(Os dois países
continuam vulneráveis a problemas estruturais que teimam em permanecer sob a
proteção da indecisão política)
O meu amigo e governador do Banco de Portugal
que me perdoe mas o descalabro do Banif cheira bastante a esturro. Tudo indica
que já há bastante tempo Portugal anda a fazer de conta que tem um sistema
financeiro estável e saudável. Não o tinha e basta reproduzir no tempo a sequência
BPP, BPN, BES e BANIF para o compreender. E, justifica-se o desabafo, como
estará a Caixa Geral de Depósitos? Deste descalabro sobra uma reflexão singela.
Se é um facto que a dimensão do país o protegeu paradoxalmente das réplicas
europeias da crise financeira de 2007-2008, então as sucessivas imparidades que
vão sendo tornadas públicas à medida que os testes de stress bancário se vão acumulando só podem ser o resultado de duvidosas
decisões de concessão de crédito. Esta última variável assume em países como Portugal,
com declarada debilidade do seu potencial produtivo, o papel de instrumento de
ilusão, seja no consumo das famílias e dos empresários, seja das empresas. Não
quero ser popularucho, mas aquilo que se foi sabendo da ridícula participação
de gente bem-falante nos conselhos de administração da banca e do seu laxismo
decisório representa o melhor indicador do padrão de atribuição de crédito na
economia portuguesa em estreita correspondência com o padrão de decisão da
despesa pública. Uma maior transparência das relações entre esses conselhos de
administração e os principais stakeholders
da banca, sendo estes últimos parte interessadíssima no laxismo de critérios de
atribuição do crédito, tornará claros os mecanismos de cumplicidade.
A acumulação de recursos públicos já envolvidos em resgates da banca justifica
já um maior clima de exigência e de assunção de responsabilidades por parte da corporate governance bancária. Dir-me-ão
que a banca é uma espécie de meta-instrumento de funcionamento da economia de
mercado e por isso a sua solidez justifica o sacrifício de recursos públicos. Não
serei eu que vou discutir a relevância desse meta-instrumento. Mas a massa crítica
dos recursos orçamentais que estão a ser desviados de outras opções de política
pública exige uma outra postura de pedido de responsabilidades. Afinal nos últimos
tempos o BANIF não era um banco com maioria de capital público? O que fizeram
então os administradores responsáveis pela participação do Estado? Mas que raio
de modelo de governance é esse que
dedica administradores não executivos à representação do capital público?
Por sua vez, de Espanha também sopram ventos de indefinição estrutural. Tenho
para mim que o grande problema da sociedade espanhola é hoje a sua deficiente
articulação territorial. Como é que é possível que um PP se considere acima de
qualquer pensamento novo sobre esse problema constitucional, tendo sido o principal
acirrador da demagogia nacionalista na Catalunha, e reclamando mesmo assim a
compreensão de forças políticas como o PSOE para resolver o imbróglio
parlamentar em que a Espanha está mergulhada? Não é cristalina a indicação que
os catalães deram nestas eleições ao votarem maioritariamente na força política
emanada do PODEMOS (onde pontifica a nova alcalde de Barcelona) que sempre
defendeu uma nova articulação territorial constitucional e um referendo para
contrariar as pretensões dos independentistas? Não foi cristalino que os catalães
tivessem colocado os partidos independentistas em plano secundário e praticamente
arredassem o PP da região?
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