sexta-feira, 8 de novembro de 2013

O BCE CHEGOU-SE À FRENTE, MAS …



A decisão do BCE ontem anunciada na habitual conferência de imprensa promovida por Mario Draghi de descer a taxa de juro de referência para as operações de refinanciamento no Eurosistema em 25 pontos percentuais, fixando-a em 0,25%, se por um lado constituiu surpresa para alguns analistas, por outro dá razão aos que têm vindo a acenar com a hipótese de sobrevir para a Europa um período deflacionário. Também a chamada “marginal lending facility”, que constitui o custo de aceder com suporte de ativos elegíveis capazes ao financiamento de “overnight” junto do BCE foi descida em 25 pontos percentuais fixando-se agora em 0,75%. Só a taxa de facilidade de depósitos que mede o custo de depositar fundos “overnight” no BCE foi mantida em 0,0%.
O comunicado de Draghi que antecedeu a conferência de imprensa é muito claro nesta matéria. As expectativas inflacionárias a curto prazo são declaradamente nulas, projetando-se taxas de inflação anuais muito baixas nos próximos tempos, para as quais concorre a continuidade de um clima depressivo de atividade económica, com preços mais elevados das “commodities” e crescimentos abaixo do esperado da procura interna e das exportações (difícil seria esperar o contrário). O BCE confirma a previsibilidade de um período prolongado de inflação baixa e acerta a sua orientação futura de expectativas comprometendo-se com um crescimento de taxas a médio e longo prazo abaixo mas próximas dos 2%.
Nem uma palavra sobre os riscos deflacionários (as famílias poderão adiar compras mesmo que tenham condições para as incrementar esperando novas descidas de preços), mas a decisão está pelo menos em linha com os que denunciam a fobia inflacionária dos que continuam a invocar a curto prazo os riscos inflacionários para negar uma intervenção mais decidida dos governos do Norte para impulsionar uma recuperação mais rápida.
Na comunicação de Draghi há ainda que mencionar a confirmação de que os agregados monetários mais amplos incluindo a massa de crédito apresentam uma variação bem mais moderada do que os agregados mais líquidos. São as entradas líquidas de capital na zona euro que explicam os agregados monetários mais amplos enquanto que a taxa de variação do crédito ao setor privado é extremamente baixa. Ou seja, confirma-se que apesar da política monetária permissiva essa abertura continua a não materializar-se em crédito mais flexível. E não será apenas um problema de procura de crédito debilitada que explica essa não fluidez. O comunicado fala de comportamentos desfasados face ao ciclo económico, de risco de crédito e de ajustamento de balanços do setor financeiro e não financeiro.
E como não podia deixar de ser, a ladainha das reformas estruturais fecha como sempre o comunicado, reclamando o BCE processos de consolidação fiscal reorganizados no sentido de favorecer medidas mais amigas do crescimento. Será que estou a ler bem? Será esta reorientação amiga do crescimento que o BCE, como elemento integrante da Troika, preconiza para Portugal no período final do ajustamento? Hipocrisia que baste!

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