Já por repetidas vezes
chamei a atenção para a capacidade de gestão política da evolução macroeconómica
que o governo tem revelado. Isso não significa consistência de processos, mas tão
só essa capacidade de jogar com uma comunicação social com reduzido poder e
vontade de escrutínio da política económica praticada, com uma opinião pública
incipiente e sobretudo com uma Comissão Europeia interessada em branquear um
dos períodos mais negros e menos solidários da construção europeia.
O Documento de Estratégia
Orçamental ontem apresentado é um deliberado exercício de gestão eleitoral e
exigirá da oposição uma crítica contundente de desmontagem de toda essa ginástica
claramente orientada para o tempo de campanha eleitoral vivida já há longo
tempo.
Não consigo imaginar que
discussão terá o documento merecido dos elementos da TROIKA, mas não custa crer
que a 12ª avaliação seja já um encore
solícito também ele inspirado pela campanha de branqueamento das consequências
de todo o processo de resgate. Mas também admito que sobretudo o representante
do FMI possa ter sido um osso duro de roer.
Com a apresentação do DEO
vem a confirmação de que a atual maioria é incapaz de qualquer reforma
estrutural do Estado e nem sequer a sua anunciada proposta de sustentabilidade
estrutural do sistema de segurança social viu a luz do dia. O texto usa e abusa
do termo sustentabilidade, mas essa utilização é ela própria um instrumento do
exercício de gestão eleitoral.
O exercício de gestão
eleitoral é calculado ao milímetro, tirando de um lado e aliviando do outro,
tirando da cartola o coelho da receita adicional do IVA consignada ao sistema
de pensões e invadindo o terreno difícil da taxa social única para os
trabalhadores, por duas décimas, mas de qualquer modo afirmando a sua marca
desequilibradora em desfavor do mundo do trabalho. Para quem pintou a situação
mais negra sobre a sustentabilidade do sistema de pensões, abdicar de uma
abordagem efetivamente estrutural ao problema e optar pela transformação de
cortes temporários em definitivos mas de menor expressão e juntar-lhe 0,25
pontos percentuais de IVA e 0,2 de TSU para os trabalhadores constitui um exercício
de puro equilíbrio eleitoral.
Mas o calculismo pode sair
caro à maioria. É que o exercício é hábil mas tão óbvio e contraditório com
toda a preparação do abismo que pode não colar. Não é seguro que a perceção do
pequeno alívio compense a dimensão dos custos acumulados. E depois parece que o
desemprego nem existe. Não há gestão eleitoral que o possa ocultar.
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