A nossa formação de base em desenvolvimento económico foi
organizada a partir de uma evidência empírica de tempos que já lá vão segundo a
qual o crescimento da indústria transformadora era entendido como um facto
estilizado e um motor de crescimento das economias de mercado. Esse facto
estilizado decorreu sobretudo dos trabalhos do economista Nicholas Kaldor, um economista
de Cambridge – UK.
À medida que a história do desenvolvimento económico deixou
de poder ser associada exclusivamente aos chamados países do desenvolvimento original,
as economias maduras, acumularam-se evidências de que em outras situações
concretas o motor do crescimento poderia não estar necessariamente localizado na
indústria transformadora. Como sabemos, a chegada ao crescimento económico dos
países a ele candidatos não se processa numa única vaga. Antes pelo contrário, sucedem-se
em vagas sucessivas, cuja magnitude e composição é muito variada. Assim sendo,
e dada a relevância da economia mundial como espaço de integração da grande
generalidade dos processos de crescimento económico, é compreensível que os
fatores de crescimento tendam eles próprios a diversificar-se, sobretudo porque
a economia mundial vai se alterando e consequentemente vão-se modificando as
condições de êxito de crescimento.
O tema da desindustrialização emergiu nesse novo contexto
de vagas sucessivas de entradas no processo de crescimento económico e os
economistas distinguem desindustrialização absoluta e relativa. A primeira
observa-se quando o produto e o emprego gerados pela indústria transformadora
caem ao longo do tempo em termos absolutos. A segunda é registada pelos
economistas quando o peso do produto e do emprego que a indústria
transformadora representa no produto e emprego totais tendem a cair. A
desindustrialização foi entendida inicialmente como uma consequência do próprio
processo de desenvolvimento económico, decorrente do facto da estrutura do
consumo variar significativamente com o aumento dos níveis de rendimento,
favorecendo a alocação de recursos para outros setores de atividade económica,
entre os quais os serviços e entre estes as atividades de lazer. Porém, à medida
que os processos de desenvolvimento económico de economias emergentes ou recém-chegadas
ao processo de desenvolvimento económico foram sendo conhecidos com mais
profundidade, foi possível compreender que a desindustrialização relativa não
constituía apenas uma consequência apenas dos processos de desenvolvimento económico.
A tabela que abre este post, publicada num curto artigo de Uri Dadush no VOX EU, dá conta
que no período 1990-2012 a desindustrialização relativa atravessa a totalidade
dos níveis de desenvolvimento, evidenciando por exemplo que a queda do peso da
indústria transformadora no PIB observada nos países de rendimento mais baixo foi
similar à verificada entre os mais ricos.
O reconhecimento desta evidência empírica dos tempos mais
modernos necessita de ser rigorosamente interpretado sob pena dos sinais que
ela transmite para o desenho das estratégias de desenvolvimento dos países à
procura de um futuro mais sustentado poderem ser enganadores.
As evidências de desindustrialização e a consequente
perceção de que os serviços podem ser um motor de crescimento económico e até
das exportações não podem ser ignoradas. Mas isso não significa que a indústria
transformadora não possa ser em casos concretos de economias concretas e
sobretudo em função do perfil de especialização que ela possa sustentar um
motor bem-sucedido de crescimento. As novas “leis” do desenvolvimento económico,
nas quais a desindustrialização relativa se insere, não assentam em
determinismos. São simples regularidades e há sempre economias que não se
situam “bem comportadas” nas retas de regressão. Por outro lado, o processo de
desindustrialização relativa não significa necessariamente a perda de uma memória
e de uma cultura industrial. Essa perda será sempre de evitar e a economia portuguesa
parece ter compreendido essa lição da história. O que esta conclusão significa é
que as janelas de oportunidade da economia portuguesa não são manietadas por
uma evidência ou regularidade empírica como a da desindustrialização relativa. Aliás,
a “ciência” de uma boa escolha nesta matéria consistirá em conseguir que o
aumento da intensidade em serviços exportáveis da economia portuguesa não
esteja necessariamente em conflito com o apuro de especialização nos setores da
indústria transformadora em que a resiliência da produção nacional parece ter
sido conseguida, embora á custa de uma significativa destruição de empregos
mais desqualificados.
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