Para além do próprio Barack Obama, há três
personalidades (mais o secretário de Estado do Tesouro da altura Paulsen) que
estiveram no coração das decisões que foram tomadas nos EUA em plena crise Lehman Brothers e que daria origem à por
demais conhecida mas ainda insuficientemente estudada crise financeira de 2008.
Essas três personalidades foram Ben Bernanke à frente dos destinos do FED,
Lawrence Summers como um dos conselheiros mais influentes de Obama e Timothy
Geithner então à frente do Banco da Reserva Federal de Nova Iorque e
posteriormente secretário de Estado do Tesouro, para todos os efeitos
equivalente a ministro das Finanças.
De todas estas personalidades a mais complexa e
controversa é a de Lawrence Summers. É-o porque além do seu enorme prestígio
académico como professor em Harvard, Summers acumulou uma série de empregos no
setor financeiro privado, explicando em meu entender o peso que as suas
palavras e os seus escritos produzem. Bernanke tem origens académicas inequívocas,
estudioso em Princeton da política monetária em crises financeiras, pelo que a
chamada ao FED projetou-o da investigação para a ação. Geithner é dos três o de
projeção mais apagada, até há bem pouco tempo um homem do serviço público em
diferentes e muito diversificadas funções até ao Tesouro americano.
Apesar disso, Geithner é entre as três personalidades
a que tem gerado adversários e detratores mais acérrimos. A razão principal prende-se
com o facto dos analistas o associarem decisivamente ao chamado Troubled Asset Relief Programme (TARP), mecanismo
através do qual foram injetados 700 mil milhões de dólares para resgate de Wall
Street, no quadro do que poderíamos designar de “demasiado grande para falir”. Geithner
depois de abandonar a seu pedido o Tesouro americano esteve praticamente ausente
de qualquer tomada de posição ou expressão de opinião. Só agora se anuncia para
esta semana um livro seu, Stress Test,
e o jornalista Andrew Rose Sorkin dedica-lhe, no New York Times Magazine, uma peça jornalística /entrevista publicada
na passada quinta-feira que, na antecâmara do Stress
Test, constitui um documento de rara importância.
Mas afinal onde está a relevância do tema? O TARP
constitui uma das matérias de maior controvérsia na abordagem à crise
financeira de 2008. As razões que explicam a permanência da controvérsia têm
que ver com a impossibilidade de demonstração da contrafactualidade. Por outras
palavras, os defensores da aplicação daquele mecanismo (entre os quais o próprio
Geithner) invocam os efeitos devastadores que a falência de Wall Street teria
determinado (na sequência da não intervenção no Lehman Brothers) caso o TARP não
tivesse sido decidido. Por sua vez, os detratores de tal medida nunca conseguirão
demonstrar a não existência desses efeitos devastadores. Por isso o debate
permanece.
A peça de Sorkin é muito curiosa porque parte do
relato de uma exposição feita por Geithner ao curso de economia de Summers em
Harvard, convidado por este com o anúncio aos seus alunos de que talvez não
compreendam a importância do “agente” Geithner no turbilhão da crise.
Geithner deve ter iniciado com o Stress Test uma tentativa de justificação da
decisão tomada, invocando entre outras coisas que o dinheiro injetado no
resgate de Wall Street terá sido já praticamente reembolsado com juros
correspondentes. Com as devidas proporções, o que se passou com o reembolso do
TARP é coisa de que Teixeira dos Santos não poderá orgulhar-se pois a intervenção
no BPN é coisa que se abateu sobre os contribuintes portugueses e não terá
reembolso possível.
A matéria que me parece mais interessante na peça
de Sorkin é a absoluta relutância de Geithner em acusar as personalidades do
sistema bancário: “As funções que exerci
expuseram-me a banqueiros talentosos de grande experiência e um erro de avaliação
ter-me-á induzido a considerar que o sistema financeiro americano era mais
capaz e ético do que na realidade mostru ser”. Há quem o associe a essa
elite, mas em concreto Geithner nunca exerceu até à sua presidência do FED de Nova
Iorque qualquer função na banca.
Por tudo isto, a leitura do Stress
Test será crucial para compreender se Geithner foi seduzido pela
atração da banca ou se pelo contrário apresenta argumentos consistentes para
justificar a injeção de tal soma em Wall Street.
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