(Seven liberal Arts)
Pode parecer que tenho uma fixação por louras não burras,
mas é só aparência. O modo como me revejo na estimulante Gillian Tett,
colunista do Financial Times, é apenas fruto do facto de apreciar a diversidade
heterodoxa de uma jornalista que, em princípio, escreve sobre mercados financeiros
e isso diz tudo da personagem. Conseguir ser estimulante como jornalista de
mercados financeiros é por si só um prodígio.
(Gillian Tett)
A última crónica de Gillian Tett vem ao encontro de uma
preparação difícil que tenho realizado para participar num encontro algo
misterioso que a Fundação Calouste Gulbenkian organiza na próxima quarta-feira
na Reitoria da Universidade do Porto. Sei apenas que se trata de uma reunião de
trabalho com gente da Região de suporte a uma obra que estará em elaboração sob
os auspícios da Fundação, centrada na evolução do ensino superior, sob a
coordenação do Professor Júlio Pedrosa. É uma forma muito portuguesa de
preparar reuniões de trabalho desta natureza, parece que o tempo não conta para
muito boa gente na administração e intelectualidade portuguesa, porque se
contasse esforçar-se-iam por preparar melhor a eficácia com que aproveitam o
tempo e o conhecimento dos outros.
Pois em contexto de navegação à vista pelos temas
contemporâneos da formação superior dei com esta crónica recente da criativa
Gillian, crónica que versa sobre a procura de níveis de criatividade mais
disseminada na formação superior, tendo em conta a obsolescência rápida que
atinge a formação mais tecnológica e vocacional, sobretudo à medida que, entre
outros aspetos, a robotização rapidamente substitui tais vocações.
E nada melhor para amenizar a noite do que esta citação
da desempoeirada Gillian:
“O que um país
como a América deve proporcionar aos seus estudantes são aptidões (skills) que
não possam ser replicadas por robots (ou que o possam vir a ser em futuro próximo),
designadamente a capacidade para pensar clara e criativamente. E é isso
precisamente que os cursos de artes liberais (liberal arts ou liberal studies)
proporcionam, fazendo os estudantes mergulhar na miscelânea da ciência social,
estudos literários e outros, tornando-se intelectualmente mais curiosos, de
mente mais aberta e criativos e o argumento colhe. E se esta aprendizagem puder
ser combinada com alguma ciência e matemática, então os efeitos serão poderosos.”
Voltamos à velha questão do reequilíbrio necessário das
formações tecnológicas facilmente perecíveis com artes, humanidades e outros
estudos liberais no velho sentido do termo e na aceção de tentativas modernas
de criar programas profundamente interdisciplinares, flexível sem perder
solidez de base.
O problema é que este reequilíbrio deve processar-se num contexto
particularmente difícil de procura de novos caminhos para a formação superior,
nos quais se sobrepõem apelos à:
- Melhoria de condições de empregabilidade de licenciados;
- Melhoria da articulação da formação superior com a investigação;
- Necessidade de não se perder de vista a formação para a formação cidadã (Martha Nussbaum, Not for Profit: Why Democracy Needs the Humanities, Princeton University Press, (2010)) não diretamente articulada com a produtividade e com a formação de lucro;
- Mais proactiva procura de financiamento que não apenas o financiamento público, designadamente através da internacionalização, outward (formando no exterior) ou inward (formando cá alunos estrangeiros);
- Necessidade profunda de revisão da rede de oferta, com profundas implicações territoriais, não acomodáveis apenas na política de ensino superior, mas implicando um forte contgributo das políticas de desenvolvimento regional.
(Martha Nussbaum)
Enfim, duas mulheres, por sinal ambas loiras, a pairar
sobre este post: Gillian Tett e Martha Nussbaum, com percursos bem diferentes,
mas convergentes neste tema.
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