(Benoît Coeuré)
A crónica semanal (ao domingo) de Wolfgang Mϋnchau
no Financial Times é um permanente transporte para o centro do debate político
europeu, do qual estamos tão afastados pela pobreza inqualificável do nosso
jornalismo económico, salvaguardadas as notáveis exceções de Teresa de Sousa e
Isabel Arriaga e Cunha.
A crónica de hoje não foge a essa regra. A sua
leitura alerta-nos para dois momentos importantes no que se vai discutindo
sobre o impasse europeu e dos seus principais líderes, impasse que não resulta
apenas da prolongada negociação na Alemanha do acordo de governo entre Merkel e
o SPD.
O primeiro momento é proporcionado pela publicação
em França de uma obra de autoria de François Heisbourg, Presidente do Instituto
Internacional de Estudos Estratégicos de Genève, designada de O Fim do Sonho
Europeu. A tese de Heisbourg acentua claramente o impasse em que o Euro e a União
Europeia se encontram, falando de um círculo vicioso de cuja saída só o
desmantelamento do euro poderá constituir uma espécie de terceiro ótimo. O círculo
vicioso alimenta-se da impossibilidade de transferência de mais poderes para a União
Europeia (já que a crise atual não é dela dissociada), embora essa transferência
possa ser paradoxalmente considerada uma das vias de solução. Mϋnchau tem razão
em denunciar a não captação por parte de Heisbourg dos efeitos do caos que o
desmantelamento do euro por certo determinaria. Mas de qualquer modo, trata-se
de um indicador agudo do ponto em que estamos, quando um estratega não coloca
fora de hipótese o desmantelamento de algo que passa por ser o único cimento diferenciador
do projeto europeu.
O segundo momento é dado por mais um
pronunciamento de um dos raros elementos do corpo executivo do BCE que vai falando e não poucas vezes, Benoît Coeuré. Ora, este senhor saiu-se com uma de
se lhe tirar o chapéu e bem mais relevante do que parece. Segundo ele, a Europa
perfila-se para atravessar uma década deflacionária como o Japão o experimentou
na transição da década de 90 para a de 2000. Simplesmente, como Mϋnchau bem o
assinala, a ser assim a situação europeia será bem mais penosa do que a
japonesa, dada a taxa de desemprego incomparavelmente mais elevada observada
nas economias europeias.
Ora o que impressiona na posição do elemento do
BCE é a perceção clara do problema sem que a política económica da Comissão
Europeia e Conselho Europeu e a política monetária do BCE se convençam disso
mesmo, ou seja que a União Europeia, para além das agruras do euro, vive uma
situação de risco deflacionário sem vontade política de a combater. Por mais
fantasmas que o imaginário alemão tenda a inventar a verdade é que os riscos
inflacionários não passam de paranóia, ao passo que os riscos de deflação,
esses sim, estão aí para serem tomados a sério.
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