Pedro Adão e Silva, hoje no Bloco Central das manhãs de sábado na TSF, falava do estranho afastamento do PS relativamente à
construção de uma plataforma mais ampla de construção de uma alternativa de
governação que pode vir a constituir a solução que lhe restará para assumir o
poder.
De facto, à medida que o tempo corre e Seguro se
afasta dos diferentes pronunciamentos cívicos e suprapartidários que vão
emergindo na cena política portuguesa, mais evidente parece a improbabilidade
de uma maioria absoluta nas legislativas próximas, sejam elas antecipadas ou se
realizem no seu tempo normal. Assim sendo, uma de duas hipóteses pode ocorrer:
ou se forma uma coligação de governo (de centro esquerda ou de esquerda, esta
bem mais remota) ou o PS terá de governar à vista de acordos parlamentares e,
neste caso, necessitaria de uma plataforma mais ampla de suporte ao governo. A
construção dessa plataforma mais ampla pode assumir várias modalidades, uma das
quais pode passar por um forte e decisivo apoio de um acordo de concertação
social e um envolvimento mais regular e participado do Conselho Económico e
Social. Se for apoiado por um acordo desse tipo, o governo PS poderia dispor no
Parlamento de uma referência de peso, colocando os restantes partidos com
representação parlamentar numa situação muito difícil, tornando os acordos
parlamentares para matérias específicas como o Orçamento de Estado de menos
problemática concretização. Mas a construção dessa plataforma mais ampla pode
passar também pela composição do elenco governativo que pode passar pela inclusão
de personalidades representativas de correntes de opinião e de instituições que
podem e muito ajudar à credibilização da solução governativa encontrada.
Nenhuma destas alternativas se constrói do nada e
por isso necessitam de tempo e maturação para serem concretizadas. Ora o PS
parece entrincheirado e não dar mostras de querer enveredar pela sua abertura a
estes alargamentos da via partidária. Talvez o faça por se ter deixado embarcar
no jogo continuado da atual maioria que ora desrespeita e ignora o PS, ora se
lança no pouco consistente apelo à negociação.
Ora é neste contexto que emerge a iniciativa do LIVRE, novo partido ou movimento (o futuro o dirá) animado por Rui Tavares,
focado na procura de uma convergência para a esquerda. Das primeiras
iniciativas do partido/movimento agora constituído surge o lançamento à discussão
aberta do documento Roteiro para a Convergência.
Pelos poucos momentos de colaboração que tive com
Rui Tavares na sua qualidade de deputado europeu parece-me alguém muito bem intencionado
que acredita nas suas ideias de não dissociar a construção cívica de uma
alternativa para o País de um europeísmo renovado. Gostei do seu entusiasmo, da
sua persistência e da sua postura. Não sei se o LIVRE será direto ou indireto e se
conduzirá a um resultado concreto.
O Roteiro para a Convergência é um documento muito
simples, artesanal que começa com uma proposta A bem ilustrativa desse caráter
artesanal: “(…) a realização de um
questionário, a enviar aos partidos, sindicatos, movimentos sociais e cidadãos
individuais que se reconheçam como fazendo parte da esquerda portuguesa, e
tendo por objeto as causas, consequências, e possíveis soluções para ultrapassar
os bloqueios à esquerda. Este questionário poderia incluir perguntas sobre os
obstáculos formais e informais à cooperação entre as várias partes; diferenças
substanciais de propostas política que impossibilitem o diálogo ou a
apresentação de propostas comuns; entendimentos diversos das posições políticas
de cada um e das fronteiras dos conceitos de esquerda e progressismo no plano
nacional; e ainda uma área aberta para a adição de quaisquer outras reflexões
que os respondentes considerem essenciais”.
Não deixa de ser “original” iniciar a constituição
de um partido/movimento com um questionário. Mas parece-me que isso reflete a
ingenuidade artesanal do movimento. A proposta B – fundação de um fórum
consultivo permanente entre forças de oposição, partidárias ou não, às atuais
políticas nacionais e europeia completa o quadro simples de propostas,
suportadas por dois objetivos centrais – a construção de um arco constitucional
e a constituição de uma frente progressista.
Não creio que seja possível uma convergência à
esquerda em Portugal, pelo menos entre as suas três principais forças políticas,
PS, PCP e Bloco de Esquerda e por isso não posso deixar de apreciar a ousadia e
perseverança dos que estão na origem do LIVRE. Penso que a alternativa de construção
de uma plataforma mais ampla a partir de um governo PS é mais exequível. Já no
que respeita à atenção que o Roteiro para a Convergência dá à construção de
listas conjuntas, cidadãs e partidárias às próximas eleições europeias me
parece que se trata de outra música e essa mais consistente. O que se anuncia
em matéria de candidaturas às listas a apresentar pelos principais partidos
portugueses às europeias cheira-me a algo de tenebroso que pode traduzir-se
numa composição para esquecer dos próximos deputados portugueses no PE. Oxalá
me engane. Por isso, tudo o que permita contrariar a descredibilização em
marcha do próximo grupo de deputados portugueses no PE vale a pena ser seguido
com atenção.
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