Para a maioria dos mortais, leiga na(s)
matéria(s), ao espanto associado à “revolução da Internet” sucedeu o encanto
decorrente da sub-revolução associada ao lançamento em 1998 do motor de buscas
Google e subsequentes. E não me refiro apenas à enorme complexidade das competências
tecnológicas envolvidas, mas também ao crescente hermetismo dos modelos de
negócio assim potenciados (em 2012, a Google teve um resultado líquido próximo
de 11 mil milhões de dólares, movimentou mais de 50 mil milhões e faturou cerca
de 44 mil milhões em publicidade).
Mas uma coisa sempre me pareceu óbvia:
que é no plano da mudança disruptiva que nos situamos quando observamos e
convivemos com tais fenómenos. E, assim sendo, que estamos apenas no dealbar de
uma era das sociedades humanas que já não iremos conhecer e que hoje ainda só
podemos explorar numa lógica de “cultura prêt-à-porter”
ou em espreitadelas mais ou menos ficcionadas – tâtonnements, usando a propósito uma palavra francesa de que gosto
especialmente.
Pois as recentes notícias em torno de
queixas e investigações europeias em relação à empresa americana fundada por Larry Page e Sergey Brin vieram
reforçar assinalavelmente essa ideia. Tanto é o que está em jogo: a
consolidação de uma economia digital, a regulação das suas práticas e respetiva
harmonização global, a defesa dos direitos fundamentais de cidadãos e consumidores,
as políticas de defesa da propriedade intelectual e de proteção de dados, a sua
umbilical relação com o advento de uma sociedade do conhecimento.
Indo a factos, o mais visível foi o
recente acordo assinado, com o alto patrocínio de François Hollande, entre o chairman da Google (Eric Schmidt) e o
governo francês. Nos termos do mesmo, a Google pagará 60 milhões de euros a um
fundo visando contribuir para o desenvolvimento da presença na Web da imprensa francesa. Com Hollande a
declarar que “é precisa uma aliança entre os produtores de conteúdos e os seus
difusores” e Schmidt a sublinhar ser de longe preferível um acordo a uma lei e
a referir-se a um “acordo histórico”.
Mas nada parece fazer crer que esta
resistência “pacífica” da Google no sentido de procurar protelar ao máximo uma
afetação substancial do seu core business
possa ser duradoura e suscetível de imperar no futuro. Primeiro, porque a
agressividade e a contestação concorrencial se mostram crescentes (Microsoft à
cabeça); segundo, porque está em curso na Alemanha um processo legislativo que
seguramente se saldará por um tratamento “copyright
extensivo” e conducente à possibilidade de introdução de fees de licenciamento por parte dos editores; terceiro, porque a
Comissão Europeia tem vindo a endurecer o seu posicionamento – também porque a
Google detém uma posição de 90% das buscas realizadas no espaço europeu –,
havendo já rumores de multas passíveis de serem aplicadas até 2% do volume de
negócios anual global (o que significaria um valor em torno de 760 milhões para
o caso da Google, de acordo com os seus dados de 2011); por fim, porque a
legitimamente ambiciosa estratégia empresarial dos responsáveis da Google
(evolução para um knowledge engine) a
tenderá a tornar um alvo ainda mais apetecível.
Entretanto, e enquanto as coisas vão
marinando, googlemos irmãos…
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