A vida não está fácil para Mario Draghi. Por mais
que os maníacos dos riscos inflacionários procurem inventar o improvável, a
verdade é que em matéria de riscos é de deflação e não de inflação que nos
devemos preocupar. O BCE, com variações de preços de 0,8% na zona euro, está
bastante longe da sua meta de estabilização de inflação perto dos 2%. Por outro
lado, cresce a preocupação entre os países com procura interna bloqueada pela
austeridade com a valorização do euro face ao dólar e com dimensão para se
fazer ouvir como a França, aumentando por essa via a pressão para que o BCE
intervenha também nessa frente. A única frente em que a guarda de Draghi pode
ser por agora aligeirada é a dos países periféricos, onde o comportamento das
taxas de juro a dez anos atinge acalmia inesperada. Hoje mesmo, a taxa da
dívida irlandesa a 10 anos desceu abaixo da do Reino Unido, o que não deixa de
ser um indicador de que o governo português tem de meter a violinha no saco e
não tirar proveito artificial do que é uma tendência manifestamente global,
embora claramente vulnerável.
Causa-me extrema preocupação termos os mercados e
a sua instabilidade dependentes do modo como Draghi se expressa, tal como
sucedeu entre a reunião do conselho do BCE de quinta-feira e os últimos
desenvolvimentos, tendo implicitamente obrigado Draghi a admitir que em Junho
poderá ter intervir sobre as taxas de referência e até retomar o “quantitative easing” à moda do BCE.
Mas de que modo os problemas de Draghi sobre os
riscos da deflação são motivos de penas futuras para as condições que teremos
para crescer? A razão é dupla, com ambos os argumentos a pesarem fortemente na
penosidade dos nossos esforços. Em primeiro lugar, em ambiente deflacionário ou
quase, o pagamento da dívida torna-se mais penoso em termos reais. Para a pagar
teremos de sacrificar mais recursos de ocupações alternativas. Em segundo
lugar, com deflação é mais complexo conseguir que os países do Norte tenham
subidas de preços mais pronunciadas para que os do Sul possam ganhar alguma
margem de competitividade-preço.
Por isso, o risco deflacionário constitui um
problema de Draghi, mas também um problema nosso e que problema, por muito que
nos dourem a pílula e apontem para melhorias de poder de compra que essa deflação
pode trazer.
Prevendo a necessidade do BCE ter que regressar
ao “quantitative easing” considerando
a pressão, com origem essencialmente na dupla Valls-Hollande, para o BCE se
ocupar da relação euro-dólar, sobretudo com a apreciação do primeiro, Jeffrey Frankel apresenta no seu blogue uma nova proposta de ação para o BCE. Considerando
que Draghi enfrentará sempre a retinente oposição da Alemanha e de outros países
à eventual compra (indireta, porque feita através da banca) de dívida pública
de países membros da zona euro, Frankel pergunta por que razão o BCE não compra
nessas circunstâncias títulos da dívida pública americana. A proposta é pelo
menos sugestiva, embora suscite discussão técnica que transcende a intervenção
deste blogue. Essa discussão prende-se sobretudo com a eficácia dessa operação
em termos da desejada desvalorização do euro face ao dólar. Frankel apoia-se em
alguma investigação para suportar essa possibilidade, mesmo no âmbito da zona
euro.
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