terça-feira, 29 de abril de 2014

O QUE VALEM AS EXPORTAÇÕES?



Já lá vão muitos anos, estou a referir-me mais propriamente à segunda metade dos anos 70, com a Faculdade de Economia do Porto a fervilhar em termos de entusiasmo simultaneamente na construção de novos programas de formação em economia e no estudo mais aprofundado da economia portuguesa, o então existente GEBEI, se a memória não me atraiçoa Grupo de Estudos Básicos em Economia Industrial, ensinava-nos a olhar de modo diferente para as exportações nacionais. Na altura, o uso das matrizes de input-output aplicadas às exportações permitia, pelo menos, isolar o conteúdo importado dessas exportações e já nessa altura se falava de valor acrescentado pelas exportações. Essa geração de economistas aplicados produziu um capital de conhecimento que veio progressivamente a perder-se em sucessivas mudanças institucionais. A relativamente recente destruição do Departamento de Prospetiva e Planeamento, concomitante com a saída de cabeças como Félix Ribeiro e Natalino Martins, foi a machadada final nesse conhecimento.
Entretanto dos tempos fervilhantes dos anos 70 aos nossos dias, a metodologia de análise estrutural das exportações evoluiu profundamente, sobretudo graças à possibilidade de utilização de matrizes de input-outputs globais, isto é, envolvendo dados provenientes de vários países e de diferentes matrizes input-output nacionais. Tal evolução foi inequivocamente determinada pela necessidade analítica de medir o posicionamento dos países nas cadeias de valor globais, que se tornaram o foco das atenções a partir do momento em que os processos produtivos estão irreversivelmente segmentados à escala mundial, com intensificação do comércio internacional de produtos intermédios que vão acabar por ser transformados e integrados algures na economia mundial.
Foi com grande regozijo pessoal que verifiquei que o Banco de Portugal, através da sua nata de economistas, está neste momento a retomar esse tipo de análise empírica e a melhor documentar o que valem afinal as exportações portugueses e, simultaneamente, a poder evidenciar que lugar a economia e as empresas portuguesas ocupam nessas cadeias de valor globais. O Boletim Económico da Primavera do Banco de Portugal dá conta desse trabalho através de um artigo que se recomenda de João Amador e Robert Stherer, este último economista do Vienna Institute for International Economic Studies, “As exportações portuguesas nas cadeias de valor globais”.
Os aprofundamentos da técnica de análise permitiram trazer para a quantificação novos conceitos: Valor acrescentado externo nas exportações (valor acrescentado no exterior que surge representado nos consumos intermédios presentes nas exportações nacionais), valor acrescentado nacional nas exportações (já conhecido dos velhos tempos), Valor acrescentado nacional nas importações (valor acrescentado nacional previamente exportado e que volta a Portugal por exemplo em automóveis importados) e valor acrescentado nacional incorporado nas importações que é reexportado.
As evidências recolhidas por João Amador colocam Portugal numa situação intermédia nas cadeias de valor, não na pré-fabricação com muita incorporação de conhecimento e não perto do consumidor final, mostrando que Portugal está ainda longe, medida pelo peso do valor acrescentado externo presente nas exportações portuguesas. Do ponto de vista setorial e apenas a simples título de exemplo, compare-se por exemplo o peso do Valor Acrescentado Externo nas Exportações no setor do calçado (26,8%) e no setor dos equipamentos de transporte (42,9%). É este tipo de exemplos que ajuda a compreender o novo conhecimento estrutural das exportações que estes indicadores possibilitam e o real contributo das exportações para o crescimento económico tão desejado.

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