terça-feira, 22 de dezembro de 2015

UMA QUESTÃO DESFOCADA DE QUE NÃO HAVIA NECESSIDADE


Não podem imaginar como sinceramente lastimo o que está a acontecer a Carlos Costa (CC). E não é apenas por questões associadas ao relacionamento amistoso que a ele me liga desde há muitos anos, antes é sobretudo pelo imerecido fim de carreira que agora se lhe começa a anunciar de modo dificilmente reversível.

CC não foi nem um supervisor incompetente nem um supervisor menos dedicado, antes desempenhou bastante adequadamente o seu papel num período dificílimo e na sequência de uma herança no mínimo controversa. Levou uma nova dinâmica de gestão e competência para dentro do banco central e teve mesmo intervenções patrióticas em vários dos piores momentos destes anos de crise – foi preciosa para Portugal a sua credibilidade dentro do Banco Central Europeu e o seu envolvimento com Mario Draghi, foi relevante o seu trabalho de bastidores aquando do resgate português de abril de 2011, foi corajoso como mais ninguém tinha sido capaz de ser antes dele no enfrentamento do então “dono disto tudo” e agiu no essencial corretamente aquando do processo de resolução do BES.

Só que, desde então, CC andou sempre a “correr atrás do prejuízo”, sem que assim lhe sobrasse tempo e distância para imprimir um novo élan estratégico à sua ação. Mas se o problema de CC poderá ter começado por estar na autossuficiência das suas (e do Banco de Portugal) capacidades técnicas e negociais – vejam-se os casos Vítor Bento, dos lesados do BES, da (não) venda do Novo Banco, entre outros –, ele terá acabado por ser essencialmente o de uma incompreensível cedência às lógicas perversas da política, quer por ter sido complacente com interferências dessa esfera nas suas competências próprias quer por se ter permitido dar o corpo às balas por Albuquerque e Passos, quer ainda pelo teor de algumas das suas declarações no inquérito parlamentar e pela sua ingénua aceitação de uma recondução que mais não visava do que evitar a emergência pública de situações incómodas para o poder estabelecido. E assim tendo infelizmente sido, CC ficou desnecessariamente ligado a esse poder agora afastado e com ele conotado – naturalmente que, instalado um novo poder, as denúncias começam a abundar e os esqueletos saem dos armários, situação que o “Expresso” de sábado sintetizava na frase assassina “esta banca que vos deixo”.

(Cristiano Salgado, http://expresso.sapo.pt)


Pior ainda: tudo parece conjugar-se para que no início do ano venha a ocorrer uma comissão parlamentar de inquérito a pretexto do presente caso Banif. Como dizia o “Expresso Diário” de ontem, “a coisa será mais ou menos assim: vai ser uma tourada parlamentar, o duelo Mariana Mortágua vs. Maria Luís Albuquerque vai ser um dos melhores momentos televisivos de 2016, o CDS vai demarcar-se do PSD e atacar Carlos Costa, PCP e Bloco vão surfar a onda anti-bancos e o PS vai desmontar a teoria da saída limpa, defendendo que o Banif e o Novo Banco foram atirados para debaixo do tapete quando a troika tinha disponíveis para a banca portuguesa €12 mil milhões e o anterior governo só usou metade”. E, obviamente, ninguém contestará que CC vai ser um dos grandes visados nos trabalhos da referida comissão e na tentativa de deles serem retiradas consequências que forcem o seu afastamento (vejam-se, abaixo, algumas citações ilustrativas) – em boa verdade, tenho as mais sérias interrogações sobre se o País tem algo a ganhar com mais esta chicana de duvidoso rumo...


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