(E todos
disseram de sua justiça)
Interroguei-me sobre os critérios que terão
levado o Presidente a 66 dias de zarpar para a praia da Coelha a escolher
aquele grupo de sete economistas, admitindo que Carlos Costa foi ouvido na
qualidade institucional de governador do Banco de Portugal. E de facto não me
apercebi de um critério firme mas talvez na melhor das hipóteses de um conjunto
de critérios que Cavaco terá alinhavado para justificar a sua escolha, recusando-me
a reconhecer naquele conjunto de personalidades qualquer desajeitada tentativa
de pluralidade.
E a primeira conclusão é o reconhecimento de que todos
quiseram aproveitar o sempre útil momento de encontro com a comunicação social,
quando poderiam ter exercido o seu direito de serem ouvidos pelo Presidente e
reservar silêncio sobre o que terão dito lá dentro, mesmo admitindo que os dois
registos podem não coincidir.
A segunda conclusão é que o critério do Presidente não
terá passado pela valorização do saber académico. Nenhuma das personalidades
ouvidas é conhecida pelo seu prestígio académico de produção representativa
entre os seus pares. Com exceção do último trabalho de Vítor Bento que, com
alguma elasticidade, pode ser considerado trabalho académico, não é conhecida a
qualquer um dos presentes nenhum trabalho académico ou científico recente,
mesmo alargando o período de classificação de recente. O que não deixa de ser
elucidativo do modo como Cavaco valoriza o pensamento universitário na área da
economia.
A terceira conclusão é que se o registo interno no
conforto dos sofás de Belém foi idêntico ao que se ouviu cá fora, a pobreza
franciscana dos testemunhos mostra bem o que a população portuguesa pode
esperar destas inteligências. Se da múmia petrificada em que João Salgueiro se
transformou não esperaria nada de relevante, dos restantes o benefício da dúvida
permitiria alimentar algumas ilusões. Infundadas. Aliás é curioso como alguns
críticos da maioria cessante como Bagão Félix e até Vítor Bento, quando
oportunamente reconheceu a falência absoluta dos processos de ajustamento,
ignoraram agora o seu pensamento anterior e lá se deliciaram a reclamar o
casamento do PS com a direita. Claro que sem a honestidade político-intelectual
de analisar que direita é esta, que valores ela prossegue e se eles são sequer
compatíveis com uma visão social-democrata em que o PS pudesse encontrar algum
abrigo de cooperação. Teixeira dos Santos parece ter corrigido a pontaria de
abordagens anteriores, mas optou por um testemunho orçamentalmente cifrado, não
se comprometendo. Das intervenções de Campos e Cunha e Augusto Mateus não
consegui reter uma ideia que fosse de substancial.
No fim de contas, tenho de reconhecer que o menos inócuo
foi Daniel Bessa, creio que ouvido na qualidade de responsável pela COTEC, ao
menos um critério que se compreende. Pois o testemunho de Daniel Bessa foi
simultaneamente divertido e corajoso. Divertido, porque aquela rábula inicial
de que não percebia nada de política é de rir até às lágrimas. Corajoso, porque
pelo menos enunciou a sua respeitável tese de que a aposta no aumento do
consumo interno e no próprio mercado interno lhe parece duvidosa para uma
economia com as características de economia pequena e aberta como a nossa. É um
pronunciamento a ter em conta, sobretudo porque a meu ver o PS não tem vincado
bem que a sua aposta no consumo interno é macroeconomicamente uma medida de
transição para proporcionar uma transição mais suave em que a aposta no
investimento e na exportação surjam como apostas mais estratégicas e
estruturadas.
A audição do grupo dos sete mostra duas coisas: primeiro,
que a academia económica já há muito se entregou a uma nulidade de pensamento
socialmente útil e que valha a pena ouvir, não sabendo se o ignorar de Cavaco do mesmo significa essa desvalorização ou apenas uma questão de preferências
pessoais; segundo, que os economistas mais “practitioners”
parecem ter aderido aos discursos redondos e “não me comprometas que não sei o
dia de amanhã”. Por uma e outra razão, se vê que a profissão está em crise, aliás
como o longo e penoso despertar da crise de 2007-2008 o antecipava. Ou então, o
círculo vicioso de ler e escrever para a imprensa económica das banalidades vai
adulterando o traço da escrita e do pensamento. Acontece.
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