quarta-feira, 4 de novembro de 2015

OSBORNE EM BERLIM




(O complexo condicionamento da Europa também passa por aqui)

Tenho neste blogue dedicado especial atenção ao pensamento expresso de George Osborne, ministro das Finanças do Reino Unido. A razão é simples e não aponta para qualquer perspetiva persecutória. Entre as personalidades cinzentas e opacas da direita europeia não totalitarizante o pensamento de Osborne merece ser seguido com atenção, sobretudo porque é tudo menos cinzento e opaco. Ele aponta de modo cristalino para os novos rumos dessa direita, sobretudo se lhe for aberto o caminho do poder, como aconteceu com os erros trágicos dos trabalhistas britânicos na era pós Tony Blair. Não há evidências totalmente explícitas dessa possibilidade, mas a jovem direita que levou Passos e Portas ao poder seguirá com atenção o novo pensamento conservador. Daí o meu interesse em monitorizar o que tal pensamento vai revelando.

Esta semana passou algo despercebida na imprensa portuguesa a presença de Osborne em Berlim para um discurso na representação em Berlim da chamada VOZ da indústria alemã, a BDI. No meio de um discurso fortemente afetivo e laudatório da Wertegemeinschaft, a comunidade de valores partilhados alemã, que trouxe ao discurso a experiência da família húngara de Osborne na guerra fria e a forte proximidade a Schäuble que partilha com Osborne o estatuto de ministro das Finanças mais antigo da União Europeia, o discurso de Osborne é uma peça fundamental para compreender o que querem os conservadores da União Europeia.

Do ponto de vista da guerra de perspetivas de condução da política macroeconómica na UE e na zona Euro, a aproximação britânico-alemã, ou se quiserem o eixo Londres-Berlim, tem um significado muito especial. A Alemanha e agora o Reino Unido por via da maioria absoluta dos conservadores são os países da UE que afirmam expressamente a prevalência dos excedentes orçamentais como prioridade máxima da gestão macroeconómica. Uma aproximação concertada entre estes dois países, mesmo que dentro e fora da zona euro, tem um peso que não pode ser subestimado na manutenção dos princípios da poupança fiscal que tanto dano está a provocar na situação global europeia. E o tom do discurso foi até ao ponto de glorificar a parceria Lewis Hamilton – Mercedes, com a nota de que a viatura foi produzida no Reino Unido.

O discurso de Osborne (ver aqui a sua transcrição) é uma peça importante para compreender o que é que os conservadores entendem por União Europeia reformada, ideia em torno da qual irão defender no referendo de 2017 a continuidade de integração nessa União do Reino Unido. Uma União a duas moedas, euro e libra, em que esta última tenha sempre uma palavra a ser proferida nos assuntos da zona Euro. Uma União em que quem não integra a união monetária não possa ser discriminado por isso, ou seja, não discriminando agentes económicos que não utilizem a moeda Euro. Uma União mais desburocratizada, com o mercado único como foco central e, consequentemente, em que a Europa social seja relegada para o âmbito dos princípios pios e desejáveis, mas não prioritários. Uma União para a competitividade e o social que espere ou que se dane. Uma União que liberalize em absoluto o universo do comércio dos serviços e dê resposta aos pesos de 80% e 70% nos produtos dos respetivos países UK e Alemanha, respetivamente. Uma União que respeite os desejos nacionais de dosear, limitar ou reforçar a integração nas instituições europeias. Uma União que não force os contribuintes dos países que estão fora do Euro a contribuir para os que sentem dificuldades de presença nessa união monetária. Uma União que avance definitivamente para o mercado único de serviços.

Pois é! Os conservadores não quererão mais nada?

De facto, o condicionamento também passa por aqui.

Post Scriptum

Os ecos jornalísticos após o discurso de Osborne vão no sentido da compreensão alemã para com as preocupações britânicas, o que adensa o condicionamento (vejam-se ecos no Financial Times dessa compreensão).

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