sábado, 1 de março de 2014

UMA DIREITA PROLETÁRIA?

(Haydée Sabéran)


Devo confessar que não é propriamente a ascensão galopante de partidos como a Frente Nacional (FN) de Marine Le Pen em França (a nível de toda a França e não apenas em territórios acantonados) que me impressiona e incomoda. O que me perturba é a capacidade que a FN tem manifestado de penetração nos meios operários, ocupando o espaço eleitoral anteriormente ocupado pelo Partido Comunista Francês.
Graças ao Le Monde des Livres de ontem cheguei a duas novas leituras que a viagem a Bruxelas e o ritual de visita a uma das minhas livrarias de estimação, Tropismes, na Galérie des Princes proporcionaram, com duas novas compras.
Bienvenue à Hénin-Beaumont. Reportage sur un Laboratoire du Front National da jornalista do Libération em risco de extinção, publicado pela La Découverte, Cahiers Libres, é uma obra que se lê de um jato e tem materiais cruciais para tentar superar esta minha incomodidade com a existência de uma direita proletária. Hénin et Beaumont é um pequeno município de uma das mais importantes bacias mineiras de França, no qual está eminente o acesso ao poder municipal da FN, através de um elemento do Conselho Municipal já em representação da FN. Estamos por isso perante a ocupação por parte da FN de um território de claríssima origem operária, substituindo-se aos partidos operários como referencial político, ao mesmo tempo que as forças de esquerda se dividem presentemente entre quatro forças.
Na reportagem do Le Monde des Livres, o candidato presumivelmente ganhador da FN, Steeve Briois explica sucintamente o seu êxito potencial nas próximas eleições com esta frase lapidar tal é o seu significado: “Estamos próximos das pessoas, como a esquerda antes o fazia, quando era ainda o partido de Jaurés.”
Ora toma que é para compreenderes o que se passa. O jornal documenta ainda essa realidade com testemunhos de potenciais votantes que declaram que, fazendo-o, não sentem qualquer forma de incompatibilidade ou contradição com o voto dos seus pais ou avós operários e resistentes.
Emerge pois uma direita proletária explicando a crescente dimensão nacional da FN, partido que desenvolve uma prática política de rua que é também um novo aspeto a ter em conta na sua ascensão galopante. A rua deixou de ser património exclusivo das manifestações de esquerda.
Vale a pena pensar no que significa “estamos próximos das pessoas” e sobretudo compreender que em grande medida a construção enviesada e à socapa do projeto europeu é um grande responsável pelo afastamento criado. O aviso está aí.
A outra leitura – Peuples et Populisme de Catherine Colliot-Thélène e Florent Guénard fica para outra oportunidade.

Sem comentários:

Enviar um comentário