência ou produtividade total dos fatores.
É possível demonstrar (aqui não realizado por motivos
óbvios) que com essa ferramenta se pode chegar a uma expressão do tipo:
Taxa de crescimento da produtividade total dos fatores =
Taxa de crescimento da produtividade do trabalho (Y/L) – α Taxa de crescimento
da razão Capital /Trabalho (K/L) em que α representa o peso do capital nos
custos de produção ou, dito de modo, da percentagem dos rendimentos do capital
no rendimento.
Interpretando em termos largos esta equação, a
produtividade total dos fatores (melhorias globais de eficiência e organização)
é também o resultado de um fenómeno intensivo (a produtividade do fator
trabalho) e de um outro extensivo (o montante de capital por unidade de
trabalho).
Vollrath trabalha dados da economia americana publicados
pelo BLS (Bureau of Labour Statistics) que respeitam apenas ao setor
empresarial privado e que não englobam a dimensão de capital habitação própria.
A curiosidade aqui não mata o gato. Nos últimos 8 anos, a
produtividade total dos fatores do crescimento do setor empresarial privado tem
crescimento anémico, o que já se suspeitava. Mas a curiosidade está no facto da
relação K/L estar a descer, pela combinação de um fraco crescimento de K e de
um maior crescimento de horas de trabalho trabalhadas L. Mais paradoxalmente é
que α também tem subido o que na nossa equação significa que o rácio K/L conta
mais para a explicação da produtividade total dos fatores. Vollrath anota
também que o comportamento anémico de K não se deve a uma recomposição das
diferentes componentes desse capital (equipamentos, infraestruturas, stocks,
software, etc.).
Face ao que era conhecido das grandes tendências do
crescimento económico moderno, tínhamos por adquirido que K/L tinha
estruturalmente um comportamento crescente.
Resumo dos resumos, os factos estilizados do crescimento
já não são o que eram ou então estamos perante fenómenos episódicos estranhos,
sobretudo atendendo à sua duração. Tudo isto com ferramentas simples e
abordagens simples. A causalidade aguarda, entretanto. A vida dos economistas é
de facto difícil, sobretudo se a virtude da prudência no rigor nos acompanhar.
E assim acaba este introdução aguardando que o governo que
amanhã é empossado nos traga motivos positivos para abrilhantar este blogue.
Nota final: estou algo espantado. José Mendes Vice Reitor
da Universidade do Minho e Presidente da Assembleia-Geral da Liga de Clubes,
secretário de Estado, apenas? Pensei humildemente que a trajetória desse para
Ministro.
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