(Algum esforço para compreender uma matéria que
escapa ao cidadão que busca uma representação parlamentar credível e legítima dos seus
interesses)
Que o PS é um partido com paredes de vidro, tudo indica que está em
consolidação. Ter telhados ou paredes de vidro não é bem a mesma coisa já o
sabemos, mas neste caso a metáfora das paredes aplica-se melhor. Assim lá se vão
conhecendo algumas das incidências internas mais recentes e o período é propício,
tudo gira em torno da constituição das listas para as próximas eleições. A crónica
é parcialmente anunciada. Quando os exércitos se alinham em redor de dois
candidatos que disputam o poder interno para se posicionarem em matéria de
eleições nacionais é dos livros que, após a contenda intercalar, não é fácil
encontrar equilíbrios entre a parte vencedora e a parte vencida. O problema é
tanto mais complexo quanto mais a parte vencedora pretende neste caso
transmitir ao eleitorado uma imagem de renovação, trazendo para o trabalho eleitoral
e depois parlamentar, não se sabe se como trampolim para a constituição de
governo. A dança das cadeiras é inevitável, e é uma dança bem estranha pois
neste caso será desproporcionada a relação entre os protagonistas e as
cadeiras, tanto mais que a disputa eleitoral será mais tensa do que alguns dos
protagonistas esperariam.
Que dizer então das dificuldades que António Costa estará a encontrar para
acalmar ânimos e promover os equilíbrios possíveis e aqui o critério do possível
é encontrar soluções (listas) que não perturbem a energia coletiva que a
batalha eleitoral vai exigir?
Não valorizo excessivamente estas dificuldades, sobretudo porque os partidos
portugueses, não assumindo a institucionalização das tendências internas,
obviamente que se sujeitam a processos mais complexos de escolha de candidatos
do que os que seriam praticáveis com quotas associáveis a tendências em função
dos resultados.
O meu problema prende-se com o desconhecimento absoluto a que um cidadão
afastado das querelas partidárias internas é sujeito quando do lado de cá a
toda a série de notícias de arranjos e desarranjos, de entradas e saídas, de
quem fica e é excluído, sobretudo quando estão envolvidos nomes sobre os quais uma
alma como a minha não ouviu um pensamento, uma ideia, um sentido de intervenção
futura. A título de exemplo, e perdoem-me porque se trata de presenças ou ausências
de mulheres futuras deputadas, os jornais de hoje falavam da perplexidade de
uma ex-presidente de Câmara (Trofa, neste caso), que perdeu estrondosamente a
sua luta eleitoral estar nas listas e falavam também de excesso de representação
da mesma Trofa com a presença de uma tal Teresa Fernandes. E já no fim de tarde
de hoje José Luís Carneiro líder distrital falava também da falta de equilíbrios
territoriais, com o vale do Sousa e o Baixo Tâmega pouco representados.
Certamente que os critérios de discussão serão muito “nobres”, sobretudo na
perspetiva dos exércitos internos. Mas para a perspetiva do cidadão que votará à
procura de representação credível das suas ideias e interesses, a sensação é de
um vazio incomensurável. E não me venham com a força aglutinadora de um
programa eleitoral e dos documentos no caso do PS que o prepararam. Porque o
programa é uma coisa, a qualidade da governação futura outra bem diferente e a qualidade
dos representantes parlamentares ainda também bem diferente. Por outras
palavras, nesta dança de cadeiras ou guerra das listas está a ser jogado o padrão
qualitativo da representação parlamentar e não deixa de ser uma sensação de um
vazio estranho que me atormenta o espírito.
Mas alguma renovação existe. António Costa é responsável através da sua
quota de representação pela indicação de alguns independentes, com destaque
para os rostos mais sonantes do programa económico do PS (Mário Centeno, Paulo
Trigo Pereira, Manuel Caldeira Cabral), gente com pensamento político programático
(Porfírio Silva, por exemplo), carismática e participativa (Helena Roseta) e
algumas apostas de raiz na ciência, como o bioquímico Tiago Brandão Rodrigues
que se desloca do ambiente de investigação de Cambridge – UK para o primeiro
lugar da lista de Viana do Castelo, constituindo talvez a aposta mais inovadora,
e Alexandre Quintanilha pelo Porto e Helena Freitas por Coimbra. Interessaria
clarificar se estamos perante apostas parlamentares ou passagens de lista para
um governo possível. Ambas são legítimas mas gostaria de eleger gente em quem
confiasse para a representação parlamentar e não suplentes de circunstância alinhados
em função dos tais equilíbrios de que falava José Luís Carneiro. Por isso, uma
divisão das águas seria valorizadora da escolha democrática.
E já que se fala de renovação necessária, também se recomendaria que isso
acontecesse pelas bandas da tendência segurista. Joaquim Raposo em lugar elegível
pela lista de Lisboa não lembraria a um diabo renovador. Há de facto gente que
vai passar por este mundo da política sem que se lhe conheça uma ideia ou
posicionamento relevante para a democracia que se dispõem a representar.
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