(Ilias Makris, http://www.kathimerini.gr)
Há já algum tempo que aqui não nos socorremos da lucidez analítica de Wolfgang Münchau. Pois, mesmo sabendo que os nossos governantes nacionais e europeus insistem em querer – e querer nem sempre é poder! – que Portugal não seja a Grécia, a situação financeira e económico-social não deixa de apresentar tais parecenças que o último artigo do colunista do “Financial Times” (“This could be the moment for Greece to default”) quase podia ser lido – apenas com o detalhe de os números exatos divergirem, e maioritariamente em desfavor dos helénicos – substituindo a palavra Grécia por Portugal no corpo do texto.
Mas vamos por partes. Começo por alguns dados macroeconómicos e sociais: tal como nós, a Grécia também já terá batido no fundo, após uma depressão de seis anos em que o PIB real caiu cumulativamente mais de 25% e a taxa de desemprego chegou a 26,7% (60,4% para os jovens); tal como nós, a Grécia vive uma situação social aflitiva (Münchau escolheu três indicadores ilustrativos: 2,3 em 2,8 milhões de famílias com dívidas fiscais em atraso; pensões como principal fonte de rendimento para 48,6% das famílias; 3,5 milhões de pessoas empregadas a suportarem 4,7 milhões de desempregados ou inativos); tal como nós, a Grécia está a caminho de registar saldos orçamentais primários crescentemente positivos (2013 já ficou no verde e a previsão é de 2,7% do PIB em 2014 e 4,1% em 2015) e já apresenta uma balança de transações correntes excedentária, o que a torna conjunturalmente menos dependente de investidores/credores externos.
Mas vamos por partes. Começo por alguns dados macroeconómicos e sociais: tal como nós, a Grécia também já terá batido no fundo, após uma depressão de seis anos em que o PIB real caiu cumulativamente mais de 25% e a taxa de desemprego chegou a 26,7% (60,4% para os jovens); tal como nós, a Grécia vive uma situação social aflitiva (Münchau escolheu três indicadores ilustrativos: 2,3 em 2,8 milhões de famílias com dívidas fiscais em atraso; pensões como principal fonte de rendimento para 48,6% das famílias; 3,5 milhões de pessoas empregadas a suportarem 4,7 milhões de desempregados ou inativos); tal como nós, a Grécia está a caminho de registar saldos orçamentais primários crescentemente positivos (2013 já ficou no verde e a previsão é de 2,7% do PIB em 2014 e 4,1% em 2015) e já apresenta uma balança de transações correntes excedentária, o que a torna conjunturalmente menos dependente de investidores/credores externos.
Prossigo com a dimensão financeira mais propriamente dita: tal como Passos e Portas, também Samaras soube (?) engenhosamente empurrar para baixo as taxas de juros incidindo sobre as obrigações soberanas a 10 anos – após os máximos de 35% em março de 2012, elas já desceram abaixo dos 5%; e, tal como cá, na Grécia os mundos financeiro e político também festejam com visível orgulho e entusiasmo o recente regresso helénico aos mercados – afinal, não acabou de acontecer uma emissão de obrigações soberanas a 5 anos que foi capaz de atrair 21 mil milhões de euros de procura por parte de mais de 600 investidores, principalmente internacionais? –, antecipando mesmo um regresso pleno até junho. Claro que importará sempre não esquecer, como bem sublinhou Münchau, que “a razão pela qual a Grécia foi capaz de atrair tanto interesse na emissão de obrigações da semana passada resultou de uma combinação de uma promessa de alto rendimento com o perfil de maturidade da dívida grega existente [empréstimos oficiais a representarem 80% do total da dívida e seu pagamento protelado para 2023]”.
