Não é a primeira vez que
este movimento nascido por iniciativa dos estudantes da Universidade de
Manchester tem acolhimento neste blogue. A questão é extremamente relevante,
pois significa que pelo menos alguma academia, neste caso os principais
interessados na qualidade da formação em economia aí ministrada, mostram não
ter o sentido crítico adormecido. De facto, a apatia com que a generalidade dos
estudantes em economia absorve tudo o que lhe impingem é preocupante e não
permite antecipar um grande otimismo quanto ao sentido crítico dos futuros
profissionais.
O movimento PCES e o seu manifesto insurgem-se
sobretudo quanto ao facto da crise financeira de 2007-2008 e a penosa recuperação
que se lhe seguiu após o pânico financeiro ter sido ultrapassado e contido não
terem ainda gerado repercussões no ensino da economia.
As ciências, mesmo as
sociais, não ajustam os seus paradigmas rápida e espontaneamente às evidências
com que trabalham e procuram explicar. O desvio temporal é, por vezes,
prolongado, até porque o tratamento e sistematização das evidências não são
eles próprios neutros. A interpretação das evidências é muitas vezes refém dos
modelos e teorias que se querem combater e por isso demora tempo até que novos “factos
estilizados” se imponham e convoquem a teoria para os integrar e explicar
convenientemente.
A reflexão dos estudantes de
Manchester (o que honra uma academia) tem despertado um debate aberto entre
muitos economistas, interessados em que as suas práticas letivas e de transmissão
de conhecimento possam contribuir para uma maior eficácia da política económica.
Krugman e Simon Wren-Lewis, por exemplo, questionam se a crítica realizada pelo
PCES exigirá uma mudança radical de paradigma no ensino da macroeconomia,
rompendo com o mainstream instalado. A
questão essencial parece não estar na incapacidade que o mainstream macroeconómico revelou em antecipar e prever a crise
financeira. É hoje possível identificar na literatura macroeconómica que pode
considerar-se de mainstream
contributos sérios para que os bancos centrais e os governos tivessem tomado
precauções. A denúncia dos malefícios da globalização financeira, acompanhada
da mais completa desregulação e desenfreada inovação sofisticada, aliás testada
negativamente nas crises cambiais asiáticas dos fins dos anos 90, os riscos de ocorrência
de fenómenos de “armadilha da liquidez” (liquidity trap)
muito próximos do zero lower bound de hoje e a
problemática da banca-sombra sem qualquer regulação mereceram avisos de gente
avisada. Mas mais gravoso do que não ter previsto a crise de 2007-2008 foi a
deriva posterior da austeridade expansionista e da fixação no limiar do peso da
dívida nos 90% do PO cuja ultrapassagem validaria a consolidação fiscal e austeridade
a todo o preço.
Krugman e Simon Wren-Lewis têm
razão em sustentar que, mesmo no âmbito do mainstream
neo-keynesiano teria sido possível uma outra abordagem aos tempos que correm. E,
independentemente do manual que os cursos de macroeconomia adotam e há uma imensa
variedade de opções, a prática letiva pode garantir essa flexibilidade, tudo
dependendo se quem ensina tem unhas e arte para um curso orientado para a resolução
de problemas, mais propriamente para a discussão dos temas que deveriam estar
na agenda letiva.
Como é óbvio tudo se
reconduz à ética de liberdade de pensamento de quem ensina e essa é possível
com qualquer manual minimamente aberto e informado, mesmo que rotulado de mainstreaming. E para tal é fundamental
que muitos movimentos como o Post-Crash
Economics Society se pronunciem e se façam ouvir nas academias.
Afinal, a rebeldia e generosidade da juventude não se fizeram apenas para
integrar almoços disciplinados e de propaganda com o primeiro-ministro.
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