sábado, 26 de abril de 2014

POST-CRASH ECONOMICS SOCIETY



Não é a primeira vez que este movimento nascido por iniciativa dos estudantes da Universidade de Manchester tem acolhimento neste blogue. A questão é extremamente relevante, pois significa que pelo menos alguma academia, neste caso os principais interessados na qualidade da formação em economia aí ministrada, mostram não ter o sentido crítico adormecido. De facto, a apatia com que a generalidade dos estudantes em economia absorve tudo o que lhe impingem é preocupante e não permite antecipar um grande otimismo quanto ao sentido crítico dos futuros profissionais.
O movimento PCES e o seu manifesto insurgem-se sobretudo quanto ao facto da crise financeira de 2007-2008 e a penosa recuperação que se lhe seguiu após o pânico financeiro ter sido ultrapassado e contido não terem ainda gerado repercussões no ensino da economia.
As ciências, mesmo as sociais, não ajustam os seus paradigmas rápida e espontaneamente às evidências com que trabalham e procuram explicar. O desvio temporal é, por vezes, prolongado, até porque o tratamento e sistematização das evidências não são eles próprios neutros. A interpretação das evidências é muitas vezes refém dos modelos e teorias que se querem combater e por isso demora tempo até que novos “factos estilizados” se imponham e convoquem a teoria para os integrar e explicar convenientemente.
A reflexão dos estudantes de Manchester (o que honra uma academia) tem despertado um debate aberto entre muitos economistas, interessados em que as suas práticas letivas e de transmissão de conhecimento possam contribuir para uma maior eficácia da política económica. Krugman e Simon Wren-Lewis, por exemplo, questionam se a crítica realizada pelo PCES exigirá uma mudança radical de paradigma no ensino da macroeconomia, rompendo com o mainstream instalado. A questão essencial parece não estar na incapacidade que o mainstream macroeconómico revelou em antecipar e prever a crise financeira. É hoje possível identificar na literatura macroeconómica que pode considerar-se de mainstream contributos sérios para que os bancos centrais e os governos tivessem tomado precauções. A denúncia dos malefícios da globalização financeira, acompanhada da mais completa desregulação e desenfreada inovação sofisticada, aliás testada negativamente nas crises cambiais asiáticas dos fins dos anos 90, os riscos de ocorrência de fenómenos de “armadilha da liquidez” (liquidity trap) muito próximos do zero lower bound de hoje e a problemática da banca-sombra sem qualquer regulação mereceram avisos de gente avisada. Mas mais gravoso do que não ter previsto a crise de 2007-2008 foi a deriva posterior da austeridade expansionista e da fixação no limiar do peso da dívida nos 90% do PO cuja ultrapassagem validaria a consolidação fiscal e austeridade a todo o preço.
Krugman e Simon Wren-Lewis têm razão em sustentar que, mesmo no âmbito do mainstream neo-keynesiano teria sido possível uma outra abordagem aos tempos que correm. E, independentemente do manual que os cursos de macroeconomia adotam e há uma imensa variedade de opções, a prática letiva pode garantir essa flexibilidade, tudo dependendo se quem ensina tem unhas e arte para um curso orientado para a resolução de problemas, mais propriamente para a discussão dos temas que deveriam estar na agenda letiva.
Como é óbvio tudo se reconduz à ética de liberdade de pensamento de quem ensina e essa é possível com qualquer manual minimamente aberto e informado, mesmo que rotulado de mainstreaming. E para tal é fundamental que muitos movimentos como o Post-Crash Economics Society se pronunciem e se façam ouvir nas academias. Afinal, a rebeldia e generosidade da juventude não se fizeram apenas para integrar almoços disciplinados e de propaganda com o primeiro-ministro.

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