(Um exemplo ilustrativo da desestruturação do
Estado e da inépcia do debate centralismo lisboeta versus novos poderes a Norte)
Já alguns dias me interrogava e aprofundava a minha ideia de que esta
controvérsia em torno da inauguração da nova ala do Museu do Chiado, que espera
melhores dias de contas públicas, para ter ligação com a preexistência do Museu
(que é um dos meus favoritos em Lisboa), tinha que se lhe diga e que exigia uma
melhor compreensão para sobre ela tomar posição. Várias vezes me coloquei na
perspetiva de um cidadão comum e rapidamente conclui que este deve naturalmente
pensar que esta gente da cultura são uns grandes confusos e que deveria tratar-se
de lutas de capelinhas. Mas a diversidade dos contendores que surgiram em cena
impunha que o INTERESSE PRIVADO, AÇÃO PÚBLICA se pronunciasse sobre o tema.
Senão vejamos.
A história é rocambolesca. Lá vimos um secretário de Estado conhecido pela
sua flexibilidade e adaptabilidade a desdizer pelos vistos uma decisão sua em
despacho anterior e também ao que se lê na imprensa a acatar a decisão do
primeiro-Ministro que deve ter-lhe dito alguma coisa do tipo: Oh homem veja lá
se muda a sua decisão que este não é o momento certo para comprar uma guerra
com a gente do Norte agrupada em Serralves. Vimos também e aí
compreensivelmente o diretor do Museu do Chiado a demitir-se não satisfeito com
ter iniciado a preparação de uma exposição com um enquadramento e ter de a
completar com outro enquadramento. Vimos também o presidente de Serralves a
retorquir que não gosta que lhe pisem os calos e a não confirmar ou desmentir que
terá pegado diretamente no telefone para falar ao primeiro-Ministro e dizer ao
Pedro que teria de meter na linha o seu secretário de Estado dos óculos
pequeninos. Ainda dizem que o Norte não tem poder! O que não tenho a certeza é
que o utilize sempre bem. Vimos também uma grande especialista em museus, que
muito aprecio, a professora Raquel Henriques da Silva que terá estado perto de
se imolar pelo fogo, escandalizada pela deselegância com que o ex-Diretor do
Museu do Chiado Pedro Santos foi agraciado e sobretudo violentada pela ação de
Serralves. O que também é uma história bem conhecida em Portugal. Grandes
cabeças, grandes especialistas, mas quase sempre primas-donas, incapazes de
pensar um pouco na perspetiva global dos acontecimentos e ter uma intervenção
pedagógica. Vimos ainda Suzanne Cotter, diretora e programadora de Serralves, a
emitir uma posição bem sensata e bem mais esclarecedora do que o seu
Presidente, talvez abismada por estes Portugueses que face à débil massa crítica
dos seus recursos deveriam ter um comportamento bem mais cooperativo do que o
manifestam regularmente. E vimos finalmente uma média manifestação de artistas
em conflito aberto com o secretário de Estado, apoiando Pedro Santos e
indiretamente culpando o comportamento de Serralves.
Mas que grande lio. Eis senão quando, hoje, no Público, alguém sensato e
inteligente, vem a público com uma posição de grande ponderação sobre o
assunto, contextualizando o problema e mostrando que só um comportamento
cooperativo poderá dar um sentido final ao problema, poupando Raquel Silva à imolação
em público.
João Fernandes, ex-diretor de Serralves vem finalmente explicar ao cidadão
comum a raiz do problema, a verdadeira natureza da Coleção da Secretaria de
Estado da Cultura, as razões históricas da sua constituição e sobretudo a
convicção de que algumas das suas peças deverão continuar a manter a coerência
da arte portuguesa acolhida em Serralves e que outras “encontrarão num museu de
âmbito nacional, como o Museu do Chiado, uma melhor expressão de aspetos da
história de arte portuguesa”. Só um comportamento cooperativo entre a massa
cinzenta de Serralves e do Museu do Chiado poderá em conjunto com a SEC tentar
readquirir um sentido de estratégia para a arte contemporânea portuguesa, não
esquecendo a coleção Berardo adquirida com fundos públicos e a coleção do
Instituto de Arte Contemporânea que ninguém parece ao certo saber onde está
depositada.
Finalmente alguém com cabeça fria e inteligência para compreender o
problema. Já não tenho pachorra para a inépcia do confronto entre o centralismo
(desbotado) lisboeta e novos centralismos a norte.
Sem comentários:
Enviar um comentário