(Simon Wren-Lewis)
(Lawrence Summers)
Desta vez com debate animado
do lado de lá e de cá do Atlântico, destacando-se do lado de cá a academia do
Reino Unido, a discussão sobre as implicações da crise financeira de 2007-2008
sobre o ensino da economia está ao rubro. A ideia de manutenção do status quo não parece convencer ninguém,
a não ser os que procuram a todo o custo não abrir brechas no que lhes parece
ser a fundamentação do que certamente ficará na história económica como um erro
colossal de política macroeconómica. Pode então perguntar-se onde estará o
debate, pelo menos de diferente do que sempre existiu entre correntes
dominantes na economia e que se reproduzem através da relação mestre-discípulo?
Surpreendentemente para mim,
o debate mais aceso está na divisão entre os que pedem a cabeça do paradigma atual,
com forte representatividade nos curricula de matriz anglo-saxónica, e os que
continuam a defender que seria possível com o mainstream ter gerado uma política macroeconómica muito mais eficaz
no combate à crise financeira e à pronunciadamente lenta recuperação após o pânico
financeiro ter sido dominado.
É nesse contexto que sem
surpresas para mim, mas para surpresa de muitos, economistas fortemente críticos
da política macroeconómica de consolidação fiscal em contexto de taxas de juro
nulas ou praticamente nulas, como por exemplo Krugman (Princeton, embora de saída
para outros voos) ou Simon Wren-Lewis (Oxford, que Vasco Pulido Valente tanto
considera), tenham saído a terreiro para defender os seus próprios cursos de mainstream. O que não significa que
sejam contundentes em desmontar designadamente a política macroeconómica britânica
a qual tenta por todos os meios, intelectualmente desonestos, convencer-nos que
foi a política de austeridade a justificar o crescimento económico do Reino Unido. Veja-se a crítica magistral de Summers à política macroeconómica britânica no Washington Post.
A substituição de um
paradigma económico por outro e as suas consequências sobre os curricula da
formação em economia constituem um processo muito lento, sobretudo como o atual
que resulta de sínteses de correntes anteriores e não será seguramente uma
simples crise, ainda que poderosa nos seus efeitos de longo prazo, que produzirá
essa transformação. Os mecanismos de mediação entre a produção científica em
economia e a sua transformação em modelos de política económica por ela influenciados
não resultam apenas da valia intrínseca dos paradigmas e da produção científica.
Há todo um vasto conjunto de fatores de apropriação por parte do poder político
de tais resultados que transcendem a simples vontade dos economistas –investigadores.
E depois há a complexa questão
de saber o que é que devemos tomar por representação do tal paradigma
instalado. Sem vos querer maçar, desde os que pensam que são os modelos
neo-keynesianos de equilíbrio dinâmico a representar esse paradigma instalado
até aos que como Krugman (aqui e aqui pensam em modelos e teorias económicas de maximização
de comportamentos de agentes económicos tipificados como agentes racionais passíveis
de assumir esse comportamento a consumir, a trabalhar e a não trabalhar, a
investir, a poupar ao longo do ciclo da vida, não há uma posição unânime sobre
o que devemos considerar a representação do paradigma instalado.
Tendo a compreender os
economistas que como Krugman, Bradford DeLong ou Lawrence Summers, mostram que
podemos ser criticamente contundentes sem abdicar de ensinar o tal paradigma
instalado. Há muitas maneiras de o ensinar, sobretudo do ponto de vista da capacidade
de disseminação entre os alunos de espírito crítico e de capacidade de pensar,
embora para isso seja necessário a recetividade dos alunos. Os jotinhas que nos
passam pelas mãos têm uma conceção utilitarista da formação em economia e
pensarão por certo que o professor é um perigoso esquerdista mais ou menos
identificado com o Bloco. Mas estou claramente com Summers quando ele mostra
que é necessário não falar apenas de comportamentos de maximização em condições
de informação perfeita. Basta que no raciocínio e nos modelos económicos se
fale de bolhas, de alavancagem, de ganância, de medo e que se rompa por exemplo
com o princípio mais ou menos hedonista de que o lazer é bom e o trabalho é mau
para termos resultados bem diferentes dos obtidos com os pressupostos da
informação perfeita. Por exemplo, Stiglitz, apoiado também nesse mainstream, mostra que com informação
imperfeita e assimétrica, é possível demonstrar que a inovação financeira quase
sempre assegura o ganho privado (interesse privado) à custa dos ganhos para a
sociedade como um todo (interesse público).
Por hoje, fica a minha ideia
de que a composição global dos cursos, a ética da transmissão do saber, o
ambiente de debate, discussão e crítica de uma Escola, a natureza combativa e não
acomodada da massa estudantil e a vontade de se deixar de interpelar pelas evidências
e pelo comportamento das economias é muito mais importante do que os manuais
que possam ser utilizados. E sempre defendi que para criticar um modelo, uma
teoria ou uma escola de pensamento é necessário ser capaz de os ensinar melhor
do que o simples lacaio vulgarizador. Esta é que é a questão essencial e, por
isso, 40 anos depois dos tempos de agitação das ideias nas Universidades
portuguesas, elas estão incompreensivelmente calmas e focadas no carreirismo mais
imediato. Sinais dos tempos.
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