(Indicador de severidade da austeridade construído em torno do défice estrutural) in "Um Guia para os perplexos", Pedro Magalhães, Margem de Erro
(Ainda em
tempo de preliminares eleitorais …)
Ao longo de toda a cacofonia em que a campanha eleitoral se transformou, em
que o ruído das “tracking polls” se
substituiu a qualquer reflexão séria de quem estivesse interessado em comparar
alternativas, o Margem de Erro do Pedro Magalhães foi um contributo sereno para
compreendermos o significado e, simultaneamente, as fragilidades da sucessão
diária de sondagens. Pode gostar-se ou não do que o pensamento de Pedro
Magalhães vai permitindo sistematizar como conclusões. Mas o Margem de Erro
prestou inequivocamente um serviço de sensatez a todo este novo
enquadramento do desenrolar da campanha eleitoral no terreno.
O seu último texto “Um guia para os
perplexos” reúne um conjunto de reflexões de grande utilidade
não propriamente para antecipar com mais rigor os resultados do próximo
domingo, mas seguramente para melhor compreender o que resulta ser a grande
conclusão de todo este exercício de realização de sondagens de teor muito desigual
que se multiplicaram nestas duas últimas semanas. E essa conclusão, que não
equivale necessariamente no meu pensamento a um vaticínio sobre o que a noite
de 4 de outubro nos trará, é a da revelação da incapacidade, revelada nos
números, do PS desenvolver uma dinâmica de superioridade nas referidas
sondagens.
O que é particularmente estimulante no exercício de ciência política levado
a cabo por Pedro Magalhães é ele relacionar permanentemente resultados de
consulta de opinião a potenciais eleitores (não apenas sondagens) com
indicadores de natureza macroeconómica passíveis de ser compreendidos pelo
eleitor médio como fatores de influência do seu voto. Claro está que para o
eleitor concreto contará mais não propriamente o indicador macroeconómico,
qualquer que o seja, mas sobretudo a influência específica que a situação
macroeconómica exerceu nas suas condições de vida, de bem-estar material e
imaterial e nas suas aspirações (perceção de futuro). Mas para compreender o racional coletivo que estará subjacente à
realidade (eventualmente pseudo-realidade) que está a desenvolver-se diante dos
nossos olhos a abordagem de PM é a única possível.
Destaco do texto de PM três ideias cruciais.
A primeira é a demonstração a partir dos dados das sondagens que não é
rigorosa a ideia de que a maioria no governo não estará a ser penalizada pelo
eleitorado. PM estima que, mesmo no melhor cenário eleitoral decorrente da
informação acumulada das sondagens, a percentagem de 41%, a maioria teria
perdido cerca de 550.000 votos. Num cenário de sondagens com 38% para a
maioria, a penalização seria de 700.000 votos. Ora, esta avaliação é crucial
para compreendermos a dificuldade do PS capitalizar. Para que isso acontecesse
no plano das sondagens, seria necessário uma penalização de mais largo porte. Num
cenário de castigo mais severo para a coligação, o PS poderia capitalizar mais
ainda que tendo de partilhar benefícios com a CDU e o Bloco de Esquerda.
A segunda reflexão prende-se com a própria dimensão da austeridade, outro
elemento fundamental para se compreender alguma da perplexidade com que a
maioria tem ocultado a sua culpa no cartório. Com base no comportamento do défice
estrutural como medida mais rigorosa da austeridade (já aqui abundantemente
discutida neste blogue), é possível intuir que essa dimensão começou a ter
incidência já a partir de 2009, coisa que o PS nunca conseguiu gerir, tendo de
facto sido fortemente agravada de 2011 para 2012 e, também como já aqui alertámos,
começado a desacelerar de 2013 para 2014. Ou seja, a maioria jogou habilmente
com o alívio parcial da austeridade no período de antecâmara das eleições. Tal
como repetidas vezes aqui o assinalei, em contexto de forte austeridade,
qualquer alívio da mesma repercute-se obviamente no consumo privado. E o comportamento
mais recente do consumo privado assim o mostra, sem que o PS tenha identificado
o antídoto para contrariar a sua influência na perceção do eleitorado.
(Pedro Magalhães)
A terceira reflexão prende-se com o indicador “Confiança do consumidor” a
que talvez o PS devesse ter dedicado mais atenção. Apesar dessa confiança ainda
se manter em terreno negativo, a partir de fevereiro de 2013 o indicador tem
uma evolução ascendente muito clara. Em termos de senso comum, esta situação
corresponde ao “melhorou pouco, sim, mas melhorou” e a maioria tem explorado
exaustivamente essa tábua de salvação. PM fala dos atrasos no tempo com que a
perceção da competência económica dos partidos é vivida pelo eleitor potencial,
o que terá jogado em desfavor do challenger
(PS).
São reflexões importantes sobretudo para que por via analítica possa
compensar-se o azedume e acabrunhamento que tudo isto está a provocar nos que não
estão a rever-se em mais um período de resiliência face às perversidades desta
maioria. O hemisfério analítico do cérebro movimenta-se para conter a revolta
interior do hemisfério sintético e das emoções.
E a última grande sondagem antes das eleições está prestes a ser publicada …
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