segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

DOS SALPICOS DO BANIF AOS VENTOS VINDOS DE ESPANHA




(Os dois países continuam vulneráveis a problemas estruturais que teimam em permanecer sob a proteção da indecisão política)

O meu amigo e governador do Banco de Portugal que me perdoe mas o descalabro do Banif cheira bastante a esturro. Tudo indica que já há bastante tempo Portugal anda a fazer de conta que tem um sistema financeiro estável e saudável. Não o tinha e basta reproduzir no tempo a sequência BPP, BPN, BES e BANIF para o compreender. E, justifica-se o desabafo, como estará a Caixa Geral de Depósitos? Deste descalabro sobra uma reflexão singela. Se é um facto que a dimensão do país o protegeu paradoxalmente das réplicas europeias da crise financeira de 2007-2008, então as sucessivas imparidades que vão sendo tornadas públicas à medida que os testes de stress bancário se vão acumulando só podem ser o resultado de duvidosas decisões de concessão de crédito. Esta última variável assume em países como Portugal, com declarada debilidade do seu potencial produtivo, o papel de instrumento de ilusão, seja no consumo das famílias e dos empresários, seja das empresas. Não quero ser popularucho, mas aquilo que se foi sabendo da ridícula participação de gente bem-falante nos conselhos de administração da banca e do seu laxismo decisório representa o melhor indicador do padrão de atribuição de crédito na economia portuguesa em estreita correspondência com o padrão de decisão da despesa pública. Uma maior transparência das relações entre esses conselhos de administração e os principais stakeholders da banca, sendo estes últimos parte interessadíssima no laxismo de critérios de atribuição do crédito, tornará claros os mecanismos de cumplicidade.

A acumulação de recursos públicos já envolvidos em resgates da banca justifica já um maior clima de exigência e de assunção de responsabilidades por parte da corporate governance bancária. Dir-me-ão que a banca é uma espécie de meta-instrumento de funcionamento da economia de mercado e por isso a sua solidez justifica o sacrifício de recursos públicos. Não serei eu que vou discutir a relevância desse meta-instrumento. Mas a massa crítica dos recursos orçamentais que estão a ser desviados de outras opções de política pública exige uma outra postura de pedido de responsabilidades. Afinal nos últimos tempos o BANIF não era um banco com maioria de capital público? O que fizeram então os administradores responsáveis pela participação do Estado? Mas que raio de modelo de governance é esse que dedica administradores não executivos à representação do capital público?

Por sua vez, de Espanha também sopram ventos de indefinição estrutural. Tenho para mim que o grande problema da sociedade espanhola é hoje a sua deficiente articulação territorial. Como é que é possível que um PP se considere acima de qualquer pensamento novo sobre esse problema constitucional, tendo sido o principal acirrador da demagogia nacionalista na Catalunha, e reclamando mesmo assim a compreensão de forças políticas como o PSOE para resolver o imbróglio parlamentar em que a Espanha está mergulhada? Não é cristalina a indicação que os catalães deram nestas eleições ao votarem maioritariamente na força política emanada do PODEMOS (onde pontifica a nova alcalde de Barcelona) que sempre defendeu uma nova articulação territorial constitucional e um referendo para contrariar as pretensões dos independentistas? Não foi cristalino que os catalães tivessem colocado os partidos independentistas em plano secundário e praticamente arredassem o PP da região?

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