(Nem sempre o trabalho nos seduz desta maneira …)
Estou nestes dias mais próximos, que se prolongará por agosto dentro, com
uma revisitação dos vinhos do Douro e do Porto em termos de trabalho para
atualizar algumas componentes do diagnóstico em que participei em 2007 e 2008. O
trabalho nem sempre nos proporciona momentos de puro prazer intelectual, mas
neste caso o contacto com a complexidade de uma região como a Região Demarcada
do Douro (RDD) é um momento de rara fruição de momentos que combinam uma elevada
densidade de conhecimento, as conversas com gentes profundas e a oportunidade de
revisitar lugares mágicos, seja nos espaços mais recônditos do Douro, seja nos
interstícios mais desconhecidos do centro histórico de Vila Nova de Gaia.
Por razões compreensíveis, não posso partilhar muita reflexão sobre o tema,
mas poderei dar conta da narrativa preliminar em que estou a trabalhar, cruzando
a informação disponível com a sempre estimulante audição de alguns players.
E a narrativa é esta, simplesmente: de 2008 a 2015, praticamente sete anos,
a RDD e os vinhos do Porto e do Douro que lhe dão vida e esperança foram
atravessados por muitas e diversificadas mudanças, cuja densidade e impacto nas
“prateleiras”, isto é no preço e volume a que se vende o produto, qualquer que
seja o mercado de aposta ou de oportunidade, é necessário calibrar para superar
a simples linguagem da comunicação que nos trouxe essas novidades, algumas das
quais destaco aqui, não de forma exaustiva:
- A magnitude de investimento realizada pela generalidade dos players já instalados na Região e por investidores estrangeiros de nomeada é significativa;
- É particularmente relevante o facto de parte desse investimento acontecer por via da chegada à Região de grandes investidores internacionais, que não chegam apenas por questões do charme de estar na economia do vinho, ou seja, não chegam para perder dinheiro, trazendo por isso rigor, novos modelos de negócio, rede para chegar a outros mercados;
- Praticamente em simultâneo e não necessariamente nos mesmos projetos estão a chegar à Região para projetos de cooperação com grupos empresariais e operadores instalados grandes personalidades do mundo do vinho, com capacidade para orientar a “construção” de vinhos em função do mercado e a partir da inimitabilidade da Região;
- A Região adquiriu hoje uma notoriedade no mundo da imprensa especializada do vinho impensável há sete anos, de que talvez o número de julho da WINE SPECTATOR constitua a evidência mais sugestiva;
- Pelo esforço e persistência de diferentes organizações e vontades, dos grupos empresariais mais sólidos e globais até ao experimentalismo empreendedor de algumas personalidades mágicas na forma como fazem vinhos que nos surpreendem, o vinho do Porto resiste com o reconhecimento da excelência PREMIUM e no Douro DOC já se fala de Grands Crus do Douro (tintos e pasme-se brancos também);
- Adultos jovens chegam ao Douro para reativar através de projetos DOURO DOC existências familiares adormecidas, acompanhados de uma nova geração de enólogos;
- Parece que finalmente a produção (lavoura) caminha para uma representação de nova geração no Conselho Interprofissional, colocando fim à longa degradação da Casa do Douro;
- O Enoturismo é hoje uma realidade incontornável na Região, com investimento apreciável no Douro e em Vila Nova de Gaia, responsável pelo facto de Portugal ser hoje o segundo mercado para o vinho do Porto, num contexto em que os portugueses estão provavelmente longe desse universo.
Com toda esta variedade de mudança que, repito é preciso calibrar para
escapar à afetividade jornalística, é paradoxal que, em simultâneo,
praticamente todos os constrangimentos estruturais identificados para o setor
em 2008 permaneçam à espera seja do fruto destas dinâmicas ou de decisões mais
complexas de tomar. Talvez uma alegoria do País que teremos de resolver nos próximos
tempos. Mas sobretudo uma narrativa fascinante para deslindar.
Vou beber um copo porque o palato e a mente estão estranhamento
interligados.
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