O tempo vai passando, a informação vai surgindo,
a investigação faz o seu papel e o véu sobre os programas de ajustamento nos países
da periferia europeia com o qual tem sido canhestramente montada a operação de
branqueamento dos erros da Comissão Europeia e seus cúmplices vai-se tornando
cada vez mais transparente.
Elisa Ferreira teve ontem no Parlamento Europeu uma
intervenção bem apelativa a chamar as coisas pelos seus verdadeiros nomes e
dispõe para isso para seu apoio e fundamentação um conjunto cada vez mais
alargado de referências e suportes de evidência bem conclusiva.
Simon Wren-Lewis no sempre visitável Mainly Macro
tem-se focado na Grécia e na negação sistemática por parte dos branqueadores do
que verdadeiramente aconteceu com o programa de ajustamento grego. A Grécia é
particularmente ilustrativa de um certo tipo de argumentação que acompanhou de início
os fundamentos para um ajustamento tão punitivo. As particularidades pouco
recomendáveis em alguns domínios da administração pública grega sempre foram
usadas como o grande alibi para o ajustamento punitivo. Mas o problema é que, sem
ignorar tais particularidades e a necessidade imperiosa de contrariar tais
abusos e disfuncionalidades, rapidamente a degradação da situação permitiu
verificar que tais “particularidades” esgotavam rapidamente a aceitável carga
justificativa.
Simon Wren-Lewis refere alguns mitos sobre os
pretensamente incorrigíveis gregos. Primeiro, a tese segundo a qual a pretensa
incompetência grega não permitiu aplicar a austeridade desejada é um completo non sense. Desde 2011, a Grécia
apresenta excedentes orçamentais primários em percentagem do PIB respetivamente
de 1,3% (2011), 4,2% (2012), 6,5% (2013) e projeta para 2014 7,6%, com quedas
de PIB para esses mesmos anos de 7,1%, 6,3%, 4,5% e 1,3%. Segundo, a negação de
que os gregos se recusaram a descidas de salários cai também por terra, com
forte aceleração dessa queda em 2011-12. Terceiro, o facto da despesa pública
grega em defesa, designadamente em submarinos alemães, não ter caído ilustra
bem o cinismo da abordagem. Quarto, a negação da responsabilidade do
ajustamento punitivo pela deterioração das condições de saúde dos gregos leva
Wren-Lewis a uma surpreendente comparação com a fome irlandesa de 1840.
Quanto a Portugal, um estudo do think-tank Bruegel de autoria de Pisany-Ferry, Sapir e Wolff de 2013 que me tinha escapado é também bem sintomático dos dados
certos que têm de ser invocados para desmontar o branqueamento levado a cabo
pela Comissão Europeia (Rehn e seus muchachos). Os autores destacam sobretudo o
facto dos custos sociais e de emprego da austeridade terem coexistido com uma
desapontadora performance do investimento, contrariando toda a ideologia do
programa de ajustamento. Aliás, tal como Viriato Soromenho hoje assinala no Diário de Notícias, a publicação dos dados macroeconómicos de 2013 pelo INE retira
quaisquer veleidades de branqueamento despudorado: “Como se fosse uma lista de baixas numa
guerra, ficámos a saber que o PIB do país recuou ao nível do ano 2000 e o
emprego tombou até ao ano de 1996. Em dois anos e meio foram destruídos 328 mil
empregos. Tudo isto para combater uma dívida pública bruta excessiva, que, no
mesmo período, subiu de 94% para quase 130% (ultrapassando em 15% as precisões
da troika).”
Assim sendo, Cara Elisa, que a força das palavras
te assista e não te falte para pôr esta gente, que não é de confiança, na ordem.
E que Seguro, Assis e o PS o compreendam.
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