Num registo muito singelo, associo-me ao amigo
Freire de Sousa para homenagear a personalidade e a obra de Óscar Lopes.
A minha forma de o fazer é apelar à minha memória
seletiva, neste caso nada desfocada ou nebulosa, invocando os tempos do liceu,
no velho e agora renovado D. Manuel II /Rodrigues de Freitas, uma casa que
marcou por via de alguns dos seus professores a minha própria personalidade e
maneira de pensar.
Curiosamente, Óscar Lopes nunca foi meu
professor. Em matéria de língua portuguesa, estive também muito bem assistido
pelo Professor Manuel Salgado. Porquê então apelar à memória pra falar de Óscar
Lopes?
Nesses tempos idos, as aulas de substituição pela
ausência de alguns dos professores nem eram bem queridas (havia sempre a hipótese
de uma fuga para a generosidade dos espaços desportivos do liceu, nas quais
joguei praticamente tudo ou, para os mais atrevidos, uma escapadela aos
bilhares do Diu), nem abundantes (as faltas dos professores eram de facto episódicas).
Mas existiam e tínhamos de as suportar. Ora, a minha memória mantem-se fresca
em relação a algumas dessas aulas. Um professor da envergadura de Óscar Lopes
também dava aulas de substituição. E que aulas? Chegava, baixinho e pequeno,
modesto, tímido e simplesmente contava histórias de palavras. Pegava numa
palavra, às vezes escolhida por nós, declinava-a e durante 35 a 40 minutos ficávamos
presos ao desenvolvimento da história que nos levava sempre para bem longe. Só
mais tarde percebi a dimensão intelectual e política de quem nos contava
aquelas histórias de fascínio puro pelo universo da palavra. Tomei contacto com
o que representava para a língua portuguesa. Mas, curiosamente, Óscar Lopes
ficou para sempre o memorável contador de histórias de palavras. Quando na
viragem do então 5º ano me confrontei com a angústia de toda a juventude de então
(Ciências ou Letras), penso que aquelas aulas de substituição me fizeram
balancear ainda mais. O compromisso reformista que me levou à alínea g), uma
espécie de síntese entre as ciências e as letras talvez tenha sido, entre
outras coisas, estimulada pela história das palavras. E, quando mais tarde,
andei por arremedos de alguma literatura (alguns contos para o Diário de Lisboa
juvenil, pequenos ensaios para o Programa Em Órbita e quedei-me por aí …)
talvez o fascínio da palavra também tenha estado presente.
Morreu um grande contador de histórias … de
palavras.
Sem comentários:
Enviar um comentário