Quanto à dívida, e tal como por terras lusitanas, o seu rácio em percentagem do PIB continua a crescer assustadoramente na Grécia – a previsão é de 177% para 2014 – , fazendo com que o país não atraia investimento externo real nem possua um sistema bancário suficientemente sólido para gerar níveis significativos de investimento doméstico. Um espectro que leva Münchau a caraterizar a política oficial da Zona Euro relativamente à Grécia nos seguintes cínicos termos: “gerar uma bolha maciça de investimento financeiro e esperar que algum do dinheiro eventualmente escorra para a economia real”. Entretanto, e no mesmo sentido, veja-se no gráfico abaixo (inicialmente publicado num relatório do CITI) o modo como se exprimem as preocupações mais sérias e conscientes em torno do helénico (e não só...) binómio dívida elevada – crescimento baixo, apenas dois anos depois da maior reestruturação de dívida soberana da história (sendo dois anos o tempo usualmente necessário para marcar um ponto de viragem em situações semelhantes); com o seguinte comentário adicional: “Calculamos que o rácio da dívida em relação ao PIB estabilizaria em níveis de 2013 se o crescimento médio do PIB nominal nos próximos anos fosse de 2,9%, assumindo um custo médio da dívida de 3% e um excedente primário de 0,5% do PIB. Com os mesmos pressupostos, estimamos que o crescimento anual nominal do PIB teria de ser à volta de 8,5% até 2020 para trazer o rácio da dívida pública para 120% (correspondentes à definição do FMI de sustentabilidade da dívida) em finais desta década. Entendemos que um tão alto crescimento nominal é improvável. Portanto, do nosso ponto de vista, sem um significativo haircut nos empréstimos oficiais, é altamente improvável que o rácio da dívida pública caia abaixo dos 120% em qualquer momento ao longo dos próximos dez anos...”.
(FT Alphaville, http://www.ft.com)
Tudo visto e ponderado, Münchau sintetiza o fundamental: primeiro, sustentando que a economia grega não está em recessão nem está sendo relançada, antes terá entrado em colapso; segundo, sustentando que a existência de “uma outra história”, a fairy tale político-financeira, redunda na contradição essencial de que, embora o país surja como solvente a curto prazo, a sua solvência a longo prazo está longe de ser certa – e “quem no seu perfeito juízo vai fazer um investimento de longo prazo num país com uma dívida de longo prazo insustentável?”; terceiro, sustentando que uma possível alternativa poderia estar no pecado absolutamente capital de uma conferência da dívida em que a dívida oficial fosse perdoada ou mais reestruturada mas lamentando que “os países credores não querem ouvir falar disso”.
As soluções ficam apenas à porta, sobretudo porque Münchau é hábil e suficientemente defensivo. Limita-se, pois, a concluir que este poderia ser “um bom momento para a Grécia declarar incumprimento na sua dívida externa” e estabelecer uma nova moeda (acompanhada de imediata desvalorização e verdadeiras reformas estruturais), mas prefere explicitar que não está a advogar uma saída mas tão-só a evidenciar que “os eleitores gregos e os investidores estrangeiros devem, no entanto, saber que a Grécia está agora numa posição em que há uma escolha”. Concorde-se ou não com Münchau, cuja dama sempre foi a de um enorme ceticismo em relação à moeda única...
As soluções ficam apenas à porta, sobretudo porque Münchau é hábil e suficientemente defensivo. Limita-se, pois, a concluir que este poderia ser “um bom momento para a Grécia declarar incumprimento na sua dívida externa” e estabelecer uma nova moeda (acompanhada de imediata desvalorização e verdadeiras reformas estruturais), mas prefere explicitar que não está a advogar uma saída mas tão-só a evidenciar que “os eleitores gregos e os investidores estrangeiros devem, no entanto, saber que a Grécia está agora numa posição em que há uma escolha”. Concorde-se ou não com Münchau, cuja dama sempre foi a de um enorme ceticismo em relação à moeda única...
(Eduardo Estrada, http://elpais.com)
Pegue-se-lhe pela ponta que se quiser, mas veja-se bem como qualquer argumento conduz sempre à mesma pergunta: afinal, quem é que anda a enganar a malta por essa Europa fora, mais uma vez em benefício objetivo da finança internacional?
Sem comentários:
Enviar um comentário