Como já o Freire de Sousa referiu no seu último post, o bail-out de 17.000 milhões de €
aos seus principais bancos indicia a presença de um “corralito” no seio da zona
euro que vem complicar a já de si bastante completa situação deste espaço. Na
verdade, a pressão sobre o governo cipriota, provavelmente liderada pelo
ministro das Finanças alemão Schauble, impôs que os depositantes dos bancos cipriotas
suportassem uma parte do resgate, sob pena da solução alternativa ser o default absoluto e completo dos compromissos
bancários cipriotas.
Mas, à medida que se conhecem melhor os pormenores
da operação, concretizada ao pormenor e jogando com o encerramento dos bancos no
fim de semana e na segunda feira feriado em Chipre, a intervenção é mais complexa,
não assumindo propriamente os contornos de um resgate típico. A perda dos depositantes
é introduzida através de um imposto único e circunstancial sobre os depósitos (9,9%
para depósitos acima dos 100.000 € e 6,75% para depósitos abaixo desse valor),
mas que é reconvertido em ações dos bancos intervencionados entregues a esses mesmos
depositantes.
Alguns círculos de opinião fizeram-se ecos de que
a imposição de uma fatia da perda aos depositantes seria uma penosidade enviesada
a dinheiro menos claro (sobretudo proveniente da Rússia) que circularia pelos bancos
cipriotas. Mas a decisão de quebrar a barreira dos 100.000 € e penalizar também
os depósitos abaixo desse valor deita por terra essa pretensão justiceira. Trata-se
isso sim de uma profunda viragem nos processos de bail-out.
Imaginemos que em Portugal segunda-feira era feriado
e que terça-feira veríamos a generalidade dos nossos depósitos transformada numa
percentagem não despicienda transformada em títulos que não serão mais do que lixo
nos próximos tempos. Não será difícil antecipar as reações desencontradas que tal
intervenção suscitaria. Karl Whelan tem um excelente artigo sobre os cenários de
reação de expectativas que podem ocorrer esta semana em países como a Grécia, Espanha
e porque não em Portugal. Para uma mais completa e técnica apreciação da complexidade
da intervenção, o FT Alphaville tem também um bom artigo sobre a matéria.
O que parece ressaltar daqui é que o princípio das
medidas isoladas e não extensíveis a outros países começa a cair por terra. O caso
de Chipre mostra assim como a associação entre as políticas de austeridade e a pretensa
confiança e estabilidade é um verdadeiro flop
agravando irreversivelmente toda a relação custo-benefício da penosidade que nos
tem sido imposta. O que tudo isto significa é que a segurança dos depósitos resultantes
de poupanças simples e normais, sem quaisquer preocupações de risco ou de especulação
é uma treta. Parece que já ninguém se lembra dos passos que foram entretanto
dados no sentido da união bancária europeia. A vertigem de tudo isto é preocupante.
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