A decisão do BCE ontem anunciada na habitual
conferência de imprensa promovida por Mario Draghi de descer a taxa de juro de
referência para as operações de refinanciamento no Eurosistema em 25 pontos
percentuais, fixando-a em 0,25%, se por um lado constituiu surpresa para alguns
analistas, por outro dá razão aos que têm vindo a acenar com a hipótese de
sobrevir para a Europa um período deflacionário. Também a chamada “marginal lending facility”, que
constitui o custo de aceder com suporte de ativos elegíveis capazes ao
financiamento de “overnight” junto do
BCE foi descida em 25 pontos percentuais fixando-se agora em 0,75%. Só a taxa
de facilidade de depósitos que mede o custo de depositar fundos “overnight” no BCE foi mantida em 0,0%.
O comunicado de Draghi que antecedeu a conferência
de imprensa é muito claro nesta matéria. As expectativas inflacionárias a curto
prazo são declaradamente nulas, projetando-se taxas de inflação anuais muito
baixas nos próximos tempos, para as quais concorre a continuidade de um clima
depressivo de atividade económica, com preços mais elevados das “commodities” e crescimentos abaixo do
esperado da procura interna e das exportações (difícil seria esperar o contrário).
O BCE confirma a previsibilidade de um período prolongado de inflação baixa e
acerta a sua orientação futura de expectativas comprometendo-se com um
crescimento de taxas a médio e longo prazo abaixo mas próximas dos 2%.
Nem uma palavra sobre os riscos deflacionários
(as famílias poderão adiar compras mesmo que tenham condições para as
incrementar esperando novas descidas de preços), mas a decisão está pelo menos
em linha com os que denunciam a fobia inflacionária dos que continuam a invocar
a curto prazo os riscos inflacionários para negar uma intervenção mais decidida
dos governos do Norte para impulsionar uma recuperação mais rápida.
Na comunicação de Draghi há ainda que mencionar a
confirmação de que os agregados monetários mais amplos incluindo a massa de crédito
apresentam uma variação bem mais moderada do que os agregados mais líquidos. São
as entradas líquidas de capital na zona euro que explicam os agregados monetários
mais amplos enquanto que a taxa de variação do crédito ao setor privado é
extremamente baixa. Ou seja, confirma-se que apesar da política monetária
permissiva essa abertura continua a não materializar-se em crédito mais flexível.
E não será apenas um problema de procura de crédito debilitada que explica essa
não fluidez. O comunicado fala de comportamentos desfasados face ao ciclo económico,
de risco de crédito e de ajustamento de balanços do setor financeiro e não
financeiro.
E como não podia deixar de ser, a ladainha das
reformas estruturais fecha como sempre o comunicado, reclamando o BCE processos
de consolidação fiscal reorganizados no sentido de favorecer medidas mais
amigas do crescimento. Será que estou a ler bem? Será esta reorientação amiga
do crescimento que o BCE, como elemento integrante da Troika, preconiza para
Portugal no período final do ajustamento? Hipocrisia que baste!
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