terça-feira, 6 de outubro de 2015

A SEMPRE EM PÉ CDU




(Notas sobre uma crónica de Ferreira Fernandes no DN, num registo cada vez mais necessário para vencer a nossa modorra)

A crónica de Ferreira Fernandes chama-se “O nicho de Jerónimo e o resto do país” e inscreve-se numa necessidade óbvia que é a de analisar mais profundamente o que se passa à esquerda do PS. Ao contrário do que muito boa gente pensa, o que se passa à esquerda do PS é para seguir com atenção. Por duas razões. Primeiro, porque essa dinâmica vai interagir com a dinâmica de clarificação interna do PS. Segundo, porque a instabilidade estrutural indutora de radicalismo que se vive na Europa vai impactar seriamente a esquerda da esquerda que tem experiência de governação.

A CDU, mais propriamente o PCP, tiveram no ato eleitoral de 4 de outubro segundo a sua própria leitura uma vitória, alicerçada naquele princípio de crescer um bocadinho para permanecer na mesma. E temos de convir que a resiliência do PCP é notável, sobretudo no plano comparativo europeu de forças similares hoje devotadas a situações minoritárias. A figura de Jerónimo de Sousa ajusta-se como uma luva ao imobilismo aparentemente progressivo. A sua bonomia, a sua simpatia natural, as suas raízes operárias e de povo que lhe garantem uma presença de naturalidade espontânea, a sua perspicácia política contribuíram para reduzir senão mesmo erradicar a imagem de agressividade instalada na sociedade portuguesa na sequência dos acontecimentos do PREC. Aliás, é espantoso como essa imagem rapidamente muda quando o palco é proporcionado a alguns intelectuais orgânicos do partido ou à linha dura mantida regra geral por detrás das cortinas. Cheguei a admitir que o rejuvenescimento operado nos últimos anos, com a chegada à exposição mediática de alguns jovens quadros do PCP, iria produzir alguns efeitos, mas a perceção que emerge é que 15 ou 20 assentos parlamentares seria indiferente. O objetivo é simplesmente permanecer. Sobretudo agora que tendo assumido uma posição mais declaradamente anti- Euro, sem contudo investir no aprofundamento da gestão das consequências da saída do euro, o PCP se coloca numa posição de protesto imobilista.

As possibilidades do PCP jogar o jogo da governação são remotas, muito remotas. Talvez só numa situação de catástrofe nacional, em que fosse necessário um efetivo governo de salvação nacional, ou seja uma solução patriótica de último recurso, poderia seduzir o PCP a uma exposição governativa.

O curioso desta questão é que o caso do Bloco de Esquerda não pode ser analisado segundo o mesmo modelo. O efeito crescimento do Bloco não é neutro, sobretudo pelas implicações que tem no PS. Vale a pena seguir com atenção a sua futura ação parlamentar. Ela pode oscilar entre duas situações possíveis: a situação de para … lamentar e a de contributo para alguma produção legislativa, por mais pontual que seja, que dê corpo a alguma regulação de esquerda, como por exemplo no plano da accountability do setor bancário e financeiro.

Poderá discutir-se se o crescimento do Bloco (não muito significativo face ao seu melhor resultado no passado) poderá prefigurar a emergência de um SYRIZA português. Tudo dependerá da evolução da situação interna do PS. Só a “Paokização” do PS a prazo poderia precipitar um crescimento do Bloco para modelos de governação mais à esquerda. E isso não está na margem de manobra do Bloco, mas antes na lucidez interna do PS.

A seguir com atenção.                                                                                                                         

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