sexta-feira, 23 de maio de 2014

TONINHO VAI À GUERRA



Esta coisa das eleições provoca reações que é difícil por vezes compreender, seja nos candidatos que têm de ter a palavra pronta e o verbo fácil a todo o momento, seja nos apoiantes próximos mais ou menos devotos. Paulo Rangel ilustra bem o primeiro caso, apostado na imagem de político impiedoso e castigador, o que tanto pode ser o resultado de uma dieta mal internalizada, ou simplesmente o produto de um especialista em comunicação, apostado em criar um “serial killer”. O homem quando passeava o pequeno cão no Jardim Soares dos Reis, próximo do meu habitat, parecia bem mais calmo e pacato. Ontem, tivemos um caso de apoiante que resolveu ter o seu momento de glória, com um gesto de grandiloquência quase dramática anunciado no Quadratura do Círculo, hoje concretizado em discurso solene de campanha.
António Lobo Xavier, Toninho nos seus velhos tempos da jovem burguesia portuense, que tem mantido face à maioria governamental a distância cúmplice que convém a alguém com grande ligação aos negócios, bem diferente da distância crítica que o seu colega de programa Pacheco Pereira vem mantendo até na sua declaração de voto de ontem, resolveu ter o seu gesto dramático. Focou-se no pretenso regresso de Sócrates à vida política, um almoço na mítica Trindade com os candidatos do PS e atirou-se de cabeça para um momento de última hora na campanha eleitoral. Nada mais, nada menos do que lançar aos quatro ventos que se o PS recupera Sócrates, então ele António regressará às lides para combater o demónio.
A ideia de que António esteja afastado da política só alguém muito distraído ou desinformado é que a pode engolir. Talvez incomodado com algumas diatribes da maioria, difíceis de acomodar no seu fleumático e devoto conservadorismo, António pode afastar-se mas o seu meio não lhe permite o corte ou a crítica mais violenta do tipo que Pacheco Pereira impiedosamente desenvolve. Porquê então este apoio de última hora, tão dramático? Algum impulso aconselhado por alguém que tenha sido trilhado pelas decisões de Sócrates então virado para outras cumplicidades? Uma intuição de mau resultado eleitoral da maioria e um súbito problema de consciência e a grande oportunidade de cavalgar a única ideia central da campanha da maioria, o despesismo Socrático?
O regresso de Sócrates já se deu há algum tempo e alguém com dois dedos de testa compreendeu que a passagem do dito pela RTP não tem nada que ver com o comentário político, mas sim com uma desesperada tentativa de defesa e de contra-ataque. Ora Lobo Xavier parece nunca ter-se pronunciado quanto ao significado político desse regresso. Porquê então agora com este dramatismo? Depois, a crítica política ao modelo de governação de Sócrates está feita, por setores diversos, e não acredito que meras questões de fraca memória apaguem essa crítica. Estará António preocupado com António José Seguro, por ele considerado cordeiro indefeso e vulnerável à força do demónio?
Não tenho resposta. Mas o gesto dramático de António corre o risco de marcar a história da pequena política da campanha.

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