Já foi feito neste espaço o justo elogio
do economista belga Paul De Grauwe, agora essencialmente ligado à “London
School of Economics”, razão pela qual me dispenso de mais encómios aos seus relevantes
contributos para a teoria económica e ao seu continuado trabalho de elucidação
e denúncia em relação aos principais traços da atual crise europeia e aos desmandos
a ela associados.
Nesta linha, é mais uma vez esclarecedor
o último artigo que se lhe conhece (“Panic-driven austerity in the Eurozone and
its implications”, “Vox”), assinado em coautoria com uma economista chinesa
doutorada em Lovaina. Os quatro gráficos que abaixo reproduzo, com a devida
vénia, pretendem dilucidar a temperatura económica na Europa recorrendo a uma representação
menos criativa do que a que ressalta das vinhetas de Erlich. A sua chave de
leitura assenta numa econometria básica segundo a qual o indicador R2
mede (numa escala de 0 a 1) quanto da variação ocorrida na variável
representada no eixo das ordenadas é explicada pela variável representada no
eixo das abcissas; três resultados merecem especial sublinhado.
Um primeiro resultado marcante é traduzido
pela verificação de uma estreita correlação positiva (R2 = 0,9668) entre
os spreads (diferenciais de taxas de
juro da dívida soberana de cada país em relação às alemãs) e as medidas de
austeridade aplicadas por cada país, isto é, maiores spreads a explicarem em quase 97% a maior intensidade dos programas
de austeridade levados a cabo. O que os autores racionalizam nos seguintes
termos: “Desde o início da crise da dívida, os mercados financeiros forneceram
sinais errados; conduzidos por medo e pânico, empurraram os spreads para níveis artificialmente
elevados e forçaram as nações com escassez de dinheiro para uma austeridade intensa
que produziu grande sofrimento”.
Um segundo resultado significativo é
traduzido pela verificação de uma forte correlação positiva (R2 = 0,8601
e R2 = 0,8504, respetivamente) entre a austeridade ocorrida em cada
país e a sua dinâmica de crescimento económico e de endividamento, isto é,
maior austeridade a explicar os maiores custos constatados em matéria de
decréscimos de PIB (mais de 86%) e de acréscimos do peso da dívida em
percentagem do PIB (mais de 85%). O que os autores sumarizam nos seguintes
termos: “Pânico e medo não são bons guias para as políticas económicas. Estes
sentimentos obrigaram os países do sul da Zona Euro a uma rápida e intensa
austeridade, que não apenas conduziu a profundas recessões mas também não
ajudou até agora a restaurar a sustentabilidade das finanças públicas. Pelo
contrário, as mesmas medidas de austeridade conduziram a dramáticos aumentos do
rácio da dívida em relação ao PIB nos países do sul, assim enfraquecendo a sua
capacidade para servir a sua dívida.”
Um terceiro resultado interessante é traduzido
pela verificação de uma estreita correlação positiva (R2 = 0,9777) entre
os spreads que existiam em meados de
2012 e a sua variação na sequência das decisões do BCE subsequentes ao whatever it takes de Draghi, isto é, níveis
especulativos mais altos no período pós-crise a induzirem reações de mais visível
tendência normalizadora após o anúncio das chamadas OMT’s. O que os autores equacionam
nos seguintes termos: “Ao afastar o fator medo, o BCE permitiu que os spreads caíssem. Vemos que o declínio
nos spreads foi maior nos países em
que o fator medo tinha sido maior.”
Digna de nota é, ainda, a conclusão final
apresentada em dois tempos por De Grauwe e Yuemei Ji: por um lado, os mercados
financeiros empurraram os spreads
para níveis crescentemente afastados dos “fundamentais” económicos e contribuíram
também para uma alimentação da lógica deflacionista que se instalou, visto não terem
sinalizado junto dos países do norte da Zona Euro a possibilidade e necessidade
de eles estimularem as suas economias e assim contrabalançarem a deriva
recessiva; por outro lado, se os efeitos de um BCE a assumir-se como possível
prestamista de última instância eliminaram os “medos existenciais quanto ao
futuro da Zona Euro”, o facto é que tal eximiu o futuro da Zona Euro de ficar
sujeito a “novos riscos” que se deslocaram para a esfera social e política.
Aqui fica, pois, um pouco de “economês”,
simplificado q.b., a marcar uma tarde em que os portugueses estão na rua a
proclamar “apre”…
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