O fim de tarde de ontem no Centro Regional do Porto da Universidade Católica esteve repleto de momentos intelectualmente estimulantes e discursivamente coloridos. Tratava-se, a partir de mais uma louvável iniciativa de Alberto Castro, de assumir o livro recente de José Manuel Félix Ribeiro (“Portugal: a Economia de uma Nação Rebelde”) como pretexto para um debate sobre a situação e as encruzilhadas e dilemas da nossa economia entre o autor e três dos seus mais consagrados colegas nortenhos (Daniel Bessa, Elisa Ferreira e Miguel Cadilhe) debaixo da titulação-chapéu “Portugal: Mudar de Vida”.
Perdoar-me-á o Zé Manel que escolha como “momento-zen” aquele em que, já em período de debate, um desafiante Cadilhe se dirige a Bessa nestes termos: “Oh Daniel, tens de ler o livro até ao fim!”. É que, de facto, as pseudo-assunções de “rafeirice” com que este ia procurando disfarçar o seu traumático mal-estar com a vida e as suas anedóticas calinadas, desvalorizando de passagem as suas provocações aos colegas de painel, já estavam a merecer o devido corretivo e Cadilhe não se quis fazer rogado...
O resto, num auditório cheio e excecionalmente cheio de gente que pensa, foi mais uma manifestação eloquente do conhecimento e da qualidade do autor, desta vez mais enquadrado do que habitualmente pelas pertinentes questões e dúvidas que lhe foram sendo dirigidas pelos outros convidados. De entre o tanto que ficou para melhor mastigação, saliento quase avulsamente os seguintes dez apontamentos telegráficos: (i) é um erro associar o facto de a economia portuguesa ter deixado de crescer ao facto de um Estado grande; (ii) ao jeito de corolário, não vai ser a consolidação orçamental a permitir a retoma do crescimento; (iii) a necessidade imperiosa de encontrarmos novas funções na globalização que nos ofereçam perspetivas de crescimento futuro; (iv) o atual mapa de Portugal na globalização como ajudando pouco nesse sentido; (v) a ideia de que se queremos ser respeitados a Sul temos de ter amigos fortes no Norte, acrescendo que perdemos o hábito de falar com quem tem poder e é rico e que temos de ampliar as nossas parcerias externas (com destaque para o papel que poderá resultar do Acordo Transatlântico US-EU) como condição para aceder àquelas novas funções; (vi) os 30 anos de integração portuguesa na Europa como esquematicamente resumíveis a uma integração ibérica; (vii) a má leitura que habitualmente se faz quanto às especialidades de uma junta médica (a Troika) que não salvou o doente, tendo até a Comissão e o BCE estragado mais do que o FMI; (viii) a exigência de termos uma posição negocial (passando pela dívida pública em mãos de agências europeias) quanto à nossa presença na União Europeia e na Zona Euro, i.e., quanto a uma revisão do compromisso europeu; (ix) um projeto europeu crescentemente marcado pela falta de solidez e pelas debilidades alemãs, da sua incapacidade de liderança à sua indefinição sobre o que fazer e à sua insegurança quando o entorno não é constituído por clones; (x) uma interrogação decisiva sobre até onde estará a Administração americana disponível para patrocinar um certo tipo de formatação da Europa.
Como sempre, muitas matérias para próximas revisitações...
